Fiemg propõe otimizar licenciamento ambiental

Fundada no dia 12 de fevereiro de 1933, a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) acaba de completar 90 anos. Impulsionando negócios, defendendo os interesses das indústrias e liderando ações a favor da sociedade, a entidade, que colaborou para a industrialização do Estado no passado, agora atua fortemente para a consolidação de um futuro próspero, com projetos favoráveis à melhoria do ambiente de negócios que culminam com o desenvolvimento econômico de Minas Gerais.
Empresário do setor têxtil, Flávio Roscoe está à frente da Federação desde 2018 e, recentemente, foi eleito para o segundo mandato. Em entrevista exclusiva ao DIÁRIO DO COMÉRCIO, o industrial faz uma análise dos feitos de sua primeira gestão, bem como traça metas ousadas para o trabalho até 2025, como a continuidade da atração de investimentos privados para o Estado e a ampliação do corpo de alunos nas escolas de formação da indústria: Serviço Social da Indústria (Sesi), o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai).
O dinamismo e os desafios dos cenários econômicos internacional e nacional também foram abordados pelo presidente da entidade, assim como seu relacionamento com os governos brasileiro e mineiro. Roscoe também não deixou de fazer duras críticas às burocracias ainda existentes para a aprovação de empreendimentos no Estado, especialmente no que se refere aos licenciamentos ambientais. Por fim, falou sobre polarização e o que entende como o melhor caminho para a pacificação do País.
A Fiemg acaba de completar 90 anos. Qual a análise você faz do legado construído até aqui?
A Fiemg foi decisiva para Minas Gerais em diversos momentos, mas principalmente na atração de investimentos e no suporte dessas indústrias. Boa parte do desenvolvimento inicial do Estado veio da atividade de mineração, que é uma atividade industrial e que trouxe a necessidade de ferrovias, infraestrutura e estradas. Países industrializados são países mais desenvolvidos. E no Brasil, os estados que têm maior percentual de atividades industriais são os estados com maior desenvolvimento socioeconômico. Uma coisa está ligada a outra e para que aconteça, é preciso um ambiente de negócios favorável. E é isso que a Fiemg fez e faz. A entidade foi criada na década de 1930 por empresários que queriam uma representação ampla, um serviço social que atendesse a comunidades de trabalhadores e fizesse a formação de mão de obra. Daí nasceu o Senai e o Sesi. O Senai com o objetivo de formar mão de obra para as indústrias e o Sesi com o objetivo de atender o desenvolvimento social do empregado. Chegamos a esse marco comemorando números recordes: 214 mil alunos, ou seja, mais de 1% da população mineira estudando nas nossas escolas. Além disso, temos quase 1,3 milhão de trabalhadores na indústria e estamos capacitando quase um sexto da força de trabalho do Estado.
Você está à frente da entidade desde 2018. Quais os principais feitos do primeiro mandato?
Primeiramente, o aumento do volume de alunos atendidos, que quase triplicou. Destacaria também a maior inovação do nosso parque. Renovamos boa parte dos maquinários das escolas do Senai, trouxemos tecnologia para várias unidades e uma pegada tecnológica muito grande para nossa rede de educação do Sesi, incrementando a robótica. Hoje, nossas escolas têm aulas com óculos de realidade virtual aumentada, robô colaborativo, estúdios e tablets. Estamos reforçando essa união entre tecnologia e conhecimento/educação e deixando a escola mais interessante para esse aluno que já nasceu no mundo digital. Queremos servir de inspiração para outras escolas, pois mesmo as privadas estão muito atrás das nossas. Isso faz muito sentido para esse novo aluno. Tudo para ele está no mundo digital e uma escola do século XIX não é interessante.
No ano passado você foi reeleito para mais três anos à frente da Fiemg. Quais os desafios até 2025? E as metas?
