Comprar um imóvel na planta e descobrir, após a entrega, que ele é menor do que o prometido em contrato é uma situação mais comum do que se imagina — e pode gerar prejuízos significativos ao consumidor. A legislação brasileira prevê direitos específicos nesses casos, mas impõe prazos curtos para que o comprador possa exigir reparação.
Dados obtidos pelo portal UOL, via Lei de Acesso à Informação (LAI), mostram que a Caixa Econômica Federal — responsável por cerca de dois em cada três financiamentos imobiliários no país — reintegrou 8.762 imóveis no primeiro trimestre de 2025. O número representa queda de 33,4% em relação ao mesmo período de 2024.
O valor total dos imóveis retomados foi de R$ 1,15 bilhão, redução de 25,8%. Segundo especialistas, o cenário é reflexo da queda da inadimplência, impulsionada pelo menor índice de desemprego da história e pela evolução da renda média dos brasileiros. Apesar da Selic em 15% ao ano, contratos já firmados não sofrem alteração.
A orientação jurídica adequada e a análise cuidadosa do contrato são essenciais para definir quais medidas podem ser adotadas.
Diferença entre venda ad corpus e ad mensuram
A principal questão jurídica envolvendo metragem menor está no tipo de venda firmado no contrato.
Na venda ad corpus, o imóvel é comercializado como um todo, sem preço vinculado ao metro quadrado. Nesses casos, expressões como “aproximadamente” ou “em torno de” costumam constar no contrato, e pequenas variações de área são toleradas.
Já na venda ad mensuram, a metragem é elemento essencial do negócio. Se o imóvel for entregue com área inferior à contratada, o comprador pode exigir:
- Complementação da área;
- Abatimento proporcional do preço;
- Ou, em casos mais graves, a resolução do contrato.
De acordo com o Código Civil, se a diferença entre a metragem prometida e a entregue não ultrapassar 20% da área total indicada, presume-se que a referência foi apenas indicativa, o que pode limitar a atuação do comprador.
Ainda assim, mesmo na venda ad mensuram, o consumidor tem prazo decadencial de 1 ano, contado a partir do registro do imóvel ou da imissão na posse, para exercer seus direitos.
Prazo do CDC para vícios aparentes
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) também se aplica às relações imobiliárias. Conforme o artigo 26, o comprador tem 90 dias após a entrega do imóvel para reclamar de vícios aparentes ou de fácil constatação, como defeitos visíveis ou inconsistências facilmente perceptíveis.
Esse prazo é independente do prazo de 1 ano previsto no Código Civil para casos de metragem inferior.
Em decisão recente, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que uma imobiliária de Brasília devolvesse valores a compradores após constatar que o imóvel tinha metragem inferior à prometida.
O tribunal entendeu que vaga de garagem não pode ser incluída na área privativa do imóvel quando possui numeração própria e delimitação específica.
No voto, o relator, ministro Marco Buzzi, afirmou que houve erro ao considerar a garagem como área comum. Segundo o entendimento do STJ, a vaga só pode ser considerada área comum quando não estiver vinculada a uma unidade específica.
Atenção aos prazos e orientação especializada
Especialistas alertam que o prazo decadencial — para exigir abatimento, complemento da área ou rescisão — não se confunde com o prazo prescricional para pedir indenização por danos decorrentes do descumprimento contratual.
Por se tratar de um tema complexo, que envolve normas do Código Civil e do CDC, a recomendação é que o consumidor busque orientação de um advogado especializado antes de fechar o contrato e, principalmente, ao identificar qualquer irregularidade após a entrega do imóvel.




