A Polícia Federal (PF) revelou por inquérito na última semana uma nova camada da fraude bilionária que atinge o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Após identificar irregularidades em associações de aposentados e pensionistas, investigações apontam que muitos dos dirigentes dessas entidades eram, simultaneamente, beneficiários de programas sociais como o Bolsa Família, CadÚnico e Auxílio Brasil.
O uso de pessoas com baixa renda ou sem experiência gerencial reforça a tese de que esses presidentes funcionavam apenas como “laranjas” — enquanto o comando real das operações estava nas mãos de empresários, advogados e servidores públicos.
As entidades investigadas, entre elas a Associação dos Aposentados e Pensionistas do Brasil (AAPB) e a Associação dos Aposentados e Pensionistas Nacional (AAPEN), firmaram acordos de cooperação técnica com o INSS e, juntas, movimentaram cerca de R$ 1,7 bilhão nos últimos anos.
A PF destaca que os responsáveis formais pelas associações incluem desde uma senhora de 81 anos até uma funcionária da limpeza de uma empresa ligada ao esquema, todos usados para mascarar a verdadeira liderança por trás das operações.
Esquema usava convênios para descontar indevidamente dos aposentados
A principal artimanha utilizada era o desconto em folha dos aposentados, sob a justificativa de serviços associativos prestados por essas entidades. Na prática, os serviços raramente eram oferecidos, e os recursos iam parar em contas ligadas aos verdadeiros operadores financeiros do esquema. Entre eles, está o advogado Roberto Marinho Luiz da Rocha, apontado como articulador dos repasses a servidores do INSS.
A Controladoria-Geral da União (CGU) estima que o prejuízo total aos cofres públicos pode chegar a R$ 6,3 bilhões. Os desdobramentos já causaram a suspensão de todos os convênios do INSS com entidades privadas e a exoneração do presidente da autarquia. Além disso, uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) está em processo de instalação na Câmara dos Deputados.
Uso de vulneráveis para blindar fraudes
O inquérito ressalta que, embora legalmente não haja impedimentos para que idosos ou pessoas de baixa renda ocupem cargos de gestão, a complexidade e o volume das operações dessas associações exigem competências que os dirigentes formais não possuíam.
A investigação vê nisso um indício claro de que essas pessoas eram utilizadas apenas para assinar documentos, enquanto decisões estratégicas e financeiras eram tomadas por um núcleo oculto de beneficiários do esquema.
Em nota, a APB afirmou colaborar com as investigações e garantiu que sempre atuou dentro da legalidade. Já a AAPEN aparece no centro de outro braço do esquema, envolvendo viagens internacionais e repasses suspeitos a servidores públicos.
“A AAPB sempre obedeceu a legalidade, tendo apresentado toda documentação pertinente para a obtenção do Acordo de Cooperação Técnica junto ao INSS e respeitando todo trâmite burocrático atinente a sua atividade”
O uso de testas de ferro, segundo os investigadores, caracteriza a atuação de uma organização criminosa altamente estruturada, semelhante a modelos de lavagem de dinheiro já vistos em outros setores da máquina pública.