A cerca de 80 quilômetros de Manaus, seis enormes anéis metálicos se erguem acima da copa das árvores. Cada um deles, com 30 metros de diâmetro, compõe o AmazonFACE, o maior experimento a céu aberto sobre mudanças climáticas do mundo. A iniciativa, fruto de uma parceria entre os governos do Brasil e do Reino Unido, tem o objetivo de entender como a floresta amazônica reagirá ao aumento da concentração de dióxido de carbono (CO₂) na atmosfera.
O projeto, orçado em R$ 260 milhões (com investimento inicial superior a R$ 120 milhões), foi concebido pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e coordenado por cientistas brasileiros e britânicos. Sua proposta é ambiciosa: simular a atmosfera do futuro e observar, em tempo real, como as árvores, o solo e os ecossistemas respondem a um planeta mais quente e com mais gases de efeito estufa.
Três dos seis círculos bombeiam CO₂ diretamente sobre o dossel da floresta, enquanto os outros três funcionam como áreas de controle, recebendo apenas ar ambiente. Assim, os pesquisadores isolam o efeito do gás sobre a vida vegetal e o ciclo do carbono, uma metodologia inédita em florestas tropicais.
Com 96 torres, quatro guindastes de 45 metros e 423 espécies de árvores catalogadas, o AmazonFACE funciona como um gigantesco laboratório ao ar livre. Mais de cem cientistas e técnicos participam das medições, que registram desde a fotossíntese das folhas até o fluxo de seiva no interior dos troncos.
As câmeras instaladas nas torres e drones captam milhares de imagens diárias da folhagem, registrando o crescimento, a floração e a quantidade de folhas disponíveis para fotossíntese. No solo, tubos transparentes e sensores monitoram o desenvolvimento das raízes e a composição química da terra.
Entre os primeiros resultados, os pesquisadores já identificaram que folhas e raízes — partes mais dinâmicas da floresta — respondem mais rapidamente ao aumento de CO₂ do que os troncos e estruturas de crescimento lento. Também foi constatado que a produtividade das plantas é limitada pela baixa disponibilidade de fósforo no solo amazônico, o que pode reduzir o potencial da floresta de absorver carbono no futuro.

Um alerta sobre o ponto de não retorno
O AmazonFACE também estimou o custo socioeconômico global caso a Amazônia ultrapasse o chamado “ponto de não retorno” — quando o bioma deixaria de absorver carbono e passaria a liberá-lo, acelerando o aquecimento global. O impacto pode chegar a US$ 7 trilhões em 30 anos.
“Temos uma oportunidade única de observar todos os processos da floresta interagindo ao mesmo tempo”, afirma Carlos Quesada, engenheiro florestal do Inpa e coordenador brasileiro do projeto. O britânico Richard Betts, do MetOffice, complementa: “Sabíamos que a maior incerteza sobre um colapso amazônico era a resposta da floresta ao CO₂ elevado. Agora podemos testar isso no mundo real.”
Desde o século 18, a concentração de gás carbônico na atmosfera saltou de 280 para 420 partes por milhão, elevando a temperatura média global em 1,3°C. Nesse cenário, entender como a maior floresta tropical do planeta reagirá é essencial para refinar modelos climáticos e orientar políticas de adaptação.
Uma janela para o futuro
Desenvolvido ao longo de 15 anos e já em fase de coleta de dados contínua, o AmazonFACE registra informações a cada dez minutos, medindo trocas gasosas, variações de temperatura e fluxos de carbono e água.
Os resultados, esperados nos próximos cinco anos, serão apresentados em fóruns internacionais — incluindo a COP30, em Belém (PA). A expectativa é que o experimento ajude a prever com maior precisão o papel da Amazônia no equilíbrio climático global, num momento em que o planeta busca caminhos para conter o aquecimento e evitar o colapso ambiental.




