Opinião

A decisão do voto

A decisão do voto
Urna Eletrônica | Crédito: Tânia Rêgo/ Agência Brasil

Uma das perguntas mais importantes para quem coordena campanhas eleitorais, especialmente o marketing, é: como o eleitor decide? Por que ele escolhe o candidato A em detrimento dos candidatos B, C ou D? Não existe uma resposta única. A decisão de voto é um fenômeno complexo, um emaranhado de fatores e variáveis que se conectam.

As pessoas, ao longo do processo eleitoral, vão formando imagens e opiniões que se transformam, no dia da eleição, em um voto, uma escolha. Contudo, para quem milita na área, a verdadeira questão é: como o marketing pode interferir neste processo de escolha e direcionar a decisão para o nosso candidato?

Um dos autores mais interessantes que estudaram a decisão de voto e que trazem muita luz na explicação deste processo é o americano Samuel Popkin, especialmente na sua obra The Reasoning Voter (1994), que analisa o comportamento eleitoral a partir das referências da psicologia cognitiva, da economia e da sociologia. O argumento central de Popkin é o de que o eleitor médio tem pouco envolvimento e interesse pela política e tende a recorrer a atalhos cognitivos e informacionais diversos com o objetivo de reduzir o custo de se informar sobre a eleição.

As pessoas adquirem conhecimento político (sem muito esforço) através de várias atividades do cotidiano e, cada atividade, fornece atalhos para diminuir o investimento de tempo e de energia necessários para se fazer escolhas. Indivíduos são movidos pela maximização do seu bem-estar e da melhora de sua situação econômica. Assim, as impressões e os sentimentos pessoais acerca das suas condições de vida (econômicas e sociais) são atalhos para se avaliar a performance de governos e candidatos.

Os eleitores médios não se atêm a detalhes, só prestam atenção no ponto principal e preferem acreditar nas informações já processadas e referendadas por aqueles que consideram experts no assunto.

Formadores ou líderes de opinião seriam as pessoas reconhecidas como as mais interessadas, com mais conhecimento e mais informadas sobre política – portanto, capazes de influenciar a opinião daqueles com quem interagem, especialmente os indecisos. Estes líderes de opinião seriam “pontes” entre os eleitores e as informações disseminadas pelos meios de comunicação e pelas campanhas.

Contudo, para serem líderes de opinião, os influenciadores precisam ser confiáveis, possuírem conhecimento e o eleitor perceber que ambos partilham interesses ou uma mesma visão de mundo (ideologia). As redes sociais e os aplicativos de mensagens, como o WhatsApp, bastante utilizados pelos mais jovens, são elementos que aumentam a capacidade de socialização dos indivíduos e estabelecem novas oportunidades de comunicação com os líderes de opinião (influenciadores).

Ainda segundo Popkin, a decisão de voto se baseia em uma “racionalidade de baixa informação” ou “racionalidade instintiva” fundamentada nas experiências passadas do indivíduo, nas suas crenças, seus valores e em seus conhecimentos (adquiridos através das conversas, da imprensa, das campanhas). E, acrescento, das mensagens que chegam através do WhatsApp e seus grupos.

Assim, as notícias e as informações provenientes das campanhas eleitorais precisam interagir com o cotidiano do cidadão e serem capazes de se relacionar com os problemas que afetam a vida das pessoas. E quanto mais estas informações forem validadas ou reforçadas pelos indivíduos (especialmente os líderes de opinião) ou grupos do qual se faça parte, mais crível e útil será aquela informação.

As notícias transmitidas pelos meios de comunicação, ao mesmo tempo, enquadram os problemas e dão visibilidade às soluções que eventualmente governos ou candidatos estão oferecendo para resolvê-los. A decisão eleitoral é, portanto, o resultado da combinação de vários atalhos cognitivos e informacionais. Cabe às campanhas tentarem interferir ou fornecer estes atalhos aos eleitores.

No contexto de pouco envolvimento, baixo interesse pela política, de decisões de “racionalidade instintiva” e na falta de informação mais profunda sobre as competências e as credenciais dos candidatos, o eleitor médio projeta suas próprias crenças e valores sobre a oferta de candidatos disponíveis (a partir de uma leitura muitas vezes baseada em imagens). E, intuitivamente, o eleitor avalia a probabilidade de que determinado político possua as características que ele considera adequadas ou ideais para aquela eleição e aquele cargo em disputa.

Com base nesta teoria, as campanhas eleitorais eficientes devem se basear fundamentalmente naquilo que os eleitores já sabem, acreditam e percebem em relação aos candidatos, reforçando os aspectos mais determinantes na decisão de voto. No livro clássico As Leis da Propaganda, de Jean-Marie Domenach de 1950, o autor já sugeria esta abordagem ao detalhar o que chamava de “Lei da Transfusão”: “Jamais acreditam os verdadeiros propagandistas na possibilidade de se fazer propaganda a partir do nada e impor às massas não importa que ideia, em não importa que momento.

A propaganda, em regra geral, age sempre sobre um substrato preexistente”… “essencial é dar imediatamente razão à clientela. Existe, portanto, na alma dos povos, sentimentos conscientes e inconscientes que a propaganda apreende e explora”. Cabe, portanto, às campanhas alinhar a imagem do candidato com as expectativas preexistente dos eleitores em termos de características desejadas e projetadas. Associar os adversários com os defeitos já identificados pelos votantes e estabelecer uma diferenciação competitiva baseada nestas clivagens. Este é o segredo!

A partir daí é construir uma narrativa consistente e coerente que dialogue com estas percepções pré-existentes e enquadre a campanha de modo a favorecer a agenda que nos interessa (definição de problema principal) e que maximize os atributos pessoais do nosso candidato como os mais adequados para o contexto e para a resolução daquele problema principal. Acredito que neste artigo ficou claro o tamanho do desafio que representa trabalhar o marketing de um candidato ao longo de um processo eleitoral.

Não é trivial a empreitada de formação de opinião e de se moldar a imagem do candidato de modo a dialogar com as percepções pré-existentes dos eleitores e de se construir uma narrativa consistente que ative os gatilhos e os atalhos cognitivos e informacionais que conformam a decisão de voto. Mas afinal, se fosse fácil, qual seria a graça?

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