EDITORIAL | Essa briga não é nossa

Os conflitos no Oriente Médio, que duram séculos e foram iniciados por questões religiosas, embora já com uma evidente fundamentação comercial e econômica, chegaram ao nosso tempo tendo como melhor símbolo o petróleo. Cobiçando as reservas locais, maiores do mundo, Estados Unidos e Inglaterra, ao final da Segunda Guerra Mundial, fizeram o que podiam e não podiam para garantir esse controle. Dividir para dominar, sugere a velha lição, seguida a risco no caso, impedindo o surgimento da Arábia, como desejava a maioria local, e fracionando os territórios, sempre que possível visando fomentar conflitos regionais. Se eles próprios se matassem, tanto melhor, mais fácil a dominação como ocorrera antes na África.
A antiga Pérsia estava neste contexto e, com a ajuda ocidental, um governo nacionalista foi substituído por um império dócil, à frente o Xá, cujas extravagâncias, como uma festa monumental para comemorar seu aniversário, era a recompensa pela “amizade”, nada não muito diferente do que ainda ocorre na Arábia Saudita e em outros pequenos reinados. Na Pérsia o Xá não resistiu, religiosos tomaram o poder e surgiu o Irã, cuja independência é uma ameaça ao Ocidente, à antiga ordem, aos Estados Unidos principalmente.
Este, muito brevemente, o pano de fundo dos conflitos que nas últimas semanas voltaram a alcançar um nível de tensão mais elevado e, pior, atravessaram oceanos para chegar ao Brasil, onde foi negado reabastecimento a dois navios iranianos, sob o argumento de que o atendimento iria contra o embargo decretado, unilateralmente, pelos Estados Unidos. A situação já foi contornada, sobretudo depois que o embaixador iraniano no Brasil fez saber que cancelaria seus negócios comerciais com o Brasil, caso a hostilidade fosse mantida.
Que os Estados Unidos se enxerguem como polícia do mundo, mesmo que seja fácil perceber que nada mais fazem além de defender seus próprios interesses, é questão, pelo menos por enquanto, difícil de ser discutida. Mas que seus interesses, suas vontades e suas decisões tenham repercussões que, como no caso em foco, nos atingem mas não nos atendem, é o que não faz o menor sentido. Reduzindo a questão a uma expressão mais simples, essa briga absolutamente não é nossa.
Como não faz sentido o conveniente argumento de que na realidade trata-se de deter a proliferação de armas atômicas. Um objetivo muito justo, talvez fundamental para o futuro, mas que só faria sentido, só teria justificativa moral, se o “clube atômico”, países que detêm aquelas armas e a capacidade de produzi-las, fossem os primeiros a liquidar seus arsenais. Como isso não aconteceu, tudo não passa da mais absoluta hipocrisia.
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