Setor da Abin, sob Bolsonaro, é acusado de espionagem

O Centro de Inteligência Nacional (CIN) chegou a receber o apelido de Abin paralela

24 de janeiro de 2024 às 21h38

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Software espião teria sido usado ilegalmente contra adversários do ex-presidente | Crédito: José Cruz/Agência Brasil

Brasília – Documentos em posse da Polícia Federal (PF) na operação Última Milha indicam que servidores da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), lotados no Centro de Inteligência Nacional (CIN), utilizaram o software espião FirstMile durante o governo Jair Bolsonaro (PL). A suspeita é que a agência o usou ilegalmente contra jornalistas, políticos e adversários do ex-presidente.

O CIN tem origem em um decreto de Bolsonaro, assinado em julho de 2020, que criou novas estruturas dentro do organograma da Abin, à época chefiada por Ramagem, atual deputado federal e pré-candidato do PL à Prefeitura do Rio de Janeiro.

Ramagem nega irregularidades e afirmou, por meio e sua assessoria, que o “departamento de operações, composto exclusivamente de servidores de carreira da Abin, era o único responsável pela gestão, senhas e execução do sistema.”

A justificativa para criação do CIN foi planejar e executar “atividades de inteligência” destinadas “ao enfrentamento de ameaças à segurança e à estabilidade do Estado” e assessorar órgãos competentes sobre “atividades e políticas de segurança pública e à identificação de ameaças decorrentes de atividades criminosas”.

Foram colocados em cargos de chefia na nova estrutura servidores da agência e policiais federais próximos à Ramagem e da família Bolsonaro, o que fez com que o CIN fosse apelidado de Abin paralela.

Encerramento

O centro foi desmontado pela reestruturação promovida pela atual direção da Abin, já no governo Lula (PT), após a operação da Polícia Federal (PF) que mirou o software espião.

O FirstMile foi utilizado pela Abin entre 2019 e 2021. Ele foi adquirido e ficava “hospedado” em computadores da Diretoria de Operações de Inteligência, mas depoimentos de servidores e documentos de apurações internas da Abin mostram o uso por solicitação de pessoas ligadas ao CIN.

Sobre um servidor alvo de busca pela PF, a decisão do ministro Alexandre de Moraes que autorizou a operação afirma que ele era “o responsável pela fiscalização contratual do sistema FirstMile e, mesmo transferido de setor, continuou a realizar consultas pelo Centro de Inteligência Nacional.”

“O servidor, ainda, tinha plena ciência da característica intrusiva da ferramenta que questionou, na condição de fiscal do contrato, o fato de a empresa fornecedora ter perdido a eficácia em relação a operadora Tim”, diz a decisão.

Como mostrou a Folha de S.Paulo, uma troca de e-mails entre oficiais da Abin e funcionários da empresa vendedora do FirstMile é utilizada pela PF como prova de que a ferramenta invadia a rede de telefonia nacional.

O uso pelo CIN, fora do setor onde o programa estava instalado, aparece ainda em outro trecho do inquérito da PF, em que os investigadores analisam um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) da Abin contra dois servidores que denunciaram o uso do software espião para tentar escapar da demissão.

“Destaca-se que a comissão de PAD identificou a utilização do sistema a pedido dos responsáveis pelo CIN”, diz a PF.

Respostas

Procurado, Ramagem disse por meio de sua assessoria que o CIN foi “criado para cumprir atuação da Abin como órgão central do sistema brasileiro de inteligência e implementar inteligência corrente e coleta estruturada de dados.”

Sobre os servidores e policiais federais lotados no CIN utilizarem o FirstMile, ele afirmou que os “centros, diretorias e superintendências da Abin possuem demandas de inteligência, mas apenas o departamento de operações utilizava a ferramenta.”

Ramagem disse ainda que a investigação da PF só foi possível porque sua gestão “fez correição e investigação na corregedoria” sobre o sistema.

“Outras instituições adquiriram a mesma ferramenta, sem notícias de providências de auditoria. Não me encontro como investigado, já tendo inclusive representado à PF contra imputações infundadas”, completou. (Thaísa Oliveira e Fabio Serapião)

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