Ciclo de aperto global pode estar acabando
Londres – O ciclo de aperto monetário global estava em seus momentos finais em novembro, com os bancos centrais de países desenvolvidos realizando apenas um aumento e o número de cortes superando as altas pela primeira vez em 33 meses nos mercados emergentes.
Em novembro, seis dos bancos centrais que supervisionam as dez moedas mais negociadas realizaram reuniões de política monetária, sendo que apenas a autoridade monetária da Austrália aumentou os juros em 25 pontos básicos.
As autoridades dos Estados Unidos, Nova Zelândia, Suécia, Noruega e Reino Unido optaram pela manutenção dos juros em suas reuniões.
Em outubro, cinco dos principais bancos centrais desenvolvidos se reuniram sem realizar um único aumento de juros. A alta acumulada no ano é de 1.175 pontos em 37 aumentos, segundo cálculos da Reuters.
Embora não haja dúvida de que o ciclo de aumento dos juros esteja se esgotando para os principais bancos centrais à medida que a inflação diminui lentamente e as preocupações com o crescimento aumentam, os mercados e as autoridades de política monetária parecem estar em desacordo sobre o que acontecerá em seguida.
Operadores aumentaram as apostas de que os grandes bancos centrais, como o Fed e o BCE, reduzirão os juros no primeiro semestre do próximo ano.
Outros se mostram mais céticos.
“É claro que a inflação está caindo no curto prazo, à medida que os desajustes da era da pandemia se desfazem, com os gastos dos consumidores passando de bens a serviços”, disse Jean Boivin, do BlackRock Investment Institute, em uma nota aos clientes esta semana.
No entanto, como a inflação deve permanecer bem acima da meta dos bancos centrais de 2% devido a grandes mudanças estruturais, como a desaceleração do crescimento da força de trabalho, a fragmentação geopolítica e a transição para o baixo carbono, os bancos podem não se movimentar tão cedo quanto alguns otimistas esperam.
“É por isso que vemos os bancos centrais mantendo as taxas de juros altas por mais tempo”, acrescentou Boivin.
Enquanto isso, nas economias emergentes, o número de cortes de juros superou os aumentos em novembro pela primeira vez desde fevereiro de 2021 na amostra da Reuters de 18 bancos centrais em economias em desenvolvimento, dos quais 14 realizaram reuniões nos últimos meses.
“Os bancos centrais dos mercados emergentes foram muito proativos durante os últimos dois, três anos, e com um comportamento muito agressivo de aumento das taxas”, disse Robert Simpson, gerente de portfólio da Pictet Asset Management.
“Na verdade, eles conseguiram iniciar um ciclo de corte bem antes do Fed, e o fato de que agora estamos eliminando qualquer medo de aumento das taxas, mas também começamos a reduzir os preços, na verdade, cria mais espaço para que os bancos centrais dos mercados emergentes continuem seu ciclo de corte de juros de volta a níveis mais normais, e vemos isso continuar no próximo ano.”
Tanto o Brasil quanto a Hungria ampliaram seu ciclo de afrouxamento monetário, reduzindo os juros de referência em 50 e 75 pontos-base, respectivamente, e confirmando que a América Latina e a Europa Central continuam na vanguarda do ciclo de afrouxamento. Os últimos movimentos elevam o total anual de cortes para 695 pontos em 13 decisões.
Somente a Turquia – que ainda está lutando contra a inflação persistentemente alta e uma moeda enfraquecida – apresentou um aumento de 500 pontos-base nos juros.
No total, desde o início do ano, os bancos centrais dos mercados emergentes aumentaram os juros em um total de 4.725 pontos-base, contra 7.425 pontos em todo o ano de 2022.
BC deve manter ritmo de corte da Selic
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse na sexta-feira (1º) que as expectativas de inflação implícitas nas operações do mercado mostraram uma pequena melhora, mas reiterou que, com as variáveis conhecidas hoje, a avaliação é de que o ritmo de corte de 0,50 ponto percentual da Selic segue sendo apropriado.
“Entendemos que o ritmo de 50 (pontos-base) é o adequado”, afirmou Campos Neto, acrescentando que ainda é necessário que os juros permaneçam no campo restritivo. “Com as variáveis de hoje, o ritmo de 50 (de corte da Selic) é apropriado para as próximas reuniões”, reiterou.
A taxa básica Selic está atualmente em 12,25% ao ano. Em suas comunicações oficiais, o BC tem reforçado a perspectiva de que sejam promovidos mais cortes de 0,50 ponto percentual nas próximas reuniões — o que abarcaria pelo menos dezembro e janeiro.
Na curva de juros brasileira, a precificação majoritária é justamente de pelo menos mais dois cortes de meio ponto percentual. Entre os investidores e os analistas, no entanto, a dúvida é sobre qual será a taxa Selic no fim do atual ciclo de cortes.
Falando em evento da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) em São Paulo, a pouco mais de dez dias da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) deste ano, em 12 e 13 de dezembro, Campos Neto disse que a expectativa é de que a taxa terminal do ciclo de cortes siga em patamar restritivo.
Em evento na tarde de quinta-feira (30), o diretor de Política Monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo, também citou um cenário “mais benigno” para a inflação. Em função disso, segundo ele, há maior pressão do mercado para aceleração dos cortes de juros no Brasil. Ainda assim, Galípolo enfatizou a postura de cautela do BC diante das incertezas.
Autonomia
Durante o evento na Febraban, Campos Neto também destacou a importância da autonomia do BC, ainda que tenha reconhecido, de forma indireta, haver “ruídos” na relação com o governo.
“Tem, obviamente, um atrito, um ruído natural, de se acostumar a trabalhar nesta forma”, comentou, acrescentando que o primeiro teste da autonomia ocorre quando há mudança de governo.
Escolhido para o cargo de presidente do BC durante o governo de Jair Bolsonaro, Campos Neto tem mandato assegurado até o fim do próximo ano, em função da autonomia da instituição aprovada pelo Congresso Nacional. Somente a partir disso o presidente Luiz Inácio Lula da Silva poderá indicar um substituto.
“O processo de autonomia colocou o BC no ambiente internacional em outro patamar”, disse Campos Neto.
Parcelamento
Campos Neto afirmou ainda, para uma plateia com representantes de instituições financeiras, que a importância do parcelado sem juros cresceu muito no Brasil e, neste contexto, o BC tem tentando chamar todos os grupos envolvidos com o produto para conversar.
Em evento recente, Campos Neto alertou que existe a possibilidade de que os juros do crédito direto ao consumidor (CDC) estejam aumentando por conta do crescimento do parcelado sem juros. Isso ocorreria para compensar a inadimplência no parcelado.
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