Um encontro tão surpreendente quanto perigoso: uma rara lesma-do-mar da espécie Glaucus atlanticus, conhecida como dragão azul, foi encontrada morta na areia da praia de Peruíbe, no litoral sul de São Paulo. A descoberta foi feita pela bióloga e pesquisadora Gemany Caetano em abril, sob orientação do Prof. Dr. Luiz Ricardo Lopes de Simone, do Museu de Zoologia da USP.
Apesar de seu nome místico e aparência exuberante, o dragão azul é um molusco marinho pelágico, ou seja, vive em alto-mar, longe da costa. Segundo a especialista, esse tipo de animal aparece ocasionalmente nas praias quando há ventos fortes e correntes marinhas que o empurram para a terra firme. No entanto, ao encalhar, o Glaucus atlanticus não consegue retornar ao mar.
“Ele não tem adaptação para o ambiente terrestre e sofre com a desidratação causada pelo sol e vento”, explicou Gemany.

Um predador brilhante e letal
Com cerca de 3 centímetros de comprimento, o dragão azul flutua de costas e exibe a barriga azul cintilante — uma estratégia de camuflagem contra predadores tanto acima quanto abaixo da linha d’água. Embora pequeno, é um predador eficiente. Alimenta-se de organismos venenosos como a caravela-portuguesa, apropriando-se de suas células urticantes, que armazena nos tentáculos para se defender e atacar.
Essa habilidade faz com que sua ferroada seja potencialmente perigosa até mesmo para humanos, mesmo após a morte do animal. O contato pode causar queimaduras, dores e reações alérgicas.
“É um animal encantador, mas precisa ser respeitado”, alertou a pesquisadora.
Ecologia e ciência
O Glaucus atlanticus existe há pelo menos 2 milhões de anos e habita águas tropicais e temperadas em diversos oceanos. Além de seu valor ecológico, ele desperta interesse da ciência: “Esses nudibrânquios têm papel importante nos ecossistemas marinhos e estão sendo estudados em pesquisas neurológicas e para o desenvolvimento de fármacos”, destacou a bióloga.
Outro aspecto curioso é seu comportamento reprodutivo: por serem hermafroditas, possuem órgãos masculinos e femininos, mas ainda assim precisam de um parceiro para se reproduzir. Quando se encontram — um evento raro, já que vivem dispersos no oceano —, podem colocar até 20 ovos por vez sobre objetos flutuantes.
A “frota azul” e o alerta
Quando reunidos, os dragões azuis formam a chamada “frota azul”, um espetáculo visual raro e perigoso. Segundo a bióloga, a aparição em Peruíbe pode estar ligada a fenômenos como ressacas e ciclones extratropicais. Por isso, ela recomenda atenção:
“Mesmo morto, esse animal pode causar acidentes. Catadores e banhistas devem evitar o toque direto”.
Apesar do infortúnio da morte do espécime, o achado contribui para ampliar o conhecimento sobre a biodiversidade marinha no litoral paulista. O Glaucus faz jus ao nome que carrega. Deve ser preservado para que futuras gerações tenham a oportunidade de conhecê-lo.




