Do tsunami político e da construção do Estado

23 de outubro de 2018 às 0h01

Stefan Salej*

Se as pesquisas estiverem certas, olha lá a comparação entre política e previsão de tempo, o Brasil sofrerá um tsunami eleitoral no próximo domingo de proporções épicas. A primeira onda, o primeiro turno, que definiu as eleições parlamentares, já destruiu uma boa parte da estrutura política do País e os surfistas na onda se saíram bem. E colocou muita gente na segunda onda que está se aproximando com uma velocidade incrível. Nem o calendário gregoriano consegue segurar mais a ansiedade de vitória ou as ondas de tsunami. A esperança de mudança ou revolta contra a situação presente em todos os sentidos impulsaram um ressentimento eleitoral não esperado. Em geral essas ondas são precedidas por manifestações de rua, protestos amplos, como aquele de 2013, ou uma campanha acirrada. Pouco disso aconteceu, com exceção que a revolta foi expressa nas urnas de forma silenciosa, ordeira e esperançosa.

Os vencedores desse campeonato eleitoral carregam com a vitória a responsabilidade de atender aos anseios dessa revolta política que foi expressa nas urnas. Só para lembrar, nas histórias políticas recentes, vários presidentes, como Macri e Macron, foram eleitos nessas ondas de revolta e esperança. E o que sobrou deles? Mais revolta e menos esperança. O capital político foi gasto na governabilidade que não atendia aos anseios dos votos que ganharam nas eleições. Nos casos similares, só se mantiveram no poder aqueles, como Orban na Hungria, que reduziram a pó o debate político, a oposição e a imprensa.

E quais são esses desafios que o País enfrenta na sua governabilidade e que não estão tão visíveis como os aspectos macroeconômicos e fiscais?

Em primeiro lugar, nem todos os problemas do Brasil estão no Brasil. Fazemos parte de um mundo não só complexo mas, neste momento, complicado e no  qual a nossa influência é zero. Essa complexidade do mundo não determina só a nossa situação econômica e financeira mas sobretudo a nossa segurança. Podemos não ser parte direta dos conflitos em curso, e os que estão sendo provocados pelos poderosos, mas somos colateral damage no melhor sentido da expressão.

E falando de segurança, é ilusão pensar que o problema está no Rio de Janeiro. Temos uma situação de criminalidade aterrorizante. De fato não sabemos quanto o crime cada vez mais organizado domina a política, a vida cotidiana, os negócios, o mundo religioso. E o Estado que está aí não dá conta dessa situação. Somos um país com uma população carcerária enorme, com crime mantendo territórios sob seu comando, corrupção dominando as relações entre Estado e setor privado, um Judiciário que não inspira confiança à população, fronteiras desguarnecidas, forças armadas se transformando em polícia, um novo ministério de segurança pública que ainda não está estruturado e mais e mais.

O episódio de conflito armado na semana passada entre policiais de Minas e de São Paulo em Juiz de Fora, numa “simples” troca de dólares por reais, é um caso emblemático da situação que vivemos. Qualquer filme sobre crime na Netflix é coisa para criança perto do que aconteceu em Minas. E é só a  ponta do iceberg da situação.

A agenda vai longe. Como oferecer à população mobilidade social. E aí começando com a criação de emprego. Além dos 30 milhões de descamisados que temos na linha abaixo da pobreza.

Os vencedores terão que agir, mostrar resultados não só para o mercado, que se ajeita, mas para os que os elegeram. A doutrina de gestão pública vai, num regime que continuar democrático, requerer mais do que só  palavra de ordem. E também só fé e esperança não serão suficientes. Eleição é um momento na política, governabilidade dura um mandato.

* Ex-presidente do Sebrae Minas e da Fiemg – Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais

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