Abismo entre modelo educacional e o mercado de trabalho

Marcela Trópia *
O desemprego no Brasil tem alcançado índices preocupantes nos últimos anos e os mais atingidos são os jovens. Grande parte deles não chega nem à universidade, o que dificulta ainda mais sua entrada no mercado de trabalho. Por outro lado, aqueles que conseguem o diploma não encontram oportunidades na área e acabam desempregados ou em ocupações totalmente fora de sua expertise, com salários inferiores ao esperado de um profissional com tal formação.
Conforme o estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizado em agosto de 2018, entre os trabalhadores de 18 a 24 anos, a taxa de desocupação é mais que o dobro da população de desempregados em geral. Isso não é mera coincidência, pois a educação oferecida nas escolas públicas ainda é precária. Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio de 2012 a 2018 (Pnad-C/IBGE), 59% dos alunos não se formam antes dos 19 anos no Ensino Médio e apenas 7% se formam dominando os conteúdos de matemática e 22,5% na disciplina de português.
O levantamento mostra ainda que, de todas as crianças e jovens que frequentam a escola, mais de 70% estão no ensino público. Ao analisarmos a distribuição do orçamento do Ministério da Educação (MEC) para a educação brasileira, pública e privada, o resultado é decepcionante. Os recursos são muito mal distribuídos e 58% estão concentrados no Ensino Superior. E as universidades, locais que recebe maior parte dos recursos do MEC, não são os espaços onde esses alunos mais pobres e/ou de escolas públicas se encontram. Pelo contrário, as estatísticas mostram que, se um curso de graduação possui 100 vagas, 45 serão preenchidas por estudantes que fazem parte dos 25% mais ricos da população.
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Ou seja, além de oferecer uma educação que não garante aprendizagem nas escolas, o Estado continua investindo pouco para corrigir esse contexto, contribuindo para um ciclo de má formação acadêmica, desemprego e desigualdade.
Outro problema que pode estar vinculado ao desemprego de tantos jovens é termos um modelo restrito de educação, exemplificado pela existência de uma Base Nacional Comum Curricular e um Exame Nacional do Ensino Médio. Funciona como um monopólio e eles nunca são eficientes. As escolas são obrigadas a adotarem essa base comum, que é rígida e prevê uma série de disciplinas extras, como inglês e filosofia, enquanto os alunos sequer aprendem o mínimo necessário, como mostram os dados acima. E, ao saírem da escola, caso queiram cursar uma graduação, os estudantes precisam se submeter a um único exame, que faz com que todo seu Ensino Médio seja focado em prepará-lo para essa prova, como se a trajetória dos jovens se resumisse a um caminho somente. Portanto, os nossos alunos basicamente são enquadrados do início ao fim da trajetória escolar, adequando-se ao que a base comum prevê, se esforçando para serem aprovados no Enem e galgar uma vaga nos cursos de graduação.
Essa falta de flexibilidade da vida escolar provoca uma uniformização do mercado de escolas e do aprendizado disponível. Os jovens não possuem espaço para aprenderem conteúdos específicos das suas áreas de interesse e muito menos conseguem aprimorar talentos que possuem. Além disso, as famílias que pensam diferente desse modelo vigente, ficam sem opção e, muitas vezes, acabam por pressionar diretores e professores a adotarem seu viés político, ideológico e até religioso em detrimento dos demais, provocando duros embates de valores e princípios, que pouco contribuem para a construção de uma educação mais livre.
E para onde todo esse contexto caótico do sistema educacional nos leva? Para jovens desempregados ou diplomados, ocupando espaços distintos de sua formação e com remuneração aquém do compatível com o mercado que ele desejava estar inserido após a formatura. Uma das formas de resolver parte do problema perpassa pela ampliação da liberdade, permitindo que escolas e universidades adotem grades mais flexíveis, que ensinem habilidades e conhecimentos mais alinhados ao que o mercado precisa, abrindo outras opções aos jovens, inclusive, que não seja exclusivamente uma graduação desconectada das vagas de emprego ou o próprio desemprego.
*Diretora de Integração da ACMinas Jovem
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