Da Justiça mal compreendida

Stefan Salej*
Os ministros do Supremo Tribunal Federal, corte mais alta da Justiça brasileira, estão revoltados com as reações do povo brasileiro às suas atitudes, às suas decisões e a seu comportamento. Além de fazer declarações sobre a independência dos poderes, ameaça à democracia, porque ela só funciona com justiça independente e respeito a lei, e combate a fake news, notícias falsas, os ministros e as ministras estão indignados com a percepção do povo brasileiro a seu respeito.
E eles estão com razão. Com toda razão. Porque eles nunca assistiram aos vídeos de seus julgamentos, suas falas, suas expressões faciais, corporais e verbais. O povo assiste, e como o povo sempre é ignorante e os onze ministros da corte são o suprassumo de nosso conhecimento, nossa ética, nossos valores e nosso amor à justiça, o povo tira conclusões erradas a respeito deles, suas decisões e seus julgamentos. Portanto, vamos educar o povo, dizer a eles que somos guardiães de sua democracia através de nossa independência. Somos, dizem os ministros, nas declarações da semana, poder, repito poder, independente.
A Justiça é um complexo de compreensões que persegue a humanidade. Desde a justiça divina até a justiça dos homens, interpretada a gosto, interesse, compreensão de cada tempo, grupo político, donos do poder e até interpretações pessoais.
Mas, a justiça dos homens que fica, e a história comprova isso, e que constrói uma sociedade democrática sólida, é aquela que atende através de uma estrutura jurídica executada pelo sistema Judiciário e penal, não às minorias, mas à maioria de seu povo. Então, a independência do Judiciário não é independência do povo que ele atende, de seus problemas, sua segurança jurídica, sua igualdade perante a lei e demais predicados da vida comum. Ser independente neste caso não quer dizer que tem que julgar interpretando a Constituição, contra a vontade do maioria do povo. E nem ficar ofendido quando o povo lhe diz que não concorda com as decisões.
E aí vem um outro problema da estrutura jurídica. A Constituição de 1988 permite tantas emendas e tantas interpretações que estas criam uma confusão político-social-penal que se chama insegurança jurídica. E junto vão as nossas leis, que são novamente feitas para criar insegurança de interpretações e engordar os bolsos de defensores das leis, alguns deles oriundos das mais altas cortes do País. O caos começa no Congresso, onde se fazem leis, e continua pelo Judiciário, que na sua maioria procura ser justo, eficaz e democrático.
Sem falar na execução das sentenças, interpelações eternas e um sistema econômico financeiro que gira em torno dessa confusão e complexidade jurídica. E com quase um milhão de presos, um sistema prisional dos piores do mundo
Então, a revolta dos mais altos juízes da nação está certa. O errado é o alvo, o povo revoltado com a situação, com a insegurança jurídica que vivemos e ainda vamos viver por muito tempo.
*Ex-presidente do Sebrae Minas e da Fiemg, vice-presidente do Conselho do Comercio Exterior da Fiesp e Coordenador adjunto do Gacint – Grupo de Acompanhamento de Conjuntura Internacional da USP
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