Consumir ou compartilhar filmes, séries e programas de TV estrangeiros pode levar à pena de morte na Coreia do Norte. A prática, considerada uma das formas mais extremas de repressão no mundo, foi detalhada em um novo relatório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), divulgado recentemente.
O documento, com 14 páginas, afirma que o regime de Kim Jong Un intensificou drasticamente o controle sobre a população na última década, ampliando o uso da pena capital e endurecendo punições por crimes ligados ao acesso à informação externa. Segundo a ONU, ao menos seis novas leis aprovadas desde 2015 passaram a permitir a execução de cidadãos por delitos que antes resultavam em penas mais brandas.
Entre esses crimes está o compartilhamento de conteúdo estrangeiro, como filmes, séries e novelas sul-coreanas — conhecidas como K-dramas — vistas pelo governo como uma ameaça direta à ideologia do regime.
“Nenhuma outra população no mundo vive sob restrições tão severas quanto a da Coreia do Norte”, conclui o relatório do ACNUDH.
Execuções públicas para espalhar medo
De acordo com os depoimentos coletados, as execuções tornaram-se mais frequentes a partir de 2020 e costumam ser realizadas em público, por fuzilamento, com o objetivo de intimidar a população e desencorajar qualquer contato com conteúdos externos.
O relatório foi elaborado com base em mais de 300 entrevistas com desertores norte-coreanos, realizadas ao longo dos últimos dez anos. Pyongyang se recusou a permitir o acesso de investigadores da ONU ao país e rejeitou oficialmente as conclusões do documento.

O Alto Comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Türk, alertou para o agravamento do cenário:
“Se essa situação continuar, os norte-coreanos serão submetidos a ainda mais sofrimento, repressão brutal e medo, algo que já enfrentam há muito tempo”, afirmou.
Relatos chocantes de desertores
Entre os testemunhos, está o de Kang Gyuri, que conseguiu fugir da Coreia do Norte em 2023. Em entrevista à BBC, ela relatou que três amigos próximos foram executados após serem flagrados com conteúdo sul-coreano.
“Um deles tinha apenas 23 anos. Ele foi julgado junto com criminosos ligados ao tráfico de drogas. Esses crimes agora são tratados da mesma forma”, contou Kang.
Segundo ela, desde 2020 o medo se tornou generalizado, com vigilância mais intensa e punições exemplares.
Controle total da vida dos cidadãos
O relatório da ONU destaca que o Estado norte-coreano exerce controle absoluto sobre todos os aspectos da vida de seus cidadãos, restringindo severamente direitos civis, políticos, sociais e econômicos. A vigilância se tornou ainda mais eficaz com o uso de tecnologias modernas, ampliando a capacidade do regime de monitorar comportamentos e punir desvios.
Apesar de expectativas iniciais de melhora quando Kim Jong Un assumiu o poder, em 2011, os desertores afirmam que a realidade seguiu o caminho oposto. Promessas de crescimento econômico e melhores condições de vida não se concretizaram, enquanto a repressão se intensificou.




