Editorial

Ailton Krenak na ABL

Ailton Krenak na ABL
Crédito: ABL/Divulgação

Se o antropólogo Darcy Ribeiro ainda estivesse entre nós, certamente ficaria orgulhoso da eleição de Ailton Krenak para a Academia Brasileira de Letras (ABL), ocorrida na semana passada. A despeito do preconceito de grande parte da sociedade em relação à capacidade intelectual dos povos originários, o primeiro indígena finalmente vai ocupar um assento na entidade fundada pelo negro Machado de Assis e por Rui Barbosa há mais de 100 anos no Rio de Janeiro.

Para a ABL, a eleição de Krenak representa um avanço em termos de representatividade da riquíssima diversidade cultural brasileira. Nos últimos anos, a Academia vem abrindo o leque na composição de seus imortais, com artistas de diferentes perfis e de obras heterogênicas ingressando em suas fileiras, como a atriz Fernanda Montenegro e o compositor Gilberto Gil.

De uma sabedoria impressionante, Ailton Krenak vem surpreendendo o universo literário com uma obra bastante peculiar, inspirada em suas raízes seculares. O seu reconhecimento como escritor se consolidou nos últimos anos com a trilogia formada por “Ideias para Adiar o Fim do Mundo”, “A Vida Não É Útil” e “Futuro Ancestral”, editada pela Companhia das Letras.

Krenak na Academia Brasileira de Letras abre a possibilidade de uma nova luz no pensamento comum, de brilho único, em meio às trevas que o mundo vive, com o agravamento do aquecimento global, guerras e autodestruição, com o planeta devastado pela extrema ignorância de seus líderes máximos. A busca da sustentabilidade nunca foi tão urgente, diante dos efeitos climáticos nefastos que assolam o planeta. Para um índio sábio e simples como Krenak, levar a vida de forma sustentável, com o sagrado respeito à natureza, é algo inerente de um ser humano que ama a terra em que pisa.

Não podemos esquecer também da atuação de Krenak na Assembleia Nacional Constituinte, em 1987, quando participou ativamente da elaboração da Carta Magna, promulgada no ano seguinte, depois de décadas de violação dos direitos básicos do cidadão durante a ditadura militar. Como legítimo representante da União das Nações Indígenas, Krenak conseguiu introduzir na Constituição demandas dos povos que já viviam no Brasil antes da chegada dos portugueses.

Um país multirracial como o nosso precisava ter pelo menos um membro indígena na Academia Brasileira de Letras, conferindo aos povos originários o seu lugar incontestável na cultura nacional. O fardão de Krenak pode se tornar um divisor de águas nos rumos da intelectualidade nacional, que carece de renovação e revisão de conceitos.

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