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VIVER EM VOZ ALTA | Durante as férias

VIVER EM VOZ ALTA | Durante as férias
CREDITO:ALISSON J. SILVA

ROGÉRIO FARIA TAVARES*

As férias escolares na Belo Horizonte do final dos anos setenta e da década de oitenta são memórias que trago comigo até hoje, na mente e no coração. Tempo de acordar tarde, de brincar com os vizinhos e com os primos, de passear. Enquanto escrevo, imagens desfilam pela minha frente, pedindo espaço. Numa delas, meu irmão e eu estamos na fila do saudoso Cine Jacques, à rua dos Tupis, onde hoje está o Shopping Cidade.

Todos os cinemas da Capital eram de rua. No Jacques, assisti ao E.T., ao Karatê Kid, aos clássicos da Disney, aos Trapalhões. Também não me esqueço de alguns filmes do Mazzaroppi, em preto e branco, e de “Marcelino, pão e vinho”, que tanto sucesso fez naquela época. Ao lado, havia a lendária lanchonete Ted’s, com sua imensa mesa comunitária e o grande balcão em U, capaz de acomodar seguramente mais de cinquenta clientes. O cachorro quente e a banana split eram as principais atrações do cardápio.

O Palladium era a sala maior e mais luxuosa. Fez muita falta durante o período em que ficou fechada. É uma alegria tê-la de volta, graças ao Sesc. O Metrópole era menor, mas charmoso e sofisticado, ainda guardando vestígios da época em que foi o teatro municipal, tão mencionado na obra de Pedro Nava. Causou comoção quando foi demolido para dar lugar a uma agência bancária. Apesar da intensa mobilização para impedir essa agressão à nossa história, não foi possível evitar o seu fim. É sempre espantosa a insensibilidade com que algumas empresas se relacionam com o patrimônio cultural.

O contrário pode ser dito da Vallourec, responsável por restaurar e manter vivo o Cine Theatro Brasil, na Praça Sete, hoje um ativo centro de cultura e lazer. Mais tarde, já adolescente, comecei a frequentar o Cine Pathé, onde assistia aos filmes de Woody Allen, entre tantos outros do chamado circuito de arte. A sua desativação até hoje também me entristece e me choca.

Se o cinema era diversão garantida, a programação de janeiro da Biblioteca Pública Estadual era preciosa. Lembro-me de haver feito um excelente curso de teatro com o inesquecível professor Helvécio Ferreira, na Sala Multimeios. O mestre sabia desenvolver nos alunos o gosto pela expressão artística e o interesse pela experiência teatral. Ali passávamos boas horas entretidos pelos jogos e pelos exercícios que nos propunha. Tornei-me, também por isso, um animado espectador de teatro, campo em que Minas não deixa nada a dever a nenhum outro estado brasileiro, como, ao longo do tempo, provaram os trabalhos de Jota Dangelo, Mamélia Dornelles, Pedro Paulo Cava, Ronaldo Boschi, Grupo Galpão, Grupo Ponto de Partida…

Recordo-me de tudo isso quando flagro Carlos e Gabriela à minha volta, na plenitude de sua energia. Não é justo confiná-los no apartamento, à mercê da televisão ou dos joguinhos eletrônicos. A vida está lá fora… Navego na internet em busca de ideias sobre o que fazer com as crianças em Belo Horizonte, no recesso. Com alegria, vejo que a lista de opções é extensa e variada. Se elas não terão a alegria de conhecer o Cine Metrópole ou o Cine Pathé, que lhes foram tirados, pelo menos ainda poderão passear pelo Parque Municipal, pela Praça da Liberdade, pelo Parque das Mangabeiras e apreciar um pouquinho da vista majestosa das montanhas que nos cercam. Enquanto ainda dá tempo…

* Jornalista e presidente da Academia Mineira de Letras

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