A saúde em tempos de predadores 

9 de maio de 2019 às 0h01

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Crédito: pixabay

Antonio Carlos Lopes *

 Dias atrás, fui surpreendido com a notícia de que foi ressuscitado no mundo político um lobby pela liberação do amianto, fibra que mata 100 mil pessoas ao ano por causar câncer e outros tumores. Fazem parte do grupo os senadores Vanderlan Cardoso (PP-GO), Luiz do Carmo (MDB-GO), Chico Rodrigues (DEM-RR), além do próprio presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre.  

Vale lembrar que o amianto é proibido em 60 países, em virtude dos riscos à saúde e à vida.  No Brasil, o impedimento só se deu há dois anos, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) tornou ilegal a comercialização e a distribuição da variedade crisotila.  

Por incrível que pareça, o retrocesso para a saúde pública tem também à frente um médico: o governador de Goiás, Ronaldo Caiado. Ele e seus demais colegas tentam liberar a produção da Sama Minerações, com o discurso de que há gente perdendo emprego, que o Estado ganhará em geração de riquezas e por aí vai.  

Ora, é obrigação de qualquer médico ter a vida do ser humano em primeiro lugar, sempre. Se o fim da produção acaba com postos de trabalho, cabe à classe política de Goiás e do Brasil, criar alternativas para a absorção dessa mão de obra em funções que não tragam perigo à saúde.  

O amianto do tipo crisotila é base para a fabricação de diversos produtos, principalmente de telhas e caixas d’água. Trata-se de mineral que pode durar até 70 anos. 

Em caso de inalação, provova mutações celulares, muitas vezes originando tumores, câncer de pulmão e a asbestose, doença incurável resultante do depósito de amianto nos alvéolos pulmonares. A contaminação é lenta e seus danos são conhecidos desde a década de 30.  

Essa é mais uma demonstração de que a saúde, no Brasil, não é minimamente levada a sério. Ao contrário, vivemos tempos de predadores, como já estamos cansados de ver na rede suplementar.

Hoje, os planos e seguros saúde representam um setor biliardário em nosso País. São cerca de 50 milhões de pacientes que pagam, desde bebês, sendo que jamais ficaram doentes todos de uma vez.  

Os empresários do setor ganham dessa forma rios do dinheiro, sem falar que, quando enviam algum enfermo para a alta complexidade do Sistema de Saúde (ou seja, os procedimentos mais custosos), não ressarcem o Estado, ampliando a crise da rede pública de assistência.  

Esses mesmos planos de saúde também buscam sempre formas de ignorar a lei. Desde que, em 1998, a Lei 9656, passou a dar guarida maior aos pacientes, dificultando negativas de cobertura, eles começaram a atacar os prestadores, entre os quais os médicos. Além de praticar remuneração vil, muitos pressionam para que sejam reduzidos exames, uma série de procedimentos e até internações.  

Pior é que todo mundo sabe, mas ninguém faz absolutamente nada para moralizar a saúde suplementar, para defender os pacientes e resguardar os profissionais.  

Enquanto situações desse gênero forem recorrentes no Brasil, a população permanecerá em grave risco. Como quem deveria nos representar dá a impressão de não ter interesse, vamos abrir os olhos e manter, via conscientização, a esperança de mudanças positivas.  

  • Presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica 

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