No sul do Pará, em uma região isolada e de acesso controlado conhecida como Campo de Provas Brigadeiro Velloso (CPBV), o Brasil manteve por décadas aquilo que autoridades classificavam como um verdadeiro “segredo de Estado”. A área militar da Serra do Cachimbo, hoje conhecida por abrigar estruturas de treinamento da Força Aérea Brasileira (FAB), foi, no passado, o centro do “Programa Paralelo” — uma iniciativa clandestina que tinha como objetivo dominar o ciclo completo do combustível nuclear com finalidades bélicas.
Iniciado durante o regime militar, o programa corria à margem do acordo nuclear firmado com a Alemanha, responsável pela construção das usinas de Angra. Conduzido diretamente pelas Forças Armadas, o projeto avançou silenciosamente, buscando dotar o país da capacidade autônoma de produzir um artefato nuclear em pleno contexto da Guerra Fria.
Documentos oficiais hoje disponíveis no Acervo Nacional mostram que o Programa Paralelo chegou a etapas decisivas. No centro da operação estava uma perfuração de 320 metros de profundidade, codinome “Tango”, localizada dentro do CPBV. O poço foi projetado para a realização de um teste nuclear subterrâneo, considerado o passo final para comprovar a capacidade atômica brasileira.
A justificativa para o investimento era a busca por autonomia estratégica, dissuasão militar e a intenção de posicionar o Brasil entre o grupo restrito de nações com potencial nuclear, em uma época marcada por tensões globais e disputas geopolíticas.

Uma área militar gigantesca e preservada
Informações divulgadas em 2018 pelo governo federal revelam a dimensão do CPBV: cerca de 22 mil quilômetros quadrados, o equivalente ao tamanho de Sergipe. A área é dividida entre estruturas administrativas e operacionais, incluindo estande de tiro para aeronaves, pista de pouso e alvos distribuídos pelo território — tudo isso cercado por extensas áreas verdes e mananciais preservados da Serra do Cachimbo.
A FAB mantém a fiscalização e a proteção ambiental da região, considerada um importante reduto de biodiversidade no norte do país. Ao longo dos anos, inúmeras tentativas de invasão para exploração ilegal de madeira e minérios foram repelidas, reforçando a função estratégica e ecológica da área.
Da aviação ao segredo nuclear: um histórico singular
O CPBV tem origem ainda na década de 1950, quando a Serra do Cachimbo se tornou ponto de apoio para aeronaves que cruzavam o Brasil. Em 3 de setembro de 1950, dois aviões pousaram em uma clareira arenosa, dando início à ocupação militar da região. A partir de 1954, começaram as obras de infraestrutura, mas o campo só foi oficialmente instituído em 1983, após a criação de um grupo técnico solicitado pelo Estado-Maior das Forças Armadas.
Desde então, o local transformou-se em um dos espaços mais estratégicos do país — primeiro para o avanço da aviação, depois como núcleo de testes e, posteriormente, como centro do programa nuclear sigiloso.




