Opinião

Egoística percepção do mundo

CESAR VANUCCI *

“O homem busca o seu próprio bem à custa do mundo inteiro.” (Drowning – 1812-1889, descrevendo o egoísmo)

Continuo alinhando abaixo, para conhecimento dos leitores, algumas reflexões formuladas por ocasião da solenidade que marcou meu ingresso nos quadros associativos do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, no dia 30 de março passado.

“A palavra social há que ser destemerosamente empregada na condenação das guerras que as mães abominam. As guerras do terror e o terror das guerras.

Na censura firme aos procedimentos fundamentalistas religiosos ou políticos de quaisquer matizes, fontes matriciais do despotismo, do obscurantismo, do terrorismo sem entranhas, da corrupção sem freios, das discriminações de todo jaez, das lateralidades ideológicas incendiárias e do atordoante imobilismo social que, em tantas paragens, impede que os benefícios sociais, antevistos nas conquistas técnicas, contemplem parcelas consideráveis da sociedade.

A palavra social profliga a hipocrisia e a arrogância dos “donos do mundo”, com suas regras maquiavélicas de subjugação. Regras traduzidas num globalismo de araque que abre brechas para contínuas fajutices e numa geopolítica econômica a serviço de espúrias conveniências. As regras ditadas pelos “donos do mundo” fabricam dados e estatísticas estarrecedores. A fortuna acumulada de menos de meia centena dos cidadãos mais bem aquinhoados deste planeta azul equivale, consoante pesquisas de órgãos categorizados, ao patrimônio somado de um quarto da população humana. Pergunta-se: de qual artigo, dispositivo, capítulo, parágrafo, no Projeto da Criação, consta registro capaz de conferir legitimidade a essa alucinante situação?

Mais um, entre uma avalancha de exemplos: a pandemia da aids na África poderia ser contida com recursos que representam menos de um terço do custo de um desses porta-aviões colocados pelas grandes potências pra patrulhar os mares. Vejam só o tamanho do absurdo: com um naco de nada de sensibilidade social, as lideranças mundiais conseguiriam eliminar, pode-se dizer, num “abrir e fechar d’olhos”, o devastador surto de cólera que vem dizimando, nos dias presentes, milhares de pessoas em vastas porções territoriais da África esquecida do resto do mundo e, por vezes até, como clama poeta daquele continente, dos próprios deuses. Bastaria que das citadas lideranças partisse uma simples autorização no sentido de deslocar uma dessas portentosas embarcações para as áreas flageladas, transportando soro fisiológico, que outra coisa não é senão mistura de água com sal. Equipes de médicos, paramédicos e enfermeiras especializados em emergências seriam convocados para essa missão humanitária, de logística simples para qualquer potência.

Em egoística percepção do mundo, estrategistas de uma geopolítica desumana laboram em descomunais equívocos e injustiças. A economia, para eles, assume ares de divindade suprema. Um fim em si mesma. Linha conceitual tão desalmada e petulante enseja-lhes a presunção, levada a atos práticos, de que entre Deus e o dinheiro o segundo deve ser o primeiro. Mas a economia, instrumento de irrecusável relevância no processo civilizatório, não é um fim em si mesma. Tanto quanto a tecnologia, a ciência, a educação – por aí vai – é um meio para se atingir um fim. Sempre e irrevogavelmente social. O homem há que ser visto como a medida correta das coisas.

A não compreensão dessa verdade absoluta explica o porquê da onda, de descomunal proporção, dos desatinos e tragédias à nossa espreita incessantemente. Explica os ardis, embustes, farsas históricas, incoerências gritantes que ilaqueiam a boa fé das pessoas mundo afora.

Explica a corrupção pandêmica, que se alastra como grama tiririca, aquela gramínea que no verso composto em saboroso dialeto roceiro, “a gente pode arrancá, virar de raiz por ar, mas qua! Um fiapo escondido no torrão, faiz a peste vicejá”.

Explica o motivo pelo qual a mídia internacional, atendendo a inextricáveis desígnios e circunstâncias, alardeia ou silencia os horrores cometidos pelas fanáticas falanges terroristas, tipo EI, Alcaeda, Supremacia Branca e outras tantas. A atuação desses sinistros grupamentos gera incômodas indagações. Os “donos do mundo” não sabem respondê-las.

Cá está exemplo aterrorizante: se as bases das operações terroristas do EI, como se garante, acham-se sitiadas por terra, ar e mar pelas imbatíveis forças militares adversárias, como é que os alucinados fundamentalistas, aquartelados em territórios desprovidos de tudo, se arranjam? Como são providas as necessidades básicas de subsistência? Onde se abastecem eles de combustível, de munição, de peças de reposição para os carros de combate? Como se processa a remuneração dos milhares de combatentes? Se lá onde se entrincheiram não existe banco, como é que fazem pra movimentar a dinheirama que sustenta suas incendiárias ações? A mufunfa, a propósito, vem de onde? É fornecida por quem? Esses insondáveis “mistérios das arábias” são de deixar a cuca de traquejados analistas fervendo…”

Daremos continuidade a estas considerações no próximo comentário.

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