(Des)Construção da isonomia

Frank Sinatra Santos Chaves*
Já há algum tempo, o Brasil não é mais o mesmo das estrofes de nosso belo hino nacional.
Principalmente no trecho em que, com grande fervor, costumamos elevar a voz, com a mão no peito e cantar “se o penhor dessa igualdade, conseguimos conquistar com braço forte”.
Atualmente, corremos o risco de contradizer esses versos e colocar uma parte de nosso gigante em pleno movimento em xeque. Estou me referindo à portaria divulgada pelo Ministério da Fazenda, no dia 30 de junho deste ano, na qual ficou estabelecida que não haverá cobrança do imposto de importação para compras de até US$ 50 (cerca de R$ 240,00), quando o envio for realizado de pessoa jurídica (e-commerce) para pessoas físicas.
Uma concorrência desleal por parte de empresas estrangeiras, que vai gerar perdas na arrecadação de cerca de R$ 35 bilhões até 2027, sem falar em demissões que, só no varejo, podem chegar a 2 milhões. Os dados dessas projeções constam em nota técnica do Centro de Estudos Tributários e Aduaneiros (Cetad) e em levantamento do Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV).
É importante colocar mais um ingrediente para refletirmos sobre a situação. O tal programa Remessa Conforme, do governo federal, estima uma arrecadação em torno de R$ 8 bilhões com essa isenção na taxação para as compras de até US$ 50. Mas, eu te pergunto, caro leitor: vale a pena arrecadar R$ 8 bilhões e deixar de arrecadar R$ 35 bilhões? A conta está realmente certa e foi suficientemente forte para emitir a portaria e lançar o programa?
Além disso, a concorrência desleal que será construída por tal medida, tomará uma proporção de tamanha magnitude que terá como resultado uma onda de demissões e fechamento de lojas, após tantas lutas que travamos em meio à crise sanitária, crises secundárias, dentre outras adversidades que, paulatinamente, surgiram no horizonte dos empresários.
Dados do IDV apontam que, enquanto uma compra feita por meio de plataforma digital, via importação, será tributada em 17%, a indústria a e o comércio continuarão sujeitos a uma carga fiscal que varia de 80% a 130% em toda a cadeia produtiva. O cenário está posto e não podemos deixar que isso permaneça em nosso sistema político econômico. Concordo com a necessidade de medidas criativas e diferenciadas que promovam o avanço da economia, mas não com um custo tão elevado como esse!
Às vezes paro e me pergunto, de que lado o Brasil está? Daqueles que movimentam a economia, com geração de emprego e renda, ou daqueles que se aproveitam da fragilidade para obter benefícios? Empreender não é fácil e fica ainda mais difícil quando há interferências políticas que, de forma ambígua, nos forçam a jogar um jogoque beneficia somente um lado da cadeia.
Até agora falei com o olhar de empresário, mas, e o consumidor? Será que está ciente de que as compras que vierem de importação, serão passíveis de pagamento de imposto no valor de 17% de ICMS? Mesmo aquelas abaixo de U$$ 50? Quando se reflete sobre o assunto, chegamos à conclusão de que não é um bom negócio também para o consumidor. Com um pouco de pesquisa, podemos encontrar produtos nacionais bons, com qualidade, garantia e preço, para suprir nossas necessidades.
Claro que o governo tem que buscar caminhos para combater sonegação fiscal e práticas ilícitas, mas antes de tudo, há de se pensar nos resultados, nos reflexos e na sustentação de um Brasil que busca a isonomia e não a diferença, a simplificação e não a burocracia, o respeito e não a ofensa.
Vamos juntos lutar por políticas que sejam mais construtivas e menos destrutivas para os consumidores e para nós, empresários do setor de comércio de bens e serviços, protagonistas desse gigante pela própria natureza e que não foge à luta.
*Presidente da FCDL MG e da CDL de Contagem
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