Desde 1986, quando a sonda Voyager 2 fez seu histórico sobrevoo por Urano, a NASA acreditava que o planeta mais excêntrico do Sistema Solar era “morto” energeticamente, sem gerar calor interno — ao contrário de Júpiter, Saturno e Netuno, que irradiam mais energia do que recebem do Sol.
Agora, 39 anos depois, essa ideia foi derrubada por dois estudos independentes, conduzidos por equipes da Universidade de Oxford (Reino Unido) e da Universidade de Houston (EUA), em colaboração com cientistas da própria NASA. Os trabalhos revelam que Urano libera cerca de 15% mais energia do que recebe do Sol, o que indica que o planeta possui sim uma fonte interna de calor.
A descoberta foi publicada em duas revistas científicas de peso — Monthly Notices of the Royal Astronomical Society (maio de 2025) e Geophysical Research Letters (julho de 2025) — e coloca fim a uma dúvida que intrigou gerações de astrônomos.

Por que a NASA errou por quase quatro décadas?
Segundo Amy Simon, cientista planetária do Goddard Space Flight Center, a confusão nasceu de uma limitação de dados:
“Tudo se baseava em uma única medição feita pela Voyager 2 em 1986. Aquilo virou consenso, mas era uma amostra muito frágil.”
Na época, a sonda detectou temperaturas surpreendentemente baixas e não encontrou sinais claros de calor interno, levando a teorias de que Urano poderia ter:
- Idade muito superior à dos outros gigantes gasosos (e já teria esfriado totalmente);
- Ou que um impacto colossal — o mesmo que provavelmente o deixou girando “de lado” — teria dissipado todo o calor do planeta.
Nenhuma dessas hipóteses convencia a comunidade científica.
Como o mistério foi resolvido?
Usando modelagem computacional avançada e décadas de dados de telescópios espaciais e terrestres (como o Hubble e o Infrared Telescope Facility, do Havaí), os pesquisadores recalcularam o balanço energético de Urano:
- Mediram com mais precisão quanto da luz solar o planeta reflete (descobriram que ele é muito mais reflexivo do que se pensava);
- Estimaram quanta energia o planeta emite como calor.
O resultado mostrou que Urano, embora frio e distante, está liberando lentamente o calor remanescente de sua formação há 4,5 bilhões de anos — exatamente como seus “primos” Júpiter, Saturno e Netuno.
Um planeta esquisito e ainda cheio de mistérios
Urano é quatro vezes maior que a Terra e tem peculiaridades únicas:
- Gira “deitado”, com o eixo inclinado em 98º;
- Cada polo enfrenta 42 anos de luz solar direta e depois 42 anos de completa escuridão;
- Roda na direção contrária à maioria dos planetas (assim como Vênus).
Apesar de mais quente do que se acreditava, o planeta continua sendo um dos corpos mais frios do Sistema Solar, com temperaturas médias de -224°C.