Tomada de crédito precisa de cautela e planejamento

Adquirir crédito de instituições financeiras não é uma tarefa fácil. Pesquisa Empreendedores Iniciais 2022, do Núcleo de Inteligência do Sebrae Minas, mostra que do total de participantes da pesquisa que tentaram conseguir um empréstimo, 66% tiveram muita dificuldade, sendo ainda mais apontada pelos microempreendedores individuais, com 70% das menções. No caso das microempresas e empresas de pequeno porte, a questão foi avaliada como muito difícil por 61%.
A fundadora da academia 28 Trainner, Izabella Kathleen, diz que passou por essa dificuldade. “Tentamos um crédito para investir em um negócio que já estava pronto, no caso a nossa academia, mas sem sucesso porque realmente as instituições financeiras têm muita dificuldade em confiar em quem está começando”, diz.
Com quatro anos de atividade no mercado, ela afirma que o maior desafio para ela e o sócio, o marido Marcus Antônio Barbosa da Silva, foi a questão financeira. “Era tudo muito novo, a gente não tinha ninguém dentro da nossa família para nos instruir em como abrir uma empresa”, revela.
O analista técnico do Sebrae Minas José Márcio Martins observa que, ao se deparar com alguma dificuldade financeira ou mesmo ter o desejo de expandir o negócio, é comum que o empreendedor pense que a solução de todos os problemas seja solicitar um empréstimo. “No entanto, esta busca deve ser muito bem planejada. Se ela realmente for necessária, é preciso entender os melhores caminhos para captar recursos para o negócio”, alerta.
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Ele acrescenta que é importante que o empreendedor saiba o porquê da necessidade de crédito para escolher a solução mais adequada, evitando o endividamento desnecessário e inadequado, ou seja, aquele que não auxilia a empresa a funcionar e a crescer e que pode prejudicar o negócio.
Cautela
A empresária Silvia de Alencar, sócia com a irmã Celina Alencar da loja de decoração Villa Cloê, diz que é conservadora com relação à aquisição de crédito e que ainda não fez empréstimos para a empresa. “Há os riscos, só que, ao mesmo tempo, o crédito pode ser importante para dar o boom para a empresa crescer”, diz.
Para ela, é importante que o empreendedor tenha cuidado com a empolgação diante de bons resultados, que podem não se manter e, dessa forma, o crédito usado na expansão pode virar uma dor de cabeça.
“Eu acredito que o pedido de crédito deve ser bem planejado”, defende. E, para isso, ela considera importante ter um “olhar de fora da empresa”, como das consultorias oferecidas pelo Sebrae.
Silvia Alencar afirma que teve o apoio do Sebrae Minas há 10 anos para a abertura da empresa em Belo Horizonte. Anos depois, no começo de 2023, voltou a buscar as consultorias financeira e de marketing.
A empresária nascida em Florianópolis (SC) e que veio para Belo Horizonte para trabalhar em um hotel, diz que seu primeiro desafio como empreendedora foi entender o seu público, a cultura dos mineiros. “Não é fácil empreender, não é apenas vender”, observa.
Falta de capital de giro pode ser resultado de má gestão
Um empreendimento pode precisar de crédito em várias fases e por diversos motivos, como, por exemplo, para implantar ou ampliar os negócios, superar uma crise, modernizar os equipamentos e equilibrar o capital de giro.
Só que antes de buscar um financiamento o empreendedor deve verificar, através dos controles financeiros da empresa, a verdadeira situação do empreendimento e identificar se realmente ele é de fato necessário ou se existe algum problema relacionado à gestão do negócio, aconselha o analista técnico do Sebrae Minas José Márcio Martins. “É sempre bom lembrar que o crédito não resolve problemas de gestão. Um empréstimo é uma dívida e precisa ser paga para não gerar problemas futuros”, alerta.
Martins observa que o crédito não deve ser tomado para cobrir descontrole financeiro. “A falta de capital de giro pode ser consequência da má gestão financeira, como descasamento entre as contas a pagar e a receber, estoque excessivo, esforço de venda insuficiente, etc”, diz.
Nesse caso, o especialista aconselha que o empreendedor deve participar de treinamento relacionado à gestão empresarial e, particularmente, financeira oferecidos pelo Sebrae. “Quanto mais o empresário conhecer e aplicar os instrumentos da área financeira, mais segurança terá quando precisar obter empréstimos ou financiamentos bancários”, frisa.
Ele acrescenta que é importante avaliar a possibilidade do autofinanciamento, ou seja, considerar as possibilidades internas que podem cobrir a deficiência de caixa sem ter que recorrer a uma instituição financeira, tais como: ajuste de prazo entre fornecedor e cliente, venda de equipamentos/veículos obsoletos que já não são necessários na empresa, verificar o volume de estoque de mercadorias, além de outras medidas.
O especialista explica que o Sebrae possui projetos que ajudam o empresário na hora de solicitar o crédito, é o caso do Fundo de Aval da Micro e Pequena Empresa, que é um fundo garantidor para complementar as garantias exigidas pelas instituições financeiras, como Caixa Econômica, Sicoob, BDMG e Banco Original, e em breve o Banco do Brasil e o Sicredi.
A destinação do crédito é outro ponto de atenção, alerta Martins. “O crédito produtivo visa garantir que a empresa honre seus compromissos. Muitas vezes, o empreendedor utiliza o recurso da empresa para cobrir despesas pessoais, gerando desequilíbrio de caixa, descontrole financeiro e busca desnecessária de crédito, levando a inadimplência”, observa.
Acesso para pequenos empreendedores é maior no País
O proprietário da Cachaça Bandarra, Elber Sales, diz que já conseguiu crédito pelo Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) e pelo Sicoob. Ele afirma que chegou a usar recursos do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) para que a empresa, situada em Salinas, na região Norte do Estado, pudesse sobreviver em razão da queda das exportações durante a pandemia. “Tive um período de carência e vou começar a pagar agora”, revela.
Apesar de ter conseguido acesso ao crédito, ele admite que a dificuldade para os pequenos empreendedores é maior, seja pelas exigências das instituições financeiras, bem como pela alta taxa de juros vigente no País. “É uma dificuldade generalizada, os bancos são muito criteriosos”, frisa o empreendedor que lançou seu produto no mercado em 1999.
Além de ser necessário para manter o negócio, Sales diz que o crédito pode ajudar as empresas a crescer. “Existe o medo, além da questão cultural de não dever ninguém. O importante é analisar a situação e saber como buscar o crédito”, diz.
Depois de ter 90% do faturamento da empresa voltado para as exportações, em especial, entre os anos de 2001 e 2004, o empreendedor voltou aos poucos a reconquistar o mercado doméstico. “Também estou retomando as exportações pós-pandemia”, explica. Para ele, o ideal é buscar diversificar o mercado. “É aquela história de não colocar os ovos numa única cesta”, diz.
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