Produtor ganhador do ‘Oscar do Café’ aposta em compostagem e agricultura regenerativa

Um tesouro escondido no Cerrado mineiro, o café produzido na Fazenda Bioma, em Campos Altos, tem se destacado nacional e internacionalmente ao combinar qualidade e sustentabilidade. Fruto de um esforço detalhista dos sócios Marcelo Assis Nogueira e Flávio Márcio Silva e de uma equipe dedicada, a iguaria foi premiada no Cup of Excellence 2024 – considerado o “Oscar do Café”. Tudo isso combinando a inovação com práticas sustentáveis que incluem compostagem própria e agricultura regenerativa.
Na fazenda, os resíduos orgânicos vindos do beneficiamento do café não são vistos como lixo, mas, sim, como parte crucial para a nutrição do solo – visto por Marcelo Nogueira como a base de tudo. “A gente precisa manter o solo vivo. E isso significa ter uma diversidade microbiana, com cobertura vegetal o tempo inteiro, sem solo exposto, e utilizando resíduos para formar adubo orgânico com alto poder de regeneração”, comenta.
Para isso, a compostagem, produzida a partir de uma ‘receita de bolo’ com sobras do beneficiamento do café e com minerais, é uma etapa crucial para o início da cadeia produtiva da Bioma. “A gente coleta o resíduo da tulha e mistura com palha, bagaço de cana, restos de alimento, e forma um composto que devolve vida para o solo. Esse é um adubo que a gente conhece a origem e a função”, detalha Nogueira. Com a previsibilidade da qualidade vinda do adubo natural, hoje, mais de 60% do enriquecimento do solo da Bioma vem da compostagem realizada na fazenda.
Agricultura regenerativa
Outro ponto da agricultura regenerativa adotada na Bioma consiste na mesclagem do plantio de outras espécies em curva de nível associado ao abacateiro, o que, segundo Nogueira, traz múltiplos benefícios para o solo. “Além de prevenir a erosão e conservar nutrientes, o abacate ainda gera receita e ajuda na recomposição do ambiente. É uma produção inteligente e sistêmica.”
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A escolha por esse modelo não é recente. Desde 2010, quando Marcelo Nogueira fundou a Bioma junto com Flávio Márcio, o foco foi produzir cafés de alta qualidade com práticas que regenerem o