No dia 26 de maio de 1986, a televisão brasileira parou. Durante a apresentação de seu programa dominical no SBT, o jornalista e apresentador Flávio Cavalcanti, de 63 anos, passou mal ao vivo, precisando deixar o palco às pressas. Wagner Montes, que estava nos bastidores, assumiu a atração às pressas e explicou ao público:
“Vocês devem estar estranhando eu apresentando o programa. Desculpem, mas eu também fui pego de improviso. O Flávio teve uma pequena indisposição e, se Deus quiser, na próxima quinta-feira, ele estará aqui, porque aqui é o seu lugar.”
Dias depois, o quadro se agravou. O comunicador faleceu em decorrência de uma parada cardíaca causada por isquemia miocárdica, encerrando uma trajetória que marcou gerações.
O SBT suspendeu sua programação por 24 horas em sinal de luto — decisão pessoal de Silvio Santos, que era amigo de Flávio, apesar de uma suposta rivalidade profissional. Na tela, uma mensagem simples e comovente foi exibida:
“Estamos tristes com a morte do nosso colega Flávio Cavalcanti, que será sepultado hoje, em Petrópolis, às 16h, quando então voltaremos com a programação normal.”
Quem foi Flávio Cavalcanti
Nascido em 15 de janeiro de 1923, no Rio de Janeiro, Flávio Cavalcanti começou a carreira como bancário, mas largou tudo para seguir no jornalismo, inicialmente no rádio. Rapidamente se tornou uma das figuras mais conhecidas e polêmicas da televisão brasileira.
Na década de 1960, enquanto a TV ainda se consolidava no país, ele ganhou notoriedade com programas como “Um Instante, Maestro!” e “A Grande Chance”, que misturavam entrevistas, atrações musicais e júris que discutiam abertamente sobre cultura e comportamento.
Ele também protagonizou momentos históricos, como a entrevista exclusiva com o presidente dos EUA, John F. Kennedy, e conversas com personalidades como Pelé, Roberto Carlos e Chico Anysio. Com uma postura sempre autêntica, defendia suas opiniões com firmeza — chegando a quebrar discos de artistas ao vivo quando não aprovava músicas, atitude que, muitas vezes, impulsionava justamente as vendas desses trabalhos.
Coragem, polêmicas e lado humano
Além de polêmico, Flávio era conhecido pelo lado humano. Durante a ditadura militar, em 1969, chegou a abrigar em casa a atriz Leila Diniz, que era perseguida por agentes do regime. Também ajudava desconhecidos com comida, roupas ou dinheiro e chegou a levar pessoas em situação de vulnerabilidade para morar com ele.
Sua carreira, que passou por emissoras como TV Tupi, TV Bandeirantes e, por fim, o SBT, sempre foi marcada pela defesa do jornalismo ao vivo, sem cortes ou videotapes, criando uma relação íntima com o público.
Mesmo com problemas de saúde nos últimos anos, continuou à frente de seu programa dominical até o dia do mal súbito que tirou sua vida.
Após a morte, Flávio Cavalcanti se consolidou como um dos grandes nomes da comunicação brasileira, ao lado de lendas como Chacrinha e Silvio Santos. Sua irreverência, coragem e paixão pela TV continuam sendo lembradas por colegas e telespectadores.
Em 2023, no centenário do nascimento dele, o filho, Flávio Cavalcanti Jr., lançou o livro “Senhor TV: A Vida com Meu Pai, Flávio Cavalcanti” (Matrix Editora), que narra bastidores da carreira e a vida pessoal do apresentador.