O Ministério da Educação (MEC) deu um novo passo para ampliar o acesso à formação médica no país. O edital publicado pela pasta flexibiliza as regras para a abertura de novos cursos de Medicina, especialmente em universidades comunitárias — instituições sem fins lucrativos que, historicamente, enfrentavam dificuldades para competir com grandes grupos privados.
A medida, que permite a criação de cursos mediante parceria com hospitais públicos, foi celebrada por instituições como a PUC-Rio, que tenta abrir uma graduação na área há mais de dez anos. “É uma correção histórica”, afirmou o reitor da universidade, padre Anderson Antonio Pedroso, destacando que as comunitárias “não são empresas de lucro” e, por isso, precisam de condições diferentes para atuar.
A mudança, no entanto, gerou forte reação entre faculdades particulares com fins lucrativos, que alegam “desequilíbrio competitivo”.
Cinco dias após a publicação do edital, a Associação Brasileira de Mantenedoras de Educação Superior (ABMES), presidida por Janguiê Diniz (grupo Ser Educacional), enviou um ofício ao MEC pedindo isonomia regulatória.
Essas instituições afirmam que o novo modelo é “mais acessível e menos oneroso” para as comunitárias, já que elas não precisam seguir a Lei do Mais Médicos, que obriga cursos privados a se instalarem apenas em regiões com baixa densidade de médicos.
“Solicitamos tratamento isonômico para todas as instituições de ensino diante da decisão recente que concedeu benefícios às universidades comunitárias”, declarou a ABMES.
Outras associações do setor, como a Anup (Associação Nacional de Universidades Privadas) e a Amies, também pediram ao MEC revisão das normas — algumas defendendo endurecimento das regras para comunitárias, outras pedindo que os critérios mais brandos valham para todos.
Já a Associação Brasileira das Instituições Comunitárias de Educação Superior (Abruc) contesta a tese de privilégio e diz que as regras distintas são justificadas pelas diferenças de natureza jurídica.
“As comunitárias só podem firmar convênios com hospitais públicos e dentro do mesmo município, enquanto as privadas podem buscar parcerias com redes privadas e em outras regiões”, explica Dyogo Patriota, assessor jurídico da Abruc.
Disputa bilionária e suspensão temporária
A abertura de novos cursos de Medicina é tema sensível por envolver um mercado bilionário — cerca de R$ 26,4 bilhões ao ano, o equivalente a 40% de todo o ensino superior privado no país.
Entre 2014 e 2024, o número de cursos particulares saltou de 1,3 mil para 4,3 mil, consolidando o setor como o principal formador de médicos no Brasil.
No entanto, após a publicação do edital, o MEC decidiu suspender temporariamente o processo por 120 dias, conforme portaria publicada no Diário Oficial da União. Segundo o ministério, a suspensão tem “caráter técnico e temporário”, e servirá para reavaliar o impacto da recente expansão de cursos e vagas.
Durante o período, o MEC e o Ministério da Saúde farão um diagnóstico sobre a infraestrutura pública disponível e a distribuição ideal de vagas em todo o território nacional.
O avanço na formação médica
Mesmo com as divergências, o Brasil vive um crescimento expressivo na oferta de profissionais. Segundo o estudo Demografia Médica 2025, da Associação Médica Brasileira (AMB), o país deve encerrar o ano com 635,7 mil médicos registrados, uma taxa de 2,98 profissionais por mil habitantes — número próximo ao da média da OCDE.
Em 2010, essa taxa era de apenas 1,63 por mil. O aumento mostra que o ritmo de formação de médicos supera o crescimento populacional.




