Golden shower
Carlos Perktold*
O presidente Bolsonaro perguntou no seu twiter o que é “golden shower”. Nesta altura do imbróglio causado pela sua indignação quanto ao que ocorre no Carnaval, ele já deve saber e deve ter ficado perplexo sobre as variedades de satisfação do ser humano. Se ele não sabia o que era, imagine sua surpresa ao descobrir o que é e que há pessoas fazendo. Para o leitor desavisado, golden shower era a satisfação preferida de certo escritor americano e é uma atividade, digamos, sexual de difícil explicação. Ela consiste em ficar no meio de uma roda de rapazes que urinam sobre o sujeito, recebendo aquilo que é um chuveiro dourado. Se existe, é porque há quem goste e a pratica nos dois lados.
Se há pessoas que nunca souberam o que é isso, e o presidente é uma delas, é por causa da ingenuidade com relação ao que satisfaz a libido humana, sempre a procura de um alvo que pode ser qualquer objeto. Sem essa assertiva não se pode compreender as diversas variações sexuais que (des) conhecemos. Os ativistas da urina deveriam estar pra lá de Bagdá quando fizeram e deixaram ser filmados no que faziam. Quem mandou o vídeo para o presidente? A sua divulgação interessa a quem? Por que a preocupação do presidente com o que ocorre durante a festa? Nem o Papa comenta essas coisas, por que o Jair o fez?
O Carnaval é ocasião para aliviar as tensões psicológicas acumuladas durante o ano e para quem quer expor suas intimidades, bestialidades, desumanidades e sexualidade reprimidas. Uma delas é filmar o que o outro faz e ver o resultado em casa, no conchego do lar de bem casado, cujo vizinho jamais imagina a preferência daquele que é tão discreto no dia a dia. Outro indivíduo pode viajar longe de casa para se fantasiar de um gênero diferente do seu e fazer o que não tem coragem durante o ano. Tudo por conta do Carnaval. Portanto, a festa da carne não é para pessoas religiosas e pudicas. Quem, como o presidente, vê apenas algumas cenas que o chocam, não tem ideia daquelas que não foram filmadas e nem publicadas, daí o seu desabafo. É o desabafo do Jair evangélico e não do presidente, dois lugares diferentes que ainda se misturam periodicamente na vida dele. Quem falou foi o evangélico e militar durão que ficou horrorizado com uma pequena demonstração exibicionista que não teria a menor importância se não fosse o twitter dele.
Jair aproveitou seu lugar de presidente para expor sua indignação, algo desnecessário e que, ao fazê-lo, tenta se colocar no lugar de polícia da moral e dos bons costumes. Ele precisa ser orientado que ocorrendo algo tipificado no Código Penal, cabe a polícia local as providências legais. Jair deu munição para a mídia que não cansa de contar seus desacertos e nenhum acerto. A leitura do que ficou na sua tuitada é que não há outras coisas importantes para se tratar no País. Os três dias de folga para muitos, deveriam ter sido de trabalho para ele e sua equipe.
Não há alguém no Planalto que critique ou aconselhe o presidente e seus filhos sobre o que eles publicam nos seus twitters? Quem anda precisando de policiamento é a família inteira, pois a notícia de sua indignação foi risível na mídia do mundo inteiro. O presidente não sabe, mas precisa-se de um revisor urgente para o twitter do Jair.
*Psicanalista e escritor
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