Condomínios deixam evidente perda de valores

2 de dezembro de 2020 às 0h08

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Crédito: CHARLES SILVA DUARTE Usada em 03-07-19

Kênio de Souza Pereira*

Tem causado espanto que cada vez mais as pessoas achem ser normal enganar o outro, em levar vantagem, em distorcer os fatos, em se fazer de vítima para justificar que fez mal a outra pessoa, seja na elaboração de um contrato, na venda de produto, na prestação de serviço ou até numa reunião de condomínio. A tecnologia e o conhecimento evoluíram na mesma proporção que os métodos e meios de enganar. Basta vermos no dia a dia as pessoas se negando a assumir compromissos por escrito ou distorcendo o que acabaram de dizer, mesmo na frente de várias testemunhas.

Pode ser que escândalos como do Mensalão e do Petrolão tenham exposto a má-fé disfarçada pela dissimulação e falta de “vergonha na cara”, influenciado de forma negativa a população, que ao invés de se constranger e passar a ser mais exigente com a conduta própria e alheia, se entregou ao desânimo e aceitação desse comportamento vergonhoso, aderindo a um novo modo de agir desonesto. Banalizou-se o mau-caratismo.

Essa involução tem afetado os negócios e vemos cada vez mais vendedores prometendo o que não existe ou dizendo que pode ser realizado o que é ilegal. Basta vermos a quantidade de pessoas que realizam alterações ilegais em seus imóveis após a construtora obter o Habite-se, como se não existissem leis, a convenção que proibisse tais obras e nem os vizinhos do apartamento que são prejudicados com o aumento da sua insegurança com o novo telhado ou com a chaminé que surge do apartamento térreo.

Há ainda aqueles que vendem vagas de garagem inexistentes e que anunciam o imóvel localizado num bairro valorizado, apesar de o registro imobiliário constar que o bairro é o do lado que é mais simples. Vários são os casos de pessoas que compram a cobertura, mas depois descobrem que o documento se trata de um apartamento comum que o vendedor invadiu o telhado e fez uma reforma ilegal, tendo sido omitidas essas informações.

A ética, seu conjunto de valores e princípios que determinam nossas condutas, deve ser mais valorizada, especialmente pelos governantes, autoridades e julgadores que devem nos proteger. Conforme muito bem colocado por Mário Sérgio Cortella e Clóvis de Barros Filho quando abordam o tema sob o título “Não é a ocasião que faz o ladrão. Ela apenas o revela”, a vida nos coloca três dilemas: quero, posso e devo.

Há aquele que quer e pode e por isso acha que deve fazer. Outro pode, mas sabe que não deve fazer. Há coisas que devo, mas não quero. Sob essa perspectiva, a pessoa decide ser ladrão antes mesmo de surgir a ocasião, e, quando aparece a oportunidade, está pronto para aproveitá-la”. Dessa forma, vários são os que se aproveitam para induzir o cliente a assinar um contrato que sabem que ocasionará dano, pois se importam apenas em obterem lucro, mesmo que seja injusto.

O que nos dá esperança são as pessoas que têm diversas oportunidades para praticar um deslize para levar vantagem ou obter lucro indevido, mas não o fazem, pois têm ética. Uma sociedade eticamente desenvolvida, por educação, por cultura, entende ser normal abrir mão de algum desejo para favorecer a convivência social.  Valorizam a moral, pois agem de maneira correta e digna independentemente de estarem na frente de alguém ou de poderem ser expostas, pois mesmo sozinha a consciência determina o agir honestamente, a cobrar o valor justo e a pagar o que é devido espontaneamente, seja quem for o beneficiado. O agir ético e moral não cede à justificativa na lei ou no contrato mal redigido para lesar o vizinho, o credor ou para levar vantagem financeira que qualquer cálculo matemático e a lógica deixam claro ser abusiva.

Agir com retidão é um dever, mas a cada dia temos visto isso ser relativizado, o que torna o convívio difícil. É preciso abdicar de alguns desejos, especialmente se nos envergonham. É triste vermos nas assembleias de condomínio os responsáveis por elas fraudando a ata na frente dos vizinhos, distorcendo a verdade para lesar os outros, não se corando ao serem flagrados, pois se tornaram sem vergonha ao perderem a moral e o senso de dignidade.

*Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG, Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal, Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG kenio@keniopereiraadvogados.com.br

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