23% das profissões devem se modificar

O relatório “Futuro do Trabalho 2023”, elaborado pelo Fórum Econômico Mundial com o apoio da Fundação Dom Cabral (FDC) nas pesquisas de opinião executiva, chega à quarta edição ratificando tendências já presentes em relatórios anteriores e pontuando a aceleração da demanda por profissionais especializados nas novas tecnologias e o aumento de atividades econômicas impulsionadas ou oriundas do uso da inteligência artificial (IA) e do big data.
O documento revela, ainda, que o aumento do custo de vida, desaceleração do crescimento econômico e tensões geopolíticas acarretam perdas de postos de trabalho, além da adoção de tecnologias que comprometem a continuidade de certas profissões.
Ao todo, segundo a pesquisa, 23% das ocupações no mercado de trabalho devem se modificar até 2027. Em uma base de dados que analisa 673 milhões de postos de trabalho há, neste período, a expectativa de 69 milhões de empregos criados, liderados principalmente pela transição verde e pela transformação tecnológica, mas neste mesmo período, 83 milhões de postos poderão ser eliminados. Isso corresponde a uma redução líquida de 14 milhões de postos de trabalho, ou 2% do emprego atual.
Os empregos que mais crescem são especialistas em IA e aprendizado de máquina, especialistas em sustentabilidade, analistas de inteligência de negócios e especialistas em segurança da informação, mas o maior crescimento em números absolutos é esperado em educação, agricultura e comércio digital.
Em uma análise comparativa, é possível notar que enquanto países desenvolvidos obtiveram uma forte recuperação, com alguns setores enfrentando escassez de mão de obra, como por exemplo o relato de 30% de manufaturas europeias acerca de restrições na produção durante o segundo trimestre de 2022 em razão da baixa disponibilidade de trabalhadores, países de renda baixa e média-baixa enfrentam taxas de desemprego maiores do que níveis pré-pandêmicos.
No Brasil, o desemprego entre pessoas com educação avançada (superior/técnico) é inferior ao compararmos com o de pessoas que possuem apenas a educação básica (7% contra 11%, respectivamente).
Diversos fatores socioeconômicos do País corroboram para um patamar elevado de trabalho vulnerável (28% da força de trabalho), similares a de países latino-americanos como México e Argentina (27% e 23%, respectivamente), e bem acima de desenvolvidos, a exemplo dos Estados Unidos (4%).
De acordo com o professor associado da FDC, Carlos Arruda, o futuro de curto prazo do Brasil não é nada animador e governos e iniciativa privada precisam agir de forma sinérgica para aumentar a qualidade da educação básica formal e requalificar os atuais trabalhadores em novas tecnologias.
Caso isso não seja feito com urgência e eficiência, a pena para o Brasil é não conseguir se manter na competição global por mercados e, assim, continuar exportando talentos e desenvolvimento econômico e social para outros países.
“No Brasil, ainda vamos ver mais gente deslocada para o desemprego. Ainda temos muitos trabalhadores sem qualificação e vamos ter outros, principalmente os mais maduros. Isso é crítico. Em 2018, muitos daqueles desligamentos foram de empregos de baixa capacidade produtiva. O relatório mostra que esses empregos estão acabando. Corremos o risco de aumentar a desigualdade entre os mais e os menos favorecidos. E o mesmo acontece entre os países mais ou menos desenvolvidos”, explica Arruda.
Ao mesmo tempo que a escassez de talentos afeta o mundo produtivo, a chamada “jornada do trabalhador” toma corpo. Porém, a massa salarial não acompanha a mesma dinâmica e continua abaixo dos níveis pré-pandemia no caso brasileiro.
Os resultados mostraram que 33% dos trabalhadores não se veem na empresa em que trabalham nos próximos dois anos. Ademais, 83% e 71% priorizam flexibilidade no horário e no local de trabalho, respectivamente. Apesar disso, o nível salarial continua sendo o principal motivo para os trabalhadores mudarem de emprego.
O aumento do custo de vida e desaceleração econômica são dois fatores que preocupam os trabalhadores. 61% deles demonstram preocupações acerca do crescimento salarial insuficiente para mitigar as pressões inflacionárias.
A Geração Z – pessoas nascidas da segunda metade da década de 1990 até o início de 2010 – a qual pertence a maior parte dos novos ingressantes no mercado de trabalho segue pressionando as empresas por valores que acreditam serem os corretos. 68% dos trabalhadores dessa geração não estão satisfeitos com o progresso de sua organização na criação de um ambiente de trabalho diversificado e inclusivo, e 56% dos trabalhadores da Geração Z não aceitariam uma função sem liderança diversificada.
Isso reforça a importância de estratégias de diversidade e inclusão para estabelecer um ambiente de trabalho atrativo. No Brasil, 81% das organizações que fizeram parte da pesquisa possuem programas de diversidade e inclusão (D&I) que priorizam, sobretudo, o treinamento de D&I aos seus gerentes, enquanto média global é de 67%.
Tendências
Novas tecnologias, responsabilidade socioambiental e a instabilidade do cenário geopolítico e econômico mundial pautam as preocupações dos gestores atuais. Para os próximos cinco anos (2023-2027), os executivos consultados revelam quais macrotendências seriam as mais prováveis ou crescentes: crescimento da adoção de novas tecnologias de fronteira (86,2%), a ampliação do acesso digital (86,10%) e da aplicação de padrões ESG (80,6%) foram os mais selecionados pelos executivos.
