A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), criada em 1943 para proteger os direitos dos trabalhadores brasileiros, completou 82 anos sendo vista com desconfiança — e até repulsa — pelas novas gerações.
Para muitos adolescentes, o regime de trabalho formal virou sinônimo de exploração, rotina opressiva e falta de liberdade, em contraste com a promessa de autonomia e sucesso fácil vendida nas redes sociais.
Essa percepção foi mostrada em um vídeo da influenciadora Fabiana Sobrinho, a Fabi Bubu, onde sua filha de 12 anos revela medo da vida sob a CLT. A menina, como muitos da nova geração, prefere sonhar com a liberdade do empreendedorismo digital, livre de patrões e ônibus lotados.
CLT como sinônimo de fracasso?
Especialistas apontam que esse fenômeno não ocorre apenas por desinformação, mas também por experiências concretas vividas ou observadas. O professor Fernando Cássio, da Universidade de São Paulo (USP), lembra que a precarização do trabalho formal após reformas trabalhistas e o avanço da plataformização criaram um ambiente onde direitos são vistos como ilusórios. Quando o trabalho com carteira não garante dignidade nem segurança, a juventude passa a buscar alternativas – ainda que frágeis e incertas – no empreendedorismo digital e nos chamados “bicos”.
A internet reforça essa narrativa, promovendo uma visão idealizada de sucesso individual baseado em esforço próprio e desvalorizando direitos conquistados historicamente. A historiadora Laura Sabino alerta que muitos jovens desconhecem que benefícios como férias, 13º salário e aposentadoria são fruto de lutas da classe trabalhadora. A narrativa meritocrática difundida pelas redes sociais substituiu o senso de coletividade por promessas de enriquecimento rápido – um caminho percorrido com sucesso por poucos.
Além disso, problemas reais como adoecimento mental, falta de flexibilidade e assédio moral são frequentemente associados ao regime CLT, afastando ainda mais os jovens da ideia de um trabalho formal protegido.
O desafio de recuperar o valor do trabalho formal
Dados do Ministério do Trabalho revelam que, entre jovens de 18 a 24 anos, 36% pediram demissão por causa dos baixos salários e 26% relataram problemas de saúde mental relacionados ao emprego. A falta de flexibilidade e a convivência com chefes autoritários também alimentam o desencanto com o modelo CLT.
O desprezo pela CLT é, em parte, fruto da realidade precária do próprio mercado de trabalho. Para mudar esse cenário, especialistas defendem o fortalecimento da educação crítica, o resgate da história das lutas trabalhistas e a valorização da organização coletiva.
A escola, como aponta Cássio, deve ser um espaço de formação para além da lógica individualista, capaz de mostrar que ter direitos não é um entrave ao sucesso, mas uma garantia de dignidade.