Arcabouço de ilusões?

A aprovação da proposta do chamado “Arcabouço fiscal” sem mudanças significativas certamente foi bastante comemorada nos círculos oficiais em Brasília, assinalada como prova de que o governo tem margem para aprovar as pautas que considerar essenciais. Embora o próprio presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, tenha de pronto cuidado de alertar que não será bem assim, veio do Planalto rumores dando conta de que o próximo objetivo será o encaminhamento da reforma tributária. São movimentos impulsionados pela política, não por avaliações mais técnicas e, nessa medida, mais frias também. Porque não há, pelo menos não agora, espaço para alívio.
Afinal, e nesse terreno é bem reduzida a margem para acreditar em coincidências, no mesmo dia em que deputados federais cuidavam de votar o “arcabouço”, surgiram nos corredores de Brasília relatos dando conta de que o rombo nas contas públicas no corrente ano não somará os R$ 107 bilhões cravados pelo Planalto, podendo chegar a R$ 136,2 bilhões, exigindo cortes em despesas já programadas. Para piorar, pouca gente acredita que será possível levantar, fundamentalmente, via aperto na arrecadação e medidas como a taxação de apostas ou mais rigor no controle da importação de quinquilharias chinesas, os R$ 70 bilhões que o Ministério da Fazenda entende como suficientes para que suas contas cheguem, neste ano, ao empate, antecipando superávit no próximo exercício.
Dito de outra forma e não deixando de apontar o festival de gastos, que no ano passado não renderam os votos necessários para dar vitória à situação, mas fizeram transbordar despesas que hoje são o tormento dos vitoriosos, não dá para acreditar, ou fingir, que tudo possa se arrumar sem uma dose bem maior de sacrifícios. Ou, como políticos costumam dizer só quando estão nos palanques, sem que a gordura seja cortada para valer, até os ossos em certos casos. Afinal, e para além das contas que precisam ser reequilibradas, não dá para continuar fazendo de conta que o Estado brasileiro, além de gastar muito, gasta mal, é esbanjador e acumulou gordo, inchado, prisioneiro dessa condição, que é também paralisante e não pode continuar sendo alimentada.
Entender a realidade tal como ela é, significa também não fazer do recém-construído “arcabouço” apenas uma desculpa para tudo continuar como está.
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