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A guerra dos “vídeos horríveis”

A guerra dos “vídeos horríveis”
Crédito: Freepik

“Toda guerra é uma derrota”, disse o Papa Francisco. No apelo aos fiéis na praça São Pedro, o sumo pontífice falou o que já sabemos, mas às vezes esquecemos, tomados pelo devastador drama humano que a guerra expõe.

Toda guerra significa a falência da civilidade, falha da diplomacia e derrota da comunicação. A guerra aniquila esperanças e, como lembrou o Papa, não traz soluções, apenas mortes e o sofrimento de pessoas inocentes.

Os horrores da guerra deflagrada na manhã de sábado, 7/10, com os ataques de Hamas contra Israel se espalham em “vídeos horríveis” no X e Telegram, compartilhados aos milhões nas redes sociais. As plataformas de mídias sociais tomam a frente na transmissão do conflito e ocupam o papel dos canais de notícias.

No ambiente hiperconectado e altamente polarizado, as mensagens orbitam o espaço phygital (mundos físico e digital), agregando na trajetória tons e narrativas conforme o matiz ideológico da bolha do receptor. Propagados nas mídias sociais, os vídeos “mudam a guerra”, publicou a Folha de S.Paulo.

Estive em Israel na primeira semana de julho último com um grupo de jornalistas e formadores de opinião latino-americanos. Percorremos os lugares mostrados em cenas aterrorizantes. As imagens agora na TVs parecem mais vívidas e pungentes.

O New York Times registrou que, “pelo WhatsApp, israelenses alertam uns aos outros para não olhar o X: ´você pode ver alguém que conhece”. Todos ficamos emocionados com as cenas repetidas aos milhares, virais.

O autor e sociólogo Dominique Wolton, um dos maiores expoentes na ciência da comunicação, alerta que “as falhas na comunicação exigem negociação. Tentamos nos entender, não conseguimos. Portanto, negociamos para encontrar um terreno comum”.

Wolton, autor de clássicos sobre comunicação contemporânea como “Informar não é comunicar”, é entrevistado no livro “Muito além do Media training – O porta-voz na era da hiperconexão”, que escrevi junto com Patrícia Marins, jornalista e sócia-fundadora da Oficina Consultoria.

No capítulo final, sobre “A prática do contraditório”, o professor Wolton vai além, ao dizer que “quando a comunicação é bem-sucedida, não precisa negociação. O papel da negociação aumenta com as dificuldades de comunicação e, às vezes, fracassa com a não comunicação”.

A revista britânica Monocle publica, na edição de outubro, densa matéria sobre “a arte da persuasão”. Diplomatas em todo o mundo refletem sobre os rumos da profissão. “À medida que a guerra grassa na Europa e as tensões aumentam em toda a região da Ásia-Pacífico, os pilares da diplomacia estão sendo testados”.

“Comunicação é poder no mundo globalizado” é outro capítulo que tratamos em nosso livro, em uma entrevista com o embaixador José Estanislau do Amaral Souza Neto, que analisa as peculiaridades e desafios comunicacionais na carreira.

“Existem nuances. Às vezes, você usa linguagem diplomática para desdramatizar uma determinada situação. Somos treinados na própria vida”, disse.“Várias vezes, em discursos na ONU, em situações de diálogos um pouco mais ásperos, quando os interesses são substantivamente conflitantes, busca-se a linguagem diplomática para tentar encontrar uma saída”, explicou o embaixador.

No livro, compartilhamos experiências adquiridas em 20 anos de cursos e capacitações em comunicação para mais de 12 mil líderes e porta-vozes. “Comunicação para transformar” é a matriz conceitual e eixo central da linha editorial da Oficina Consultoria.

É a comunicação moldada na empatia. No capítulo final, abordamos o conceito fundador da democracia, que constrói o diálogo para unir contrários. Wolton ensina que comunicar é negociar para encontrar terrenos comuns. Sem isso,chega-se ao fracasso, silêncio, morte.

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