Despotismo gera chocantes incidentes mundiais
Cesar Vanucci*
“O “sumiço” do jornalista, o “suicídio” do vereador, a “renúncia” do chefe da Interpol documentam, mais uma vez, o que os regimes ditatoriais são capazes.” (Antônio Luiz da Costa, Professor)
Governos de características despóticas, contumazes na violação dos direitos fundamentais, acabam de protagonizar novas censuráveis ações de repercussão mundial.
Um dos incidentes impactantes ocorridos implica o reino saudita. Escorada numa estrutura de poder medieval, que comporta até mesmo tolerância em relação à escravatura, a monarquia árabe mantém-se totalmente fechada às conquistas civilizatórias. A Arábia abriga em seu território o local considerado mais sagrado da fé islâmica. Isso lhe confere influência considerável no jogo político regional. Detentor de enormes reservas petrolíferas, exploradas em consórcio com as maiores empresas americanas e europeias do ramo, o país desfruta de prestígio injustificável por parte dos mandatários das potências mundiais, por conta de espúrias conveniências geopolíticas. Seus parceiros empenham-se em ocultar os delitos frequentes perpetrados pelo regime contra os direitos humanos.
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Maquinações cavilosas apontam a realeza saudita como reformista, modernizadora, modelar na defesa dos postulados democráticos. Mas não são suficientes para impedir que muitos analistas de política internacional tragam ao conhecimento público a asfixiante situação em termos de respeito à dignidade humana vigente nos domínios árabes. O escritor e jornalista Michael Moore sustenta que, naquele pedaço do mundo, fica localizada a fonte matricial do fundamentalismo muçulmano. Fundamentalismo esse responsável pela existência do Isis, Al-Qaeda e outras sinistras organizações. Embora os dirigentes sauditas aleguem combater as falanges extremistas, nos bastidores, atuam em sentido totalmente inverso, afirma Moore.
O que ocorreu no dia 2 de outubro passado, na Turquia, é uma amostra tétrica do sufocante clima de repressão praticado pelos sauditas. O jornalista Jamal Khashoggi, colunista do Washington Post, crítico do governo e da aliança dos monarcas com Donald Trump, compareceu ao consulado saudita em Istambul para regularizar papéis referentes a seu enlace matrimonial. Sua noiva ficou a aguardá-lo do lado de fora. O jornalista nunca mais foi visto. De acordo com a segurança turca, foi sequestrado, torturado, morto e esquartejado.
Estranhas movimentações na sede do consulado, rastreadas pela polícia turca, informaram o mundo do “desaparecimento”. Pressionados a se explicarem, ameaçados com sanções, os dirigentes sauditas limitam-se a dizer que promoverão retaliações contra os que os censuram.
Afogada em caos político e econômico, devido a desatinos sem conta cometidos por governantes despreparados, desafeiçoados ao diálogo democrático, nossa vizinha Venezuela assume, outra vez mais, notoriedade negativa no palco dos acontecimentos mundiais. Às voltas com o dilacerante drama dos refugiados, criticada acerbamente pela repressão à liberdade de expressão, pelas violências contra os que discordam da orientação caudilesca dominante, o governo Maduro é acusado agora da eliminação, em circunstâncias cruéis, de um adversário político. A vítima, um vereador, foi conduzida à sede da temida polícia política.
De acordo com a versão oficial, pôs termo à vida, esmagado diante das provas acumuladas de sua participação em delito contra o Estado, atirando-se de uma das janelas do edifício em que se achava detido. Os indícios, entretanto, são de que ele não se jogou, foi jogado depois de “severo interrogatório”…
A China também ganhou evidência por ato chocante, revelador da falta de transparência e desdém com que trata, no seu estilo autocrático de conduzir as coisas, a comunidade das nações e a opinião pública. O presidente da Interpol, chinês Meng Hongwei, que acumula o posto de Secretário de Segurança em seu país, deixou a sede da organização, em Lion, França, para uma viagem de curta duração a Pequim. Como não mais desse qualquer notícia, por bom pedaço de tempo, para familiares e subordinados, depois de pisar no solo chinês, a Interpol resolveu acionar o governo com pedido de esclarecimento. A resposta demorou a ser dada: Meng estava detido por acusações não devidamente especificadas. Por tal razão “resolveu renunciar” ao comando da Interpol. O embaraçoso episódio consignou a impressão de que o cidadão citado foi alvo de um dos tradicionais “expurgos” que pontuam o jogo pelo poder político no sistema comunista. Na comunidade internacional afloraram questionamentos a respeito da forma desrespeitosa com que a China lida com organizações, à feição da respeitável Interpol, que mantêm atividades conectadas com os países em função de tratados por eles referendados.
* Jornalista ([email protected])
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