Livros para as férias
Sempre é tempo para a leitura. Há vários anos, cultivo o costume de carregar um livro a tiracolo – para onde quer que eu vá. Pode ser que, ao longo do dia, se abra um espaço entre um compromisso e outro para mergulhar nas páginas de um bom romance, ou de uma bela coletânea de poemas. Às vezes isso se dá na sala de espera de um médico ou de um dentista, na fila de um banco ou até no intervalo para o almoço. O livro é bom companheiro e ajuda a gente a enfrentar os dias áridos e as horas mais difíceis.
Com a vantagem de tornar ainda melhores os instantes já agradáveis.
No momento de fazer as malas para alguma viagem (de férias ou a trabalho), incluo dois ou três volumes na bagagem. E eles acabam me socorrendo no caso do atraso ou até do cancelamento de algum voo. Ou me ajudando a relaxar mais profundamente na rede de alguma pousada na praia. Como sei que muitos leitores dessa coluna aproveitam o mês de janeiro para espairecer um pouco, atrevo-me a partilhar algumas boas experiências que tive com alguns lançamentos recentes – na crença de que também gostem de embarcar algum livro consigo.
“Macabéa – flor de mulungu” (Oficina Raquel, 39 páginas) é a releitura de “A hora da Estrela”, de Clarice Lispector, feita pela mineira Conceição Evaristo, Prêmio Juca Pato de 2023. Com ilustrações de Luciana Nabuco, a história, agora, dá voz à protagonista. O desfecho do enredo surpreende. Essa passagem é memorável: “A Flor de Mulungu não ia fenecer. Não. A posição fetal em que ela se encontrava era um indício de que uma nova vida se abria. Ela ia nascer por ela e com ela. Macabéa ia se parir. Flor de Mulungu tinha a potência da vida. Força motriz de um povo que resilientemente vai emoldurando o seu grito. Mulheres como Macabéa não morrem”.
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Prêmio de Poesia da Biblioteca Nacional de 2023, “Harsíese” (Editora Patuá, 94 páginas) é uma joia preciosa assinada por Jacyntho Lins Brandão, presidente da Academia Mineira de Letras e professor emérito da Faculdade de Letras da UFMG. Quem gosta de apreciar poemas sofisticados, que dialogam com o melhor da nossa sensibilidade, certamente se deliciará com textos como “Ao traço que corrompe”, que abre a publicação. Transcrevo um breve trecho: “Se o traço que corrompe o brancor/Da página resolve cor vazia/ O nada não recobre que se avia/E a que não há mais nada a sobrepor./ Fora ele nada não seria folha/Em seu brancor resto olho puro branco/Nem nela o verso não seria manco/ Asmático e- errático ao que colha”.
O terceiro autor mineiro que destaco hoje é Geraldo Carneiro, poeta e tradutor, nascido em Belo Horizonte, em 1952, e membro da Academia Brasileira de Letras. “Folias de Aprendiz” (Editora Intrínseca, 264 páginas) é uma deliciosa biografia escrita em linguagem leve, coloquial, descontraída e bem-humorada, que captura a atenção desde a primeira página. As memórias da infância e da juventude no Rio de Janeiro, onde reside até hoje, a convivência com os pais, e as lembranças da relação com artistas fundamentais para a cultura brasileira (como Vinícius de Moraes, Tom Jobim, Egberto Gismonti e Millôr Fernandes) são outros pontos fortes do livro. Sobre biografias, falarei, na semana que vem, de duas cuja leitura terminei há pouco: a de Jacinto Figueira Junior e do trapalhão Mussum. Até lá!
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