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Necessidade se transforma em negócio

Necessidade se transforma em negócio
Denise Godinho observa crescimento anual entre 30% e 50% - Lucas Viggiani/Divulgação

Quando ainda não se falava em doença celíaca, intolerância a lactose ou dietas restritivas, a economista Denise Godinho, de Montes Claros (Norte de Minas), se viu obrigada a debruçar-se sobre o tema procurando, muitas vezes, estudos internacionais sobre o assunto, já que o debate no Brasil ainda era escasso. Há 27 anos ela descobriu que o seu filho João, então com dois anos, tinha um grau elevado de restrição a glúten que o fazia reagir até mesmo à “poeira” da farinha de trigo no ar. Ela passou a desenvolver em casa receitas sem a substância que culminaram, mais de duas décadas depois, na criação da marca Sabor Sem Glúten, hoje, encontrada em supermercados de todo o Brasil.

Oficializada em 2016, a empresa tomou forma pressionada pela demanda por parte tanto de consumidores que sofrem com a doença como de pessoas que buscam por um estilo de vida mais saudável. Só no primeiro ano, Denise notou um crescimento de 50% nesta procura, o que propulsou a ampliação de toda estrutura, corpo de funcionários e produção em aproximadamente 80% desde então. Consequentemente, ela registra um faturamento que cresce de 30% a 50% ao ano.

“Imagina naquela época, na década de 90, morando no interior. Não existia nada sobre alergia a glúten, nem produtos prontos, nem literatura, as pessoas nem sabiam o que era glúten. Precisei correr atrás da alimentação do meu filho porque ele não tinha o que comer. Passei a estudar sobre o assunto e testar várias receitas em casa. Veio a fase da escola e eu tinha que me preocupar com tudo o que ele comia, então fui desenvolvendo equivalentes sem glúten do biscoito recheado, salgadinhos, docinhos. Eu passava o dia testando receitas com vários tipos de farinha, como amido de milho”, lembra.

E aí começaram a surgir os primeiros desafios para se chegar às fórmulas ideais que hoje estão nas prateleiras dos supermercados sob o selo Sabor Sem Glúten. Como é a substância que dá liga à receita, unindo a farinha, o óleo e a água, era necessário desenvolver uma mistura que cumprisse este papel. Foi aberta então a temporada de experimentações com as farinhas integrais e fibras naturais, como a linhaça, que quando é hidratada, adquire a consistência de gel. Cada mistura ficava melhor em um determinado tipo de receita, como bolos, pães, empadas e, assim, Denise ia anotando todos os resultados.

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“Meu filho era conhecido como João da marmitinha na escola, porque ele levava tudo de casa. E eu não o excluía dos programas, ele ia comer o que a gente fosse comer. Por exemplo, quando a gente saía para comer pizza, ele ia junto e levava a sua própria pizza com a massa sem glúten para comer na mesa com a gente”, conta.

Mas mais do que adaptar receitas tradicionais à versão sem glúten, Denise aprendeu a formulá-las se forma segura. Mesmo alguns produtos industrializados que traz no rótulo a inscrição de que não contém glúten anda poder ter em seu rol de ingredientes a controversa advertência: pode conter traços de glúten.

“A alergia do meu filho era tão severa que ele às vezes sofria contaminação pelo ar. Quando a gente utiliza a farinha do trigo, ela permanece no ar por até 24 horas e isso foi suficiente para desencadear um edema de glote nele certa vez. Há também o risco da contaminação cruzada. Quando você, por exemplo, passa o requeijão em um pão e depois utiliza a faca para outro alimento, ali ainda vai ter os traços de glúten. Os produtos pensados para as pessoas que sofrem deste problema, como o meu filho, não podem ser assados ou preparados nos mesmos utensílios por onde passaram algum trigo”.

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Público – Hoje, são dois os principais públicos da marca: as pessoas que têm restrição alimentar, inclusive intolerância a lactose, e as pessoas que estão optando por uma vida mais saudável.

Dentre o mix de produtos, as farinhas prontas para as receitas sem glúten atendem mais ao público do interior, que não encontra estas opções ali para preparar os seus pratos. Já nas capitais, os consumidores preferem os congelados, que são as receitas prontas de Denise, bastando somente aquecer no micro-ondas.

O grande desafio é tentar um subsídio para reduzir os impostos das farinhas utilizadas nos produtos e, assim, reduzir o valor para o consumidor final. “Em questão de valores e acessibilidade até que já melhorou bastante, hoje, é possível encontrar esses produtos em vários lugares e inclusive comprar pela internet. Mas a questão do imposto é ainda um desafio, porque há uma espécie de máfia do trigo”, conta Denise, que também integra a Associação de Celíacos do Brasil (Acelbra).

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