[EDITORIAL] Ferramentas mal utilizadas
1 de novembro de 2018 às 0h01
Os debates, os que aconteceram e sobretudo os que não aconteceram, foram uma das marcas fortes da campanha no segundo turno. Voltando um pouco no tempo, foi o presidente John Kennedy, dos Estados Unidos, que nos anos sessenta do século passado, numa fase que coincidiu com o surgimento das primeiras redes, descobriu o potencial da televisão e fez dela sua principal arma. Ganhou, é verdade que com algumas ajudas que até hoje não foram suficientemente esclarecidas, e transformou as campanhas políticas.
Ganharam força, como desdobramentos previsíveis, as pesquisas e o marketing, que de ferramentas legítimas rapidamente transformaram candidatos em sabonetes, cujas vendas – ou votos – seriam proporcionais à qualidade de suas campanhas. Ideias, projetos, propostas, tudo ficou em segundo plano. O fundamental passou a ser dizer o que o eleitor queria ouvir, ganhar e, evidentemente, fazer diferente, conforme as conveniências que o poder impõe.
No Brasil, desde a redemocratização, são estes os padrões das campanhas políticas, o que muito ajuda na compreensão do processo de empobrecimento que é visível e pelo qual tantos lamentam. É nesse ponto que retornamos aos debates que este ano, e ao contrário dos anteriores, não se limitaram às redes de televisão. Deles é preciso dizer que são engessados e monótonos, com quase nenhum jornalismo e informação, menos ainda debate. Algo previsível, quase um teatro em que atores representam papéis muito bem ensaiados. E dos quais fogem, por óbvio, os candidatos mais bem contados, que evitam a exposição, já desnecessária, e os riscos de algum deslize que possa municiar os rivais.
Tudo distante do verdadeiro interesse público, da apresentação de cada postulante e de suas propostas, distante da realidade e, sobretudo, do que virá depois. O próprio debate em torno do tema, como se ali estivessem as peças-chave do jogo democrático, é forçado e artificial.
Sobram evidências de que o modelo se esgotou e que novas ferramentas ocuparam o espaço que lá atrás fizeram diferença para Kennedy. Fará mais sentido, olhando para a frente, entender o papel – e os riscos – das redes sociais, uma mudança que já aconteceu, já é determinante e tende a ser mais ainda. Com um potencial que por enquanto exibiu apenas a sua pior face, mas que pode ser usado para o bem, para aproximar e até dar um novo conteúdo ao conceito de democracia e participação. Para o futuro, uma questão de escolha.