Reforma tributária deverá ser aprovada, prevê Carlos Viana

Senador por Minas Gerais eleito em 2018, Carlos Viana (Podemos) tem mandato até 2027. Até lá, promete se engajar com temas que considera importantes para o desenvolvimento do Estado e do País, seja como presidente da Comissão de Ciências e Tecnologia da Casa ou como interlocutor dos mineiros em pautas que se arrastam por décadas, como a reconstrução da BR-381 – mais conhecida como Rodovia da Morte – e o metrô de Belo Horizonte, que parece estar próximo de sair do papel.
Antes, porém, pode despontar como opção ao cargo máximo do Executivo da capital mineira. No início do ano, o parlamentar trocou o PL pelo Podemos e seu nome já começa a ser aventado para as eleições municipais do ano que vem. A troca de partido foi resultado da ruptura com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que optou por apoiar a reeleição de Romeu Zema (Novo) ao governo de Minas no ano passado, ao invés de seu companheiro de sigla e vice-líder no Senado.
Nesta entrevista exclusiva ao DIÁRIO DO COMÉRCIO, Viana falou sobre seu futuro político e as articulações e contribuições com o novo governo, agora na oposição. Disse que aposta na aprovação da reforma tributária, falou sobre o imbróglio das Medidas Provisórias (MP) no Congresso Nacional, analisou a polarização do País e o relacionamento dos Poderes em Brasília. Chamou atenção para o papel de liderança que Bolsonaro ainda exerce sobre parte da população, mesmo que nos bastidores da política, e que “se ele corrigir determinadas falhas, pode se tornar um importante player para as eleições de 2026”.
Qual cenário enxerga hoje no Congresso Nacional diante da mudança de governo e elevado índice de renovação no Parlamento?
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Toda troca de governo gera uma expectativa e o novo governo tem que dar respostas muito rápidas sobre qual caminho pretende seguir e as metas que tem para o País. Isso ainda não aconteceu, portanto não dá para fazer uma avaliação em amplitude. Primeiro precisamos entender quem são eles e o próprio governo ainda não conseguiu se entender. Porque o PT é um partido com vários movimentos internos, não é um partido homogêneo como os demais. Acredito que apenas no segundo semestre teremos uma ideia melhor dos projetos. No Parlamento, a expectativa é de boa convivência. A Câmara dos Deputados por si só é um lugar de muita discussão e embates. Já o Senado é composto por 81 senadores independentes. Os projetos precisam ser discutidos e trabalhados voto a voto. Por isso, não cabem discussões efusivas e bate-boca. Se espera uma boa relação com o governo, há também uma oposição mais forte.
E a oposição está alinhada?
Não, está na mesma situação. Hoje, a oposição é a direita, que também não é única. Nos últimos anos, a direita foi levada ao carimbo bolsonarista por um sentimento anti PT, mas com a vitória do partido, a direita precisa se organizar e pensar em uma nova proposta para 2026. Por enquanto, está muito sedimentada no viés bolsonarista e a oposição não se resume a isso.
O senhor concorda com as mudanças propostas pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), sobre a tramitação das medidas provisórias (MP)?
Como senador, me alinho a Rodrigo Pacheco (PSD) na defesa da Casa Maior no sentido de que não existe nenhuma obviedade ou lógica de que uma medida provisória comece a tramitar pela Câmara – como prevê a Constituição – e fique lá por 90 dias, chegando ao Senado faltando dois ou três dias para vencer. Isso é uma questão de boa relação, já que existe no País a chamada bicameralidade. Para mudar isso, seria necessário chamar uma nova Constituinte, porque uma coisa é o que a gente quer, outra é a realidade. E a realidade do Brasil é que o Senado também é uma Casa que pode mudar projetos e a Câmara tem que aceitar isso. O caminho é o diálogo. É preciso sentarmos à mesa como tem sido feito para chegarmos a uma conclusão que interesse ao País, porque da maneira como está, as medidas provisórias vão perder validade porque o Senado não vai votar.
E existe um bom ambiente para aprovar uma reforma tributária?
