Praxeologia, economia e o entendimento da ação humana

21 de novembro de 2018 às 0h01

José Pio Martins*

“O ser humano tem três necessidades básicas iniciais: alimento, abrigo e repouso. Se elas não forem atendidas, em poucos dias o homem morre. Nas comunidades primitivas, em que outras necessidades quase não existiam, os homens saíam de manhã e voltavam com o produto de suas atividades de caça, coleta e pesca, e então se alimentavam das frutas coletadas, dos peixes pescados e dos animais abatidos. Por óbvio, nem todos os membros da comunidade participavam do trabalho, a exemplo das crianças.

Para abrigar o corpo e se proteger das intempéries do clima, usavam couro de animais, folhagens e adentravam as cavernas, onde repousavam e dormiam. Assim vivam as comunidades primitivas, também dividiam as tarefas e repartiam o que produziam. Se alguém quiser saber como nasceu a economia (sistema de produção, distribuição, circulação e consumo), basta remontar à história e ver que ela nasceu com a luta do animal homem para preservar sua vida.

Nesse sentido, a economia é a ciência da ação humana, definida como o emprego de meios para atingir fins. À medida que a população foi aumentando, instrumentos de produção foram inventados (os chamados “bens de capital”, como as ferramentas movidas pelos braços humanos), o conhecimento sobre as leis da natureza foi se ampliando, a coexistência em grupos se expandiu, provocando o surgimento de outras necessidades, outras atividades e formas novas de produção, distribuição e consumo.

Com o passar do tempo, começaram a se misturar ações humanas de natureza puramente econômica com formas de organização das comunidades (é o caso das cidades e, com elas, o alvorecer da política) e as interações e conflitos da vida coletiva (estudados pela sociologia), e a ação humana passou a ser observada, estudada e explicada por leis e regras que poderiam ser englobadas em uma única ciência: a ciência da ação humana, que existe com o nome de “praxeologia”, com sua teoria geral da ação humana.

O termo “praxeologia” foi empregado por Espinas, talvez pela primeira vez, em 1890, e vem do grego práxis (prática, hábito, ação). A rigor, a praxeologia é uma ciência maior, que seria a soma da economia, sociologia, política e psicologia. Para as relações humanas em comunidade e para a ação humana no âmbito da economia e das relações de mercado, foram escritas as leis jurídicas a fim de regular e controlar a vida e os atos humanos em sociedade, um corpo de leis tendo por base uma filosofia do direito. Esse ordenamento regulatório passou a fazer parte do conjunto das ciências sociais que hoje regem o destino das nações.

A economia é uma das mais novas ciências e, à medida que o homem foi inventando máquinas, processos e tecnologias – com a ajuda da física, da química e de outras ciências da natureza –, as necessidades se multiplicaram. Com o aumento da complexidade da vida social, descobriu-se haver uma regularidade e interdependência nos fenômenos de mercado, cujo entendimento deixou a humanidade aturdida e confusa, e levou à formação de um novo corpo de teorias para explicar a ação humana e suas consequências na luta diária para atender as necessidades múltiplas com os recursos escassos da natureza, do capital e do trabalho.

Durante séculos, os filósofos e os estudiosos da ação humana tentaram descobrir as leis (científicas) que governam o destino e a evolução da história humana. A evolução da economia (a ciência, não o sistema) mostrou ao mundo que existe um outro aspecto, diferente do bem e do mal, do justo e do injusto, segundo o qual a ação humana podia ser considerada. Quem melhor analisou a ação humana sob as teorias da nova ciência foi o grande Ludwig von Mises (1881-1973), um desses gênios raros que habitaram o planeta.

Mises dizia que toda ação humana representa uma escolha e, ao escolher, o homem opta não apenas entre bens materiais e serviços, mas entre todos os valores humanos. Assim, os teóricos começaram a entender a economia (agora, o sistema) como uma máquina de produzir, distribuir e consumir a partir de uma “ciência da escolha”. Isto é, até mesmo a escolha de seu trabalho e dos atos de compra e venda no mercado se conecta com as escolhas que o homem faz em relação aos valores que lhe são oferecidos para opção.

Quando a economia comportamental ganhou fama, muitos pensaram estar diante de uma novidade. Mas não. O comportamento do agente homem no mercado já vinha sendo estudado desde ao menos 1850, provocando a união entre os fenômenos econômicos e as análises científicas oferecidas pela psicologia. A partir do momento em que o Estado começou a crescer e a se tornar uma fábrica de normas intervencionistas na vida do indivíduo, sobretudo após a Primeira Guerra Mundial, o entendimento da economia passou a exigir conhecimento das teorias econômicas e, também, da psicologia, da filosofia, do direito, da sociologia e da política. Como dizia Friedrich von Hayek, não é bom economista quem é apenas economista.

* Economista e reitor da Universidade Positivo

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