EDITORIAL | Tentação irresistível

Nas campanhas eleitorais, faz tempo, medido em décadas, bradar contra as estatais e reclamar seu fim tornou-se praxe. Não é papel do Estado controlar e operar uma empresa produtora de energia elétrica ou de abastecimento de água potável e coleta de esgotos, para ficarmos nos exemplos mais comuns.
Lugar comum, conveniência onde deixa de ser percebido que o Estado opera, e deve continuar operando, setores essenciais, estratégico, onde o lucro não tem como medida os padrões convencionais, próprios dos negócios privados.
Alguém, minimamente consciente, acharia natural e justificável uma empresa de coleta e tratamento de esgotos acumulando lucros com seu trabalho.
Não nos parece que faça sentido ou que a pergunta possa ser respondida com argumentos bem construídos. Deve ser por isso que o assunto, tão fortemente presente durante as campanhas eleitorais, desaparece, é engavetado, passada a caça aos votos, persistindo a discussão ineficaz e estatais como a criada para a construção do trem-bala que ligaria Rio de Janeiro e São Paulo, que continua vivíssima embora sequer o projeto do trem tenha saído do papel. Estamos pensando, claro, nos empregos e salários que estas empresas geram, postos suficientes para dar abrigo a uma malta de afilhados.
Claro que este é o ponto, claro que empresas públicas relevantes para o país poderiam ser bem administradas, como muitas delas já foram, exemplos saudosos de excelência e bons serviços, como nos tempos em que o sistema elétrico foi capaz de garantir energia boa e barata para sustentar o acelerado ciclo de industrialização dos anos 70 e 80. Deveria ser elementar que este fosse o parâmetro e o objetivo, obrigatoriamente um dos eixos das discussões de quem se preocupa com o futuro do país e não somente com o próprio futuro.
Tudo isso nos ocorre a propósito de estudos recentemente vinculados, por conta do Ministério da Economia, referente a salários e benefícios pagos nas estatais controladas pelo governo federal. A média chega aos R$ 34,1 mil, enquanto a média salarial no mercado de trabalho brasileiro fica em modestíssimos R$ 2,4 mil. Os valores revelados não incluem diretores, mas relevam que os 453 mil empregados de 46 estatais receberam R$ 96,6 bilhões em 2020, ano em que os gastos incluíram outros R$ 8,6 bilhões, para cobrir benefícios de saúde, e mais R$ 14,1 bilhões para previdência complementar.
Empresas que deveriam ser modelo em todos os sentidos encontram nestes desvios também a garantia de sobrevivência, sendo fácil entender por que resistem, mesmo que constantemente apedrejadas.
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