O Sistema Único de Saúde (SUS) poderá, em breve, oferecer um dos tratamentos mais sofisticados e caros da medicina moderna: a terapia celular CAR-T, já aplicada com sucesso em pacientes com cânceres agressivos e resistentes. A informação foi confirmada pelo ministro da Saúde, Alexandre Padilha, que anunciou a articulação de um acordo entre os países do Brics para nacionalizar a produção dessa tecnologia no Brasil.
Atualmente, o custo de uma única terapia celular pode ultrapassar R$ 3 milhões por paciente, o que limita severamente seu acesso. Com a criação de infraestrutura própria no país, a proposta do governo é reduzir drasticamente os custos, permitir a incorporação da técnica ao SUS e tornar o tratamento disponível para milhares de brasileiros.
O que é a terapia CAR-T?
A terapia celular CAR-T é uma imunoterapia personalizada. Nela, os linfócitos T, células do sistema imunológico do próprio paciente, são coletados, modificados geneticamente em laboratório para reconhecer e combater células tumorais, e depois reintroduzidos no corpo. O processo permite que o organismo ataque diretamente o câncer — como se fosse programado para “caçar” a doença.
Segundo o hematologista e pesquisador Renato Cunha, pós-doutor pelo National Cancer Institute (EUA), a lógica é simples:
“Assim como usamos moléculas em comprimidos, podemos usar células como ferramenta terapêutica”.
A tecnologia tem mostrado excelentes resultados em cânceres hematológicos, como leucemia, linfoma e mieloma múltiplo, com altas taxas de remissão em pacientes que já haviam esgotado outras opções. Em casos de tumores sólidos (pulmão, mama, pâncreas), os desafios ainda são grandes devido ao microambiente mais hostil ao ataque imunológico.
Obstáculos atuais: custo e produção no exterior
Hoje, a maior barreira à expansão do tratamento é o custo elevado, impulsionado pela dependência de laboratórios estrangeiros e pelo caráter altamente personalizado da terapia. O processo envolve o envio de células para fora do país, onde elas são modificadas e devolvidas ao Brasil — o que encarece e atrasa o tratamento.
Apesar de algumas terapias aprovadas pela Anvisa já estarem disponíveis em planos de saúde privados (como Tisa-cel, Axi-cel e Cilta-cel), o SUS ainda não oferece o procedimento. Pesquisadores brasileiros, no entanto, já iniciaram estudos clínicos com produção nacional de células modificadas, o que demonstra a viabilidade de implantação local da tecnologia.
Caminhos para viabilizar o acesso
A parceria internacional com os países do Brics deve viabilizar a criação de centros de produção no Brasil, nacionalizando parte do processo e possibilitando a adoção de modelos de pagamento por desempenho. Nesse sistema, o custo do tratamento varia conforme os resultados obtidos: se o paciente responde bem, o hospital recebe mais; se não há resposta, o valor é reduzido.
Segundo o Ministério da Saúde, a meta é não buscar uma cura universal para todos os tipos de câncer, mas transformar a doença em algo controlável a longo prazo, com qualidade de vida para os pacientes. A nacionalização das terapias celulares marca, segundo especialistas, o início de uma nova era no tratamento oncológico no Brasil.
Se viabilizada, a iniciativa representará um salto histórico na política pública de saúde, colocando o SUS entre os sistemas de saúde mais avançados do mundo no combate ao câncer.