Enquanto o Uruguai se tornou em 2025 o primeiro país sul-americano a aprovar por lei a eutanásia — após mais de uma década de debates no Congresso —, o Brasil ainda está distante de uma discussão efetiva sobre o tema.
A proposta uruguaia, batizada de “Lei da Morte Digna”, foi aprovada no Senado por 20 votos a 11 e autoriza o procedimento para adultos mentalmente capazes, residentes no país, que sofram de doença incurável ou de dor física ou psíquica insuportável, com grave comprometimento da qualidade de vida.
O pedido deve ser voluntário, escrito e testemunhado, e a aplicação será feita por profissionais de saúde habilitados, segundo protocolos éticos e médicos. A lei ainda aguarda regulamentação presidencial e garante direito à objeção de consciência a médicos e enfermeiros que não desejarem participar do processo.
O presidente Yamandú Orsi, da coalizão de esquerda Frente Ampla, defendeu a medida como “um avanço civilizatório”, comparando-a à legalização do aborto e da maconha:
“Assim nos tornamos um país mais avançado e distante de certas amarras que impedem o livre exercício da vontade de cada cidadão.”
Brasil: debate estagnado e legislação proibitiva
No Brasil, a eutanásia e o suicídio assistido continuam proibidos. Ambos são enquadrados como homicídio simples pelo Código Penal, com pena de 6 a 20 anos de prisão.
Segundo a advogada e bioeticista Luciana Dadalto, presidente da associação Eu Decido, o país ainda não iniciou um debate legislativo concreto sobre o tema:
“Não temos projetos em tramitação, uma discussão expressiva no Congresso, nem precedentes judiciais que reconheçam o direito à morte assistida. O Brasil está muito distante dessa pauta.”
Historicamente, apenas dois projetos de lei, de 1991 e 1996, apresentados pelo então deputado e senador Gilvam Borges, buscaram legalizar a eutanásia — ambos foram arquivados.
Há, no entanto, uma proposta de reforma do Código Penal, de 2012, que menciona o tema ao tipificar a eutanásia como crime autônomo, com pena reduzida de 2 a 4 anos de prisão, inferior à de homicídio comum. A medida, porém, não descriminaliza a prática e segue parada no Congresso.
Resistência religiosa e ética
Assim como ocorreu no Uruguai, as instituições religiosas brasileiras — em especial a Igreja Católica e entidades evangélicas — mantêm posição firmemente contrária à eutanásia.
Para essas lideranças, a prática fere o princípio da inviolabilidade da vida. A Igreja Católica uruguaia, por exemplo, afirmou após a aprovação da lei que “a vida sempre vale, ainda que precise de outros para se sustentar”.
No Brasil, o Conselho Federal de Medicina (CFM) também não apoia a legalização, embora reconheça a importância da ortotanásia — prática que permite suspender tratamentos fúteis em pacientes terminais, respeitando o processo natural da morte.
Diferenças entre os conceitos
- Eutanásia: o médico aplica uma substância letal a pedido do paciente, com o objetivo de abreviar sofrimento insuportável.
- Suicídio assistido: o médico prescreve o medicamento, mas o próprio paciente o administra.
- Ortotanásia: consiste em permitir que a morte siga seu curso natural, sem prolongar artificialmente a vida.
Somente a ortotanásia é aceita no Brasil, dentro das normas éticas do CFM.




