Um novo estudo publicado na revista Science acendeu um alerta global sobre o colapso silencioso da vida na Terra. Pesquisadores do Instituto de Ciência e Tecnologia de Okinawa (Japão), em parceria com Harvard e a Universidade de Maryland (EUA), descobriram que 79% das espécies endêmicas de formigas do arquipélago de Fiji estão em declínio populacional — um indício de que o chamado “apocalipse dos insetos” pode estar mais próximo do que se imagina.
Segundo os cientistas, a queda drástica teve início há cerca de 3 mil anos, com a chegada dos primeiros humanos às ilhas do Pacífico Sul, e se acelerou nos últimos 300 anos, período marcado pela colonização europeia, o avanço da agricultura moderna e o aumento do comércio global.
“É uma evidência inédita de algo que há muito suspeitávamos: as espécies de insetos isoladas em ilhas remotas estão desaparecendo rapidamente”, afirma Evan Economo, entomologista e coautor da pesquisa.
Um colapso em escala planetária
O caso de Fiji não é isolado. Pesquisas semelhantes revelam que a abundância de insetos está despencando em todo o mundo:
- Na Alemanha, o número de insetos voadores em 63 reservas naturais caiu 75% em menos de 30 anos;
- Nos Estados Unidos, a população de besouros despencou 83% em 45 anos;
- Na Europa, as borboletas de pradaria diminuíram 36% na última década.
Estima-se que 40% de todas as espécies de insetos do planeta estejam em risco de extinção — uma taxa de perda que chega a 2,5% da biomassa por ano, segundo entomologistas.
As principais causas do fenômeno incluem perda de habitat, uso de pesticidas, mudanças climáticas, poluição luminosa e introdução de espécies invasoras.
“Os insetos são as pequenas engrenagens que mantêm o mundo funcionando. Sem eles, os ecossistemas entram em colapso”, explica Alexander Mikheyev, biólogo evolutivo da Universidade Nacional da Austrália.
A ciência que revela o passado
Como não existem registros históricos consistentes sobre as formigas de Fiji, os pesquisadores recorreram à chamada “genômica comunitária” — uma técnica que analisa variações genéticas em amostras de museu para reconstruir a história populacional das espécies.
Foram examinadas mais de 100 espécies e milhares de espécimes coletados ao longo de décadas. Os dados permitiram rastrear o declínio das populações e até identificar 65 eventos de colonização, nos quais novas espécies chegaram às ilhas, muitas vezes levadas acidentalmente por humanos.
Enquanto as formigas nativas diminuem, espécies invasoras prosperam, adaptando-se melhor aos ambientes urbanos e agrícolas.
“Fiji tem algumas das espécies de formigas mais espetaculares e restritas geograficamente do planeta. O fato de estarem desaparecendo é alarmante — e pode estar acontecendo em outras partes do mundo também”, alerta Economo.
Pequenas, mas vitais
Os insetos são essenciais para a vida na Terra: polinizam plantas, ajudam na decomposição da matéria orgânica, controlam pragas e mantêm o equilíbrio dos ecossistemas. Em Fiji, por exemplo, certas formigas são conhecidas por “cultivar” plantas em árvores, depositando sementes e fertilizando-as com seus próprios excrementos — um processo único na natureza.
O desaparecimento dessas espécies ameaça não apenas a biodiversidade local, mas também cadeias alimentares inteiras.
Os cientistas afirmam que o declínio das formigas de Fiji é um microcosmo do que pode estar ocorrendo globalmente. Em outras palavras, as ilhas funcionam como um “canário na mina de carvão” — um sinal antecipado de um colapso ambiental de grandes proporções.
“Mesmo em locais remotos e aparentemente intocados, como as montanhas do Colorado ou as ilhas do Pacífico, as populações de insetos estão desabando. Isso mostra que nenhum ecossistema está a salvo”, diz o biólogo Keith Sockman, da Universidade da Carolina do Norte.
O “apocalipse” pode ser evitado?
Especialistas defendem que ainda há tempo para reverter parte dos danos, mas isso exige mudanças profundas:
- Reduzir o uso de agrotóxicos e fertilizantes químicos;
- Restaurar habitats naturais;
- Controlar espécies invasoras;
- E adotar políticas globais de conservação da biodiversidade.
Se nada for feito, alertam os pesquisadores, o desaparecimento dos insetos — responsáveis por manter os ecossistemas em funcionamento — pode desencadear um efeito dominó sem precedentes, comprometendo a produção de alimentos, a polinização e o equilíbrio climático.