A meta agora é a melhoria do ambiente de negócios. Já tivemos muita evolução de 2018 para cá, grande parte alavancada pelo governo Zema, que tem essa visão também e com isso conseguimos um papel muito relevante na atração dos investimentos. Nossa missão é aprofundar nessa pauta, porque o ambiente de negócios melhorou, mas ainda pode avançar mais. Quando trazemos uma indústria para uma cidade, trazemos futuro para ela, seja porque o emprego da indústria paga melhor, seja porque a indústria investe 70% do total investido no Brasil em pesquisa e desenvolvimento, seja por estar reconhecendo o trabalho de pessoas com melhor grau de formação ou porque a indústria contribui com mais 50% da arrecadação do Estado. Boa parte dos serviços públicos é executada com a arrecadação da indústria. A indústria é dinâmica, traz desenvolvimento econômico, prosperidade para a sociedade e também um conforto para o Estado. Outra meta diz respeito a levar as escolas de robótica para o setor público, num convênio com as prefeituras. No ano passado, 1.700 alunos já tiveram acesso à robótica nas redes municipais através do Sesi. Esse ano nossa meta é atingir 50 mil. E chegar a 2025 em 100 mil. Outro desafio é aumentar ainda mais o número de alunos nas redes Sesi e Senai. Saímos de 70 mil para 214 mil nesses quatro anos e meio. A meta para os próximos três anos é bater 280 mil, fora o crescimento da robótica. Com a robótica, talvez cheguemos a 380 mil. Em resumo, queremos aumentar a participação do PIB da indústria no PIB do Estado. Já conseguimos elevar em quatro pontos percentuais nesses últimos anos, mas queremos um incremento ainda maior; pelo menos mais dois pontos percentuais.
O que ainda falta para a melhoria do ambiente de negócios em Minas Gerais?
O Estado ainda é muito burocratizado, há muitas leis e muitos atos normativos. É preciso simplificar essa estrutura, sem, obviamente, prejudicar a qualidade. Houve, por exemplo, uma burocratização muito grande em torno do licenciamento ambiental. Há uma percepção equivocada por parte da sociedade que licenciar empreendimentos é ruim. Licenciar empreendimentos é garantir que eles cumpram a legislação. A partir dessa percepção adotou-se uma estratégia de procrastinar demais os processos, o que o é muito negativo, porque as empresas precisam ter previsibilidade. Se o licenciamento ambiental no Estado demora dez anos e o produto tem vida útil de dois ou três anos, quando o empreendimento for aprovado, o produto já morreu. E o custo fica para a sociedade. O prazo de licenciamento não é garantia de preservação do meio ambiente. O ideal é que tenhamos processos rápidos que atendam à legislação e isso é possível preservando o meio ambiente. Em nenhum lugar do mundo se demora dez anos para licenciar um empreendimento e não há porque as pessoas defenderem isso aqui. Criou-se um negócio em torno da pauta ambiental. Muita gente tem interesse que o processo seja mais complexo, porque quanto mais complexo, mais consultoria, mais serviço, mais especialista… Defendemos processos mais rápidos e efetivos. É possível estabelecer os mesmos parâmetros, sem ampliar os prazos de análise e aprovação. Os parâmetros do Estado são muito rigorosos e não queremos mexer nisso. Mas também não queremos depender por cinco, seis, sete anos de um processo de licenciamento.
Como enxerga o atual cenário econômico mundial e nacional?
O internacional é desafiador. Temos a guerra, temos o pós-pandemia, que está trazendo diversas consequências e a questão da China ainda com recentes lockdowns. Tudo isso torna o cenário ainda complexo com o aumento da inflação mundo afora. E aqui no Brasil há a mudança de governo que ainda está trazendo insegurança e vai afetar a propensão de investimentos. Além disso, temos um cenário de taxa de juros muito alta que vai inibir ainda mais. Isso reduz nossa perspectiva de crescimento para 2023. Esperamos que em 2024 seja melhor.
Há previsão de crescimento para a indústria neste ano? Na sua avaliação quais os principais gargalos para que o País alcance um crescimento sustentável?