O impacto dos investimentos para impulsionar a transição verde foi considerada a sexta mais impactante macrotendência.
“O relatório traz como novidade os avanços na pauta ambiental, mas não tira o peso das novas tecnologias como transformadoras do mercado de trabalho. Também revela uma redução no peso da robotização. Mostra, ainda, os setores tradicionais revolucionados pela tecnologia. A mão de obra hiper qualificada no campo andando com a pauta ambiental. Esse é o setor mais impactado em termos de volume. E, assim, cresce a importância das instituições como a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e a educação tecnológica no rural”, destaca.
Novas atividades
- Especialistas em IA e aprendizagem de máquina;
- Especialista em sustentabilidade;
- Analista em inteligência de negócios;
- Analista de segurança da informação;
- Engenharia de fintechs;
- Cientistas e analistas de dados;
- Engenharia de robótica;
- Especialista em big data;
- Operadores de equipamentos agrícolas;
- Especialistas em transformação digital.
Carreiras ameaçadas
- Caixas de banco e funcionários relacionados;
- Funcionários dos Correios;
- Caixas e cobradores;
- Escriturários de entrada de dados;
- Secretários administrativos e executivos;
- Assistentes de registro de produtos e estoque;
- Escriturários de contabilidade;
- Legisladores e oficiais judiciários;
- Atendentes estatísticos, financeiros e de seguros;
- Vendedores de porta em porta, ambulantes e trabalhadores relacionados.
Tecnologias criam novas ocupações no mercado
As novas tecnologias já estão criando novos empregos, mas, ao mesmo tempo, levando uma série de atividades à obsolescência. Segundo o relatório “Futuro do Trabalho 2023”, elaborado pelo Fórum Econômico Mundial com o apoio da Fundação Dom Cabral (FDC), a rotatividade geral esperada dos empregos nos próximos cinco anos é de 23%, agregando postos de trabalho emergentes e em declínio. No Brasil, essa taxa é um pouco menor, alcançando 21%.
Os investimentos que facilitam a transição verde dos negócios (52,2%), a ampliação de padrões ESG (51,4%) e cadeias de suprimentos mais locais (46,5%) tendem a gerar expressivos ganhos no número de vagas disponíveis, enquanto a desaceleração da economia mundial (-44,4%) e aumento do custo de insumos (-23,7%) e de vida (-19,3%) são os principais fatores para redução de empregos.
As tecnologias com maiores capacidades em gerar novos empregos conforme pesquisa qualitativa aplicada no Brasil são: big data, plataformas e aplicativos digitais, tecnologias de educação (LMS – learning management systems), criptografia e segurança cibernética, além de tecnologias de suporte e facilitação do comércio digital.
Apesar de similar aos resultados da média global, as macrotendências com maiores potenciais de geração de empregos no Brasil, segundo executivos brasileiros, são “aplicação mais ampla dos padrões ambientais, sociais e de governança” (+70%), “investimentos induzidos pelas mudanças climáticas na adaptação de operações” (+62%) e “investimentos para facilitar a transição ecológica do seu negócio” (+62%).
Espera-se que os empregos na educação cresçam cerca de 10%, levando a 3 milhões de empregos adicionais para professores de educação profissional e professores universitários. Espera-se também que os empregos para profissionais do setor agrícola, especialmente Operadores de Equipamentos Agrícolas, Niveladoras e Classificadoras, tenham um aumento de 15% a 30%, levando a mais quatro milhões de empregos.
Para o professor associado da FDC, Carlos Arruda, como país, precisamos repensar como são utilizados os recursos que vão para a educação.
“É dificílimo mudar porque são políticas ancestrais. 6% do nosso PIB é investido em Educação, mas a maior parte do recurso vai para as instituições de ensino superior. A iniciativa privada já está se movimentando. A maioria das empresas ouvidas se propõe a ter estratégias de requalificação. Elas sabem que as vagas não serão preenchidas se não agirem imediatamente. A pandemia mudou a nossa forma de entender as relações interpessoais no trabalho”, pontua Arruda.
O Brasil possui cerca de 136 milhões de pessoas economicamente ativas, mas apenas 17% da força de trabalho possui um diploma de educação de nível superior ou vocacional. A taxa de desemprego se encontra no patamar de 10%, enquanto 23% dos jovens não trabalham nem estudam.
As tendências globais impactarão fortemente na criação ou destruição de empregos no País. As funções mais selecionadas no Brasil pelas organizações pesquisadas conforme saldo líquido positivo de empregos são analistas e cientistas de dados (31%), Profissionais de desenvolvimento de negócios (25%), Gerente de operações (13%) e advogados (13%).
Entre as habilidades exigidas, as relacionadas a aspectos cognitivos, de autoeficiência e de competências tecnológicas são fundamentais para performar bem em funções nas organizações.
Segundo os executivos brasileiros, para contornar o problema de baixa disponibilidade de mão de obra qualificada, é necessário a adoção de algumas práticas com o intuito de elevar a disponibilidade de talentos na economia.
A prática mais selecionada foi a melhora no processo de promoção e progressão de carreira (55% das organizações respondentes), seguida pelo fornecimento de requalificação e qualificação eficazes (32%) e melhor articulação do propósito e impacto do negócio (31%). Nesse contexto, a proposta de qualificação e requalificação é comumente financiada pela própria organização, seguida por treinamentos gratuitos e de financiamento via parcerias público-privadas.
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