Opinião

A cooperação como propulsora da competitividade

A cooperação como propulsora da competitividade

Denise Baumgratz*

Aos poucos, os números oficiais da economia brasileira em 2022 vão sendo revelados. Enquanto alguns setores já se recuperaram dos estragos da pandemia, outros continuam enfrentando dificuldades.

O recente anúncio, pelo IBGE, de queda de 0,7% da produção industrial, para um nível 2,2% abaixo do pré-pandemia e 18,5% inferior ao recorde de maio de 2011, demonstra não só as dificuldades de recuperação deste setor, mas a existência de desafios estruturais, macro e micro. A lista é extensa. Vai desde questões como juros, renda, reforma tributária, política industrial até especificidades de cada setor e de cada organização. Vou me ater às duas últimas.

Em um cenário de baixo crescimento econômico, como o previsto para os próximos anos, a prosperidade precisa entrar por outras portas. No ambiente organizacional, não só do setor industrial, mas de qualquer outro, a capacidade de cooperação com os públicos relevantes para o negócio abre passagem para o aumento da competitividade. Ao nutrir um sistema de criação de valor onde as partes se reforçam mutuamente, o todo acaba gerando mais do que a soma de cada parte isolada.

A palavra “sistema” representa um conjunto de elementos que se relacionam entre si, de modo a formar um conjunto não só organizado mas, diria, “antifrágil”. Diferente do resiliente, que volta à forma anterior após um choque, o antifrágil se adapta e prospera diante da volatilidade. Logo, para uma economia cada vez mais complexa e volátil, a criação de sistemas antifrágeis é uma estratégia crucial de longevidade dos negócios. Diversos em percepções, insights e experiências, são capazes de dar novas respostas aos novos problemas.

Como, então, criar este tipo de sistema organizacional? Como depende do relacionamento entre as partes – organização, clientes, fornecedores, investidores, colaboradores, comunidade e meio ambiente, a orientação para stakeholders é um caminho. Quando a organização traz o interesse de cada elemento para o processo decisório, cria um sistema vivo, capaz de gerar valor compartilhado e sustentável. Compreende o que os une, o que os separa e como a ação de um impacta diretamente o outro.

O potencial de cooperação e inovação nos sistemas é enorme, mas acaba desperdiçado em culturas organizacionais fracas. Estruturas hierarquizadas, hipercompetitivas, masculinizadas, oportunistas, não são capazes de cooperar e dar as respostas que os desafios complexos pedem. Já estruturas baseadas em relacionamentos saudáveis destravam uma força latente, adormecida entre os elos.

Mas para desprender esse potencial e a consequente inteligência coletiva é preciso elevar o nível de confiança existente no sistema. Segundo Amy Cuddy, pesquisadora e professora da Harvard Business School, quando conhecemos alguém, buscamos responder duas perguntas: (1) “posso confiar nesta pessoa?” e (2) “posso respeitá-la?”.

Quando as respostas são positivas para confiança e competência, o céu é o limite. A questão é que confiança, a primeira pergunta, crucial para a nossa sobrevivência, leva tempo, e sem ela, o trabalho conjunto fica comprometido. Quando então é construído a partir do outro lado da moeda, da desconfiança, aí são criados sistemas frágeis que se desmantelam no primeiro choque externo.

Já em sistemas onde os stakeholders são reconhecidos e suas necessidades são levadas em conta na tomada de decisões, sobra espaço para a cooperação. “Como, juntos, podemos resolver esta crise?”, “como, juntos, podemos desenvolver novos produtos?”, “como, juntos, podemos reduzir os desperdícios no processo produtivo?”… São algumas perguntas que podem desencadear uma enxurrada de possibilidades inovadoras.

Entender o que cada parte valoriza é abrir as portas da cooperação e, consequentemente, da criação de mais valor para todos. Isso não quer dizer que não haverá conflitos. A tarefa de conciliar interesses distintos não é fácil, mas é possível. Segundo dois estudiosos sobre o tema, Miles e Friedman (não é o Milton, pai da teoria dos “shareholders”, mas o Andrew), há sete princípios para a gestão de stakeholders:

• Monitoramento

• Interlocução

• Processos

• Distribuição de valor

• Colaboração

• Precaução (para evitar riscos inaceitáveis)

• Gestão de conflitos

Stakeholders engajados são uma fonte de vantagem competitiva, pois elos fortes criam valor compartilhado e sistemas antifrágeis, capazes de lidar com a volatilidade existente (e crescente). Segundo Nassim Taleb, autor do livro Antifrágil, “detectar a fragilidade é infinitamente mais fácil do que prever eventos”. Como não temos controle sobre o futuro, precisamos então controlar a parte que nos cabe: a nossa ação no presente, seja na indústria, no agronegócio ou nos serviços.

*Economista, especialista em gestão de negócios, mentora, consultora e líder da Filial Regional do Capitalismo Consciente em Belo Horizonte

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