O Vaticano publicou, no fim de novembro, uma nova nota doutrinária sobre sexualidade e matrimônio, aprovada pelo papa Leão XIV, que apresenta três orientações inéditas sobre a relação sexual dentro do casamento. O documento Una Caro (“Uma Só Carne”), elaborado pelo Dicastério para a Doutrina da Fé, reconhece oficialmente que o sexo não se restringe à finalidade de gerar filhos, mas também fortalece a união emocional e espiritual entre marido e mulher.
A nota reafirma o valor da monogamia, critica práticas como poligamia e poliamor, e responde a questionamentos recentes de bispos africanos sobre a doutrina matrimonial.
O texto consolida uma mudança progressiva na visão da Igreja, que desde o Concílio Vaticano II vinha atribuindo maior destaque ao sentido unitivo — e não apenas procriativo — da vida sexual conjugal.

Segundo o documento, três novas diretrizes passam a integrar a orientação oficial:
1. Casais inférteis podem viver plenamente a sexualidade
A Igreja reconhece que casais sem possibilidade de ter filhos mantêm a essência do matrimônio, podendo exercer o sexo como expressão legítima de afeto e unidade.
2. O ato sexual não precisa ter intenção consciente de procriação
O Vaticano afirma que o casal não é obrigado a buscar a concepção em cada relação. O sexo pode ser vivido como expressão de amor e entrega, “enriquecendo a reciprocidade conjugal”, sem violar a abertura à vida.
3. Uso dos períodos naturais de infertilidade
A Igreja legitima a prática de relações sexuais durante períodos naturalmente inférteis, que podem servir “não só para regular as taxas de natalidade, mas também para escolher os momentos mais adequados para acolher uma nova vida”, diz o texto.
Monogamia é reforçada como princípio fundamental
A nota também se dedica a reafirmar a doutrina tradicional da monogamia, agora associada ao conceito de “pertencimento mútuo”, entendido como exclusividade total entre homem e mulher.
“A união monogâmica é a expressão plena da pertença recíproca, que não pode ser compartilhada com terceiros”, afirma o documento.
A discussão foi motivada por preocupações de bispos africanos sobre a convivência cultural entre cristianismo e práticas poligâmicas.
Evolução histórica da visão da Igreja sobre o sexo
Historicamente, a Igreja já tratou o sexo com grande rigidez. Manuais dos séculos 16 e 17 recomendavam abstinência em longos períodos, como Quaresma e domingos.
A partir do século 20 — especialmente após o Concílio Vaticano II — o magistério passou a integrar o valor afetivo do ato sexual.
O Catecismo de 1992 afirma que a sexualidade “é fonte de alegria e prazer” quando vivida no amor autêntico.
Teólogos consultados apontam que o novo documento consolida definitivamente essa evolução.
Influências literárias e filosóficas
Em tom incomum, Una Caro cita autores como Pablo Neruda, Emily Dickinson, Rabindranath Tagore, Walt Whitman e até trechos de Kierkegaard para ilustrar a profundidade emocional e espiritual do amor conjugal.
As referências têm o objetivo de demonstrar que a exclusividade e a entrega total presentes no casamento católico encontram eco na cultura universal.