Existe, pois a reforma não está na questão partidária ou ideológica. Nesses últimos quatro anos do governo Bolsonaro, eu participei como vice-líder de todas as discussões sobre os vários cenários da reforma e não existe muita margem de mudança. Desde 1995, com o Plano Real, essa experiência econômica, tributária e fiscal já nos gerou boas leis. Como o teto de gastos, que pode ser mudado, mas não retirado. Precisamos simplificar o País, mas são quase 6 mil legislações de ISSQN, 27 legislações de ICMS, milhares de decretos da Receita Federal e isso não é uma tarefa fácil. Por isso, chegamos à conclusão de que o primeiro passo é criar alíquotas únicas, não um imposto único. Mas não colocando tudo a 25% ou 28%, pois o comércio pagaria a conta. A indústria teria uma diminuição na tributação, mas o comércio, um aumento. E se há algo na reforma tributária que nenhum parlamentar quer, muito menos eu, é aumentar imposto. O caminho é termos um imposto para indústria, um para o comércio e tratarmos a questão do agronegócio, porque o produtor rural tem uma tributação menor do que os demais setores.
E o arcabouço fiscal apresentado pelo governo federal deve passar com facilidade?
O projeto que nos foi apresentado traz para a legislação experiências em momentos em que o teto de gastos teve de ser desrespeitado. Essa discussão também já estava pronta no Ministério da Economia, onde os técnicos de carreira já possuem todo esse conhecimento. A única possibilidade de mudança no teto é quando você tem uma arrecadação extra e ela tem que ser colocada no Orçamento do ano seguinte. Essa é a mudança principal que o governo colocou e que é o centro da proposta. Criaram metas que estão ligadas à arrecadação, ao gasto e aos entes. Se for apenas isso, não vai mudar muita coisa e vamos ter uma Lei do Teto aprimorada e com outro nome.
Em sua opinião, quais temas devem ser priorizados no Senado?
Como presidente da Comissão de Ciências e Tecnologia considero que existem discussões atrasadas no Brasil referentes à igualdade tecnológica e à distribuição dessa tecnologia. Temos ainda no Brasil centenas de escolas sem acesso à internet. Há também o 5G. Em Minas Gerais, por exemplo, enquanto no Triângulo o agronegócio já usa a tecnologia para controle de máquinas, no Vale do Mucuri, há centenas de quilômetros sem antena de celular. Quero também dar sequência aos planos de infraestrutura.
No governo anterior, o senhor acompanhou de perto os projetos da BR-381 e metrô de Belo Horizonte…
Conseguimos avançar muito participando das discussões, porém, na vida pública, uma decisão errada leva dez anos para ser consertada. A exemplo das BRs 040 e 262, concessões do governo Dilma e que não deram resultado. Pagamos pedágio e as estradas estão um desastre. Nos últimos quatro anos, discutimos exaustivamente os projetos do metrô e da BR-381. Quem arrumou R$ 2,8 bilhões para o metrô de Belo Horizonte fui eu. Juntamente com o (ex-)ministro Tarcísio de Freitas, mostrei ao (ex-)ministro Paulo Guedes que o modal dava R$ 240 milhões de prejuízo ao ano e ele entendeu que era melhor pegar um ano de prejuízo e passar para iniciativa com metas do que continuar pagando por aquilo que não funcionava e que ia parar. E o projeto de concessão da BR-381 passou por várias etapas e enfrentou problemas como Covid, recursos, inflação de 10%, mas entregamos um projeto de concessão pronto e muito bem feito.
Com a mudança de governo, a BR-381 vai sair do papel? Mesmo agora na oposição, o senhor tem condições de acompanhar?
Se eles seguirem como o metrô, vai sair do papel. O projeto está prestes a ser aprovado pelo TCU e o novo governo terá apenas que colocar para privatizar. Mesmo na oposição, tenho condições de acompanhar porque boa parte do governo são meus ex-companheiros do PSD, que são muito próximos e mantenho boa interlocução, além do vice-presidente Geraldo Alckmin, que é um homem de direita e cuja visão de administração do País se aproxima muito da minha. Já o ministro Renan Filho está interessado e já conhece nosso problema. Estou na expectativa de que não mudem o que já foi feito.
No início dessa legislatura o senhor trocou o PL pelo Podemos. Como foi a escolha?
Partidos no Brasil não significam nada e, no Senado, são só uma referência. O importante é o voto do senador. Eu estava em um partido que sinalizou apoiar o PT, o que não é minha linha política nem do meu eleitor. A minha decisão de sair foi de que eu fiz um compromisso de ficar até a eleição do presidente da Casa. Eles me convidaram para ser candidato a governador e, infelizmente, o partido cumpriu, mas o ex-presidente Bolsonaro, não. Fiquei numa espécie de caminhada solitária. Mas a experiência foi muito boa no sentido de aprendizado. Aprendi que ninguém é candidato de si mesmo, que sem aprovação dos demais membros não é possível ter uma candidatura coesa e que é necessária articulação de liderança. Minha decisão foi partir para a independência. O Podemos me ofereceu a possibilidade de ajudar a reestruturar o partido em Minas.
