Um levantamento inédito revelou que 3 mil toneladas de ouro exportadas por Brasil, Peru, Colômbia, Equador e Venezuela entre 2013 e 2023 não têm origem conhecida — o equivalente à metade de todo o ouro oficialmente enviado ao exterior pelos cinco países no período. O dado acende um alerta sobre o crescimento acelerado da mineração ilegal na Amazônia e em outras áreas sensíveis da América do Sul.
A apuração faz parte da investigação jornalística “Opacidade Dourada: mecanismos do tráfico de ouro latino-americano”, liderada pelo veículo peruano Convoca e integrada pela Repórter Brasil e outros meios do continente. E o país que mais chama atenção no estudo é justamente o que mais alimenta o desequilíbrio.
Segundo o levantamento, o Peru exportou 4,4 mil toneladas de ouro na última década, mas só registrou 1,3 mil toneladas de produção. A diferença — um rombo de mais de 3 mil toneladas — corresponde a quase todo o ouro “desaparecido” da América Latina.
Enquanto o país figura como décimo maior produtor mundial e segundo da América Latina, a realidade por trás dos números envolve criminalidade, destruição ambiental e ausência de fiscalização eficiente.
A região de Madre de Dios, no sudeste peruano, é hoje o epicentro da devastação. Balsas e dragas operam dia e noite, abrindo crateras que substituem a floresta por poços de água avermelhada. Desde 2017, o departamento perde em média 21 mil hectares de mata por ano.
A busca frenética pelo ouro é alimentada pelo preço internacional do metal, que bateu recordes históricos nos últimos anos. O resultado é um ambiente de conflito permanente entre comunidades, mineradores formais, informais e grupos ilegais associados ao crime organizado.
Tráfico de ouro ultrapassa fronteiras e fomenta violência
As três modalidades de mineração no Peru — formal, informal e ilegal — se misturam e abastecem o mesmo mercado. Os ilegais, porém, são os que mais destroem e financiam grupos criminosos que controlam territórios como La Pampa, conhecida como “terra sem lei”.
Casos de violência se tornam comuns. Em uma das áreas de extração, dois irmãos, Robert e Reinaldo Quispe, foram brutalmente atacados a golpes de machado por invasores ilegais enquanto delimitavam sua concessão.
Mesmo quando há autorização estatal para minerar, o próprio Estado falha em reconhecer formalmente os trabalhadores, criando um ambiente caótico que facilita o escoamento do ouro ilegal para o exterior.
Em 2022, por exemplo, o Peru produziu oficialmente 96 toneladas, mas exportou quase 180 toneladas para países como Canadá, Índia, Suíça e Estados Unidos.
Colômbia, Equador e demais países também exibem irregularidades
Embora o Peru lidere o desequilíbrio, outros países latino-americanos também apresentam cifras alarmantes:
- Colômbia: exportou 59 toneladas a mais do que produziu entre 2013 e 2023
- Equador: exportou 12 toneladas a mais entre 2017 e 2023
- Brasil: dados incompletos, mas entre 2015 e 2021 produziu 34 toneladas a mais do que exportou
- Venezuela: produziu 52,6 toneladas a mais do que exportou; lacunas impossibilitam análise precisa
Mesmo onde a produção supera as exportações, a mineração ilegal cresce rapidamente, sobretudo em regiões fronteiriças, onde rotas clandestinas conectam países amazônicos.




