Economia

Novo acordo de Mariana está quase pronto

Vítimas cobram participação ativa na construção de um novo acordo para reparar danos de rompimento de barragem
Novo acordo de Mariana está quase pronto
Repactuação do acordo de Mariana foi tema de audiência pública realizada ontem na ALMG | Crédito: Henrique Chendes - ALMG

Embora os governos federal, de Minas Gerais e do Espírito Santo estejam próximos de assinar a repactuação do acordo de Mariana, que busca reparar os danos causados pelo rompimento da Barragem de Fundão, ocorrido em 2015, os atingidos não estão satisfeitos com a condução das negociações e reivindicam participação ativa no processo.

O acordo pode avançar nos próximos dias, há pelo menos dez ministérios envolvidos na nova construção e a universalização do saneamento básico na bacia do Rio Doce deverá estar  no cerne da reparação.

Esses e outros pontos foram discutidos na primeira audiência pública da Comissão Extraordinária que vai tratar do assunto na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). 

O presidente da Comissão, deputado Ulysses Gomes (PT), abriu os trabalhos que duraram mais de seis horas, ponderando a necessidade da reformulação do modelo das negociações acerca do rompimento da barragem da Samarco, joint venture de BHP e Vale, ocorrido há mais de sete anos. Ele apresentou dados preocupantes como por exemplo, que 30% da lama derramada pela barragem continua sendo carreada por toda calha do rio Doce e que dos 42 programas assumidos pela Fundação Renova, apenas dois foram concluídos até o momento.

“A metodologia adotada também é questionável, pois os atingidos até são consultados, mas não participam das negociações. É necessário avançar de forma que haja efetiva participação social. Também há dúvidas quanto ao mérito das propostas e ainda são obscuras as responsabilidades pelas ações de reparação que envolvem as empresas, os governos de Minas Gerais, Espírito Santo e União. Queremos acompanhar as negociações dessa nova proposta, seus desdobramentos e o cumprimento das medidas”, adiantou.

Atingidos questionam atores envolvidos na participação da repactuação do acordo de Mariana

Em um discurso bastante emocionado, o atingido pelo rompimento da barragem de Fundão, Marino D’Angelo Júnior, falou sobre o retrocesso econômico, o empobrecimento forçado e as perdas causadas ao meio ambiente pela tragédia. Segundo ele, a sensação é que os atingidos estão condenados por um crime que não cometeram, vivendo uma vida imposta pelas mineradoras.

“A verdade é que esse rompimento virou um grande negócio. Tem um monte de gente ficando rica e ganhando dinheiro em nome dos atingidos. São quase oito anos nesse processo e eu nunca recebi um centavo. Não vejo essa repactuação como solução, porque os atores são os mesmos que criaram o acordão e a Fundação Renova”, reclamou.

Apesar do forte discurso de Marino Júnior, o conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Luiz Fernando Bandeira de Mello, garantiu que o ponto de comunhão de todos os atores que compõem a reformulação do acordo, inclusive o setor privado, é que o mecanismo criado através da Fundação Renova, de fato, não se mostrou satisfatório para atender a necessidade de reparação do meio ambiente e de indenização. E que juntos, governos federal, mineiro, capixaba, além dos Ministérios Públicos e Defensorias Públicas das três instâncias têm trabalhado para a construção de um modelo que atenda às reais necessidades deixadas pelo rompimento.

Segundo ele, a CNJ tem feito um enorme esforço para ouvir todas as pessoas e a negociação tem potencial para ser o maior acordo ambiental do planeta, por isso, conta com alguns pontos de confidencialidade, já que os valores envolvidos podem impactar na cotação dos valores das empresas e das políticas públicas.

“São 18 meses rediscutindo o modelo. Houve um entendimento no fim do ano passado que talvez atendesse a maior parte das demandas, porém, o fluxo com o qual o pagamento e os recursos seriam transferidos às pessoas atingidas e aos governos não agradou. Agora estamos todos sentados à mesa novamente. São diversos ministérios, várias agências reguladoras e diferentes representantes do governo”, afirmou.

Retomada do saneamento da Bacia do Rio Doce deverá conduzir grande parte das ações

Ainda conforme Mello, a prioridade do acordo é buscar devolver às pessoas atingidas dignidade, condições de saúde, lazer e de vida, conforme antes do rompimento. Reparar o meio ambiente também. Neste contexto, ele explicou que há diferentes formas de executar as ações e a abordagem que está sendo considerada é pela retomada do saneamento básico da bacia do Rio Doce.

“É bom lembrar que o que mais polui o rio é o esgoto. O rio Doce não voltará a ser o que era antes do rompimento da barragem, pelo menos não nos primeiros anos, mas temos que ter um planejamento para que volte a estar tão bom e tão limpo quanto possível”, frisou.

O secretário Adjunto da Secretaria de Estado Adjunto de Planejamento e Gestão (Seplag), Luis Otávio Milagres de Assis, completou que este é o maior legado esperado pela repactuação e que não se trata de um acordo do governo de Minas, mas dos diversos agentes envolvidos no processo.

“A avaliação do governo é de que não podemos aceitar a lentidão que existe e as mineradoras precisam ser responsabilizadas efetivamente pelo que causaram. A população tem pressa, os atingidos têm pressa e precisamos avançar rapidamente, porque o que temos hoje é uma não reparação. A repactuação não irá desobrigar as mineradoras responsáveis, as ações iniciadas deverão ser concluídas pela Renova e novas assumidas pelo poder público”, explicou.

“Nosso lema na Defensora Pública, assim como quando da negociação com a Vale sobre Brumadinho, é: pague alto e pague rápido, porque senão não é justiça”, completou a defensora Pública-Geral do Estado, Raquel Gomes de Sousa da Costa Dias.

Governo federal vai priorizar a participação social

Por fim, o adjunto do Advogado Geral da União, Junior Divino Fideles, falou do compromisso do órgão e do governo federal em buscar a efetiva reparação pelo rompimento. E assegurou que por parte da União, a renegociação terá como pressuposto uma efetiva participação social para assegurar não apenas os direitos coletivos, mas também na criação de mecanismos que possam garantir as indenizações individuais.

Para isso, diferentes áreas do governo estão envolvidas no processo. Conforme Fideles, pelo menos dez ministérios desejam participar das negociações. Entre eles: Ministério do Meio Ambiente, da Saúde, da Pesca, do Desenvolvimento Agrário, de Povos Indígenas, de Minas e Energia, da Previdência Social, das Cidades e Desenvolvimento Social.

“Se até 31 de dezembro tínhamos um governo federal omisso que pouco colaborou para a repactuação, agora temos um desejo muito grande de celebrá-la. Faremos o possível para que ocorra de forma célere. Mas para além do prazo, precisamos que tudo seja bem estruturado e envolva a participação social, conhecendo todos os termos, as ações compensatórias, os responsáveis por cada execução, bem como os valores correspondentes, com a seriedade e urgência que merecem o tema”, concluiu.

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