O ex-presidente optou por apoiar o governador Romeu Zema à recandidatura ao invés do senhor que era o candidato do partido dele. De sua parte, houve algum arrependimento? Como está sua relação com ele?
Não me arrependi porque foi uma boa experiência. O (Jair) Bolsonaro continua sendo um grande líder. Ele fala com um Brasil profundo, que não é ouvido e que observa a política. Ele tem uma liderança forte com esse povo, mas é um líder isolado. Ficou 28 anos na Câmara como um deputado isolado e, como presidente da República, não soube conversar e aglutinar. Como presidente, por onde passou as pessoas chegavam e se distanciavam. Uma espécie de lobo solitário. Um líder que toma as decisões por conta própria. É admirado por muitos, mas no contexto da política é preciso dar razão a outros. Caso contrário, não se chega ao resultado porque o País é diverso. Não é homogêneo, não é um quartel. É um país de pessoas que pensam e são diferentes. Esse foi o grande erro do governo Bolsonaro. Ele perdeu para ele mesmo, porque acertou na economia, no corte de gastos, na redução do tamanho do Estado, mas errou no diálogo e na sensibilidade. Se ele corrigir determinadas falhas, pode se tornar um importante player para 2026. Mas se não fizer isso, vai ser o líder de um grupo muito fechado da direita, cerca de 20% da população, e o centro vai continuar em dúvida sobre o que fazer. E foi esse centro que votou no PT. O centro disse: ‘eu quero um país de economia boa, mas não quero um país de insensibilidade’. Esse mesmo centro pode voltar para o lado de cá, se a gente apresentar um projeto de um país melhor para todos nós em vários sentidos. O meu relacionamento com ele era apenas de partido e depois da eleição deixou de existir. Não conversamos mais.
Vivemos um momento de alta polarização política no País. Qual o caminho para a pacificação?
A polarização é um processo de longa data que começou quando resolveu impor pautas de minorias ou que o PT entendia como sendo as mais corretas sem ouvir o outro lado – que reagiu. Com o tempo tornou-se difícil controlar, pois gerou um extremismo. Bolsonaro é resultado dessa contra radicalização. Um grupo muito radical que quer defender apenas o que pensa. Essa é a extrema direita. Essa extrema direita tomou o poder e não ficou, porque há uma boa parte dos brasileiros que não quer isso nem de um lado nem de outro. As pessoas querem tranquilidade política, qualidade de vida, estabilidade fiscal e um salário maior. Essa questão ideológica de radicalização precisa parar. E o caminho é a maturidade política.
Como o senhor vê o relacionamento entre os poderes em Brasília?
Entre o Parlamento e o STF muito frio e de muita reclamação. A primeira e a segunda instância têm regras, mas as decisões dos ministros ultrapassaram os limites. O Sistema de Freios e Contrapesos, que prevê uma relação harmoniosa entre os poderes da República, não foi obedecido pelo Supremo. Houve decisões monocráticas que obrigaram os senadores a tomarem decisões políticas e quem quer fazer política tem que se candidatar e ser eleito. As discussões têm que ser jurídicas e feitas com equilíbrio e sem revanchismo. A Constituição de 1988 olhou para 1964 e não para o futuro e protegeu o STF de maneira que qualquer governo de exceção não atinja a corte. Porém, essa mesma proteção foi usada para que os ministros tomassem decisões políticas. O País entrou num ritmo em que cada ministro toma uma decisão de acordo com o amigo que está no poder. A gente precisa mudar isso para tornar essa corte independente. O STF se perdeu no dia em que começou a transmitir suas decisões pela televisão, porque a vaidade tomou conta e o Parlamento, por sua vez, não teve altivez de dizer não. Essa relação precisa ser rediscutida.
Qual o futuro político de Carlos Viana? A Prefeitura de Belo Horizonte está nos planos?
Vim para a vida pública com a vontade de servir e não com um projeto pessoal, porque eu já tinha 35 anos de trabalho em várias áreas, todas bem sucedidas. Tenho mais quatro anos no Senado e ainda não tenho uma decisão clara sobre qual será essa caminhada. Surgiu essa possibilidade da Prefeitura de BH e acredito que se você quer mudar, melhorar as escolas, garantir creche, aprimorar a saúde e organizar o trânsito, é na vida pública que está essa responsabilidade. Ainda está cedo, mas se no ano que vem eles me indicarem e houver um grupo grande que queira isso, poderei, sim, ser candidato.
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