A cada maré alta, o mar avança sobre ruas, casas e memórias em Atafona, distrito de São João da Barra, no norte do Rio de Janeiro. O fenômeno já destruiu mais de 500 imóveis, expulsou ao menos 2 mil moradores e é considerado por especialistas uma das erosões costeiras mais graves do Brasil.
O avanço do Atlântico começou a ser registrado na década de 1950 e nunca mais cessou. Hoje, a média é de três metros de terra perdidos por ano. Se nada for feito, parte considerável da área urbana pode desaparecer em menos de 30 anos.
O cenário é de destruição: clubes que sediaram bailes da elite fluminense nos anos 1970 estão em ruínas e ruas inteiras terminam abruptamente em barrancos. Para muitos moradores, deixar o local não é opção. “Coloquei tapumes porque queria continuar aqui mais um tempo. Fico até o mar ocupar tudo de vez”, contou a moradora Sônia Ferreira.
Causas do desastre
A erosão em Atafona é resultado de fatores combinados:
- Mudanças climáticas, com aumento do nível do mar e ressacas;
- Barragens no Rio Paraíba do Sul, que reduziram o fluxo de sedimentos;
- Assoreamento da foz;
- Desmatamento das margens do rio;
- Ocupação desordenada da orla.
Impacto social e cultural
Além da perda física, a comunidade sofre com a crise da pesca artesanal, base econômica local. O assoreamento dificulta a saída de barcos e ameaça a sobrevivência de famílias de pescadores. A identidade cultural também se desfaz: a praia, que já foi destino turístico nos anos 1970, hoje acumula ruínas e lembranças.
Entre as propostas discutidas estão a construção de barreiras artificiais, aterros hidráulicos e a recuperação de manguezais. Mas todas esbarram em altos custos e questões ambientais. Segundo a prefeita Carla Machado, “o município não tem como arcar sozinho com isso”.
Pesquisadores defendem um plano nacional de enfrentamento da erosão costeira. “A causa é multifatorial. As soluções também terão que ser”, afirma o professor Gilberto Pessanha Ribeiro, da Unifesp.
Cientistas já soaram o alarme: esta praia brasileira está sumindo com o passar do tempo
Em agosto, uma ressaca atingiu novamente Atafona, interditando casas e obrigando famílias a aderirem ao aluguel social. A prefeitura anunciou a publicação de um edital de licitação para contratar estudos técnicos de contenção do mar.
Enquanto isso, entidades como a SOS Atafona articulam apoio junto ao governo federal. “Agora temos uma luz no fim do túnel”, disse Camila Hissa, representante da associação.