Quase 40 anos após a explosão do reator 4 da Usina Nuclear de Chernobyl, um dos lugares mais radioativos do planeta abriga um dos seres vivos mais enigmáticos já observados pela ciência: um fungo negro capaz de prosperar em ambientes letais para qualquer outro organismo complexo.
O Cladosporium sphaerospermum, encontrado aderido às paredes internas do prédio mais contaminado da zona de exclusão, não apenas sobrevive à radiação ionizante — ele cresce melhor quando é exposto a ela. A descoberta, que parece saída de ficção científica, foi feita ainda nos anos 1990, mas continua intrigando especialistas em todo o mundo.
A microbiologista ucraniana Nelli Zhdanova, da Academia Nacional de Ciências da Ucrânia, liderou em 1997 a primeira expedição científica ao abrigo do reator destruído. O objetivo era simples: descobrir se alguma forma de vida havia resistido ao desastre nuclear.
O resultado surpreendeu: foram encontrados 37 espécies de fungos, muitos deles completamente negros e ricos em melanina.
Entre eles, um dominava todas as amostras — o C. sphaerospermum — e apresentava os maiores níveis de contaminação radioativa. Mais impressionante: o fungo parecia crescer voltado para as fontes de radiação, como plantas que se inclinam em direção à luz.

A teoria da “radiossíntese”
Em 2007, a radiobióloga Ekaterina Dadachova, do Albert Einstein College of Medicine (EUA), realizou o experimento que mudaria a compreensão sobre o fungo. Ao expor o C. sphaerospermum a césio radioativo, constatou que ele cresceu 10% mais rápido.
A cientista propôs então um mecanismo inédito, chamado radiossíntese — uma espécie de “fotossíntese nuclear”.
A melanina, responsável pela cor escura do fungo, seria o “painel energético”, capaz de capturar radiação, transformar sua estrutura química e, possivelmente, converter parte dessa energia para o metabolismo do organismo.
A hipótese é forte, mas ainda não comprovada. Pesquisadores não conseguiram demonstrar, por exemplo, fixação de carbono ou ganho metabólico direto decorrente da radiação. Ainda assim, algo no metabolismo do fungo claramente muda — e o torna mais apto a se desenvolver.
Testes no espaço mostram potencial como escudo contra radiação
O mistério se aprofundou em 2022, quando uma cepa do fungo de Chernobyl foi enviada à Estação Espacial Internacional (ISS). O objetivo era simples: verificar seu comportamento sob radiação cósmica.
O que os cientistas viram foi surpreendente:
- o fungo cresceu 1,21 vez mais rápido no espaço;
- sensores mostraram que a camada de fungo bloqueou parte da radiação, reduzindo sua incidência sobre o material abaixo.
Isso abriu caminho para uma possibilidade revolucionária: usar o fungo como escudo biológico regenerativo em bases na Lua e em Marte. A NASA já estuda conceitos de “micoarquitetura” — estruturas construídas com fungos, capazes de se autorreparar e proteger astronautas da radiação galáctica.




