Um novo estudo científico reforça a hipótese de que infecções virais podem estar diretamente ligadas ao desenvolvimento do Mal de Alzheimer, a forma mais comum de demência no mundo. De acordo com a pesquisa, publicada na revista Science Signaling, a infecção pelo herpes simplex vírus tipo 1 (HSV-1) — responsável por casos de herpes labial — pode ser reativada por lesões cerebrais, como concussões, e desencadear processos inflamatórios que levam à degeneração de neurônios e formação de placas amiloides, características clássicas do Alzheimer.
O experimento foi realizado por pesquisadores da Tufts University, nos Estados Unidos, utilizando minicérebros cultivados em laboratório e infectados com HSV-1. Após submeter os tecidos a um impacto mecânico que simula um traumatismo craniano, os cientistas notaram uma intensa resposta inflamatória, morte de neurônios e acúmulo de proteínas beta-amiloides — elementos que marcam a progressão da doença neurodegenerativa. Já os tecidos cerebrais livres da infecção se recuperaram com apenas leve inflamação.
Estima-se que mais de 80% da população com mais de 60 anos tenha tido contato com o HSV-1 ao longo da vida. O vírus, mesmo inativo após o fim dos sintomas visíveis, permanece dormente em neurônios e pode ser reativado em situações de imunidade comprometida ou traumas.
O estudo aponta uma ligação clara entre infecção viral e Alzheimer, especialmente em pessoas portadoras do gene APOE4, associado ao aumento do risco da doença.
“HSV-1 é altamente prevalente e, em cérebros idosos, especialmente nos que possuem o gene APOE4, ele representa um risco expressivo para o Alzheimer”, explicou Ruth Itzhaki, pesquisadora da Universidade de Oxford e coautora da pesquisa.
Medicação antiviral pode reduzir risco
Além da demonstração laboratorial, uma análise populacional publicada no BMJ Open reforça os achados. O levantamento agrupou pacientes com Alzheimer com base em sexo, idade, localização e histórico médico. Os resultados mostraram que pacientes diagnosticados com HSV-1 tinham 80% mais chances de também desenvolver Alzheimer.
Contudo, o estudo trouxe um dado promissor: pessoas com histórico de herpes que utilizaram medicamentos antivirais apresentaram 17% menos chances de desenvolver a demência, o que sugere que tratamentos antivirais podem ter efeito protetor contra o avanço da doença neurodegenerativa.
Novas frentes para prevenção e tratamento
Os dados reforçam a urgência de se repensar estratégias de prevenção e tratamento do Alzheimer, considerando o papel de infecções virais latentes. A pesquisadora Dana Cairns, que liderou o estudo na Tufts, destaca a importância do achado:
“A ideia é que, ao sofrer uma lesão, o paciente possa reativar o HSV-1 — algo que pode ocorrer com qualquer um, já que a maioria da população carrega o vírus sem saber.”
Com mais de 35 milhões de pessoas com demência no mundo, e 7,7 milhões de novos casos diagnosticados por ano, as descobertas trazem uma nova luz sobre fatores causadores do Alzheimer e possíveis caminhos para sua prevenção, especialmente entre idosos, atletas e militares, mais expostos a concussões.