É muito difícil prever, porque depende das expectativas com o novo governo, as ações que, de fato, serão implementadas e os reflexos da economia mundial. Hoje estamos prevendo um leve crescimento, mas existe uma temeridade em torno dessas ações. Já para o crescimento sustentável, acredito que o caminho esteja na confiança. As pessoas talvez não entendam, mas toda vez que se dificulta a atividade do setor produtivo está se encarecendo os produtos e tirando investimentos. Quando se tira investimentos, se tira renda, emprego e arrecadação. Ao retirar renda, emprego e arrecadação, diminuímos a perspectiva do desenvolvimento social. As pessoas defendem maior distribuição social e maior participação, querendo destruir o setor produtivo. Isso é um equívoco, porque a riqueza é produzida pelo setor produtivo e aquilo que se quer redistribuir precisa ser produzido. É preciso gerar estímulo para que a produção seja maior e o setor produtivo mais competitivo, e não o contrário. É só dessa maneira que a gente vai chegar a um desenvolvimento socioeconômico melhor. Aponte-me um país que não seja relativamente industrializado, que tenha sucesso, que tenha um desenvolvimento socioeconômico razoável. Qual o grande fator de ascensão da China? A industrialização. Este foi o grande fator de inclusão de centenas de milhões de pessoas daquele país no mercado de trabalho e no mercado de consumo. Agora se você não tivesse feito e criado todo esse movimento, o que os chineses fizeram com muita competência, em que lugar estaria a China hoje? A China antes da década de 90 tinha um PIB menor que o do Brasil. Hoje o PIB chinês é 15 vezes maior que o nosso. Por quê? Por conta das opções deles e das nossas. Eles que são comunistas tomaram decisões capitalistas e nós que somos capitalistas tomamos decisões comunistas para a economia. Por isso, eles avançaram e nós ficamos para trás. O Brasil quer ser rico sem ter setor produtivo. Não existe esse cenário. Não dá para termos 200 milhões de influencers.
Como tem sido o relacionamento da entidade com os governos nacional e estadual?
O relacionamento com o governo estadual é muito bom, de diálogo constante e permanente. Levamos as necessidades do setor produtivo e o governo entende o setor produtivo como motor do desenvolvimento. Já o governo federal está assumindo agora, temos tido umas primeiras interlocuções com um ou outro ministro e estamos preparando materiais para levar a Brasília. Já iniciando as interfaces. Devemos intensificar esses contatos a partir deste mês.
E quais são esses pleitos?
Eles vão na mesma direção do que foi feito junto ao governo estadual, visando à melhoria do ambiente de negócios, a simplificação e desburocratização dos processos. Queremos propor reformas estruturantes que sejam realmente muito importantes. E também um trabalho na linha do desenvolvimento tecnológico, de cadeias produtivas e da inserção do Brasil em cadeias globais como uma potência da economia verde. Entendemos que o futuro da indústria passa por uma diversificação da matriz de produção e após a pandemia houve a necessidade de buscar fontes alternativas de suprimentos e o Brasil pode ser essa opção. Outra grande oportunidade está na indústria verde. Temos uma indústria com menor volume de emissões de carbono, que polui menos que a média internacional e temos que aproveitar isso também.
Vivemos um momento de alta polarização política no País. Qual o caminho enxerga para a pacificação?
Isso passa por uma maior conscientização das pessoas. Mas, infelizmente, acho que ainda vai piorar antes de melhorar. As pessoas não estão mais preocupadas com os fatos, estão preocupadas com as versões. Ninguém quer aprofundar nos assuntos e enquanto isso ocorrer, essa briga pela narrativa e pela retórica vai ser preponderante. Não importa o quê, importa qual versão você consegue dizer. E boa parte das pessoas julga antes mesmo de entender. Por isso acho que ainda precisamos de um amadurecimento desse fluxo de informações. O advento das redes sociais ainda é muito utilizado por oportunistas, sejam eles políticos ou representantes de determinadas causas. Quanto maior a polêmica, maior o impacto da informação. No meio político, por exemplo, temos cada dia mais representantes limitados a pautas temáticas e com uso exagerado dessas redes. O que temos hoje são representantes de extratos de segmentos da sociedade; os políticos se esquecem que foram eleitos para ser representante de todos. Temos uma segmentação dos mandatos e poucos parlamentares, de fato, encaram e são eleitos com pautas globais. Temos que olhar para nossos representantes, não como pautas, mas como alguém que tem capacidade de compreensão quanto aos dilemas da sociedade e tratá-los com menos paixão e com mais racionalidade. Até porque ele vai ter que participar de todos os debates. O que dá voto hoje é a polêmica e na polêmica não importa o fato, importa a versão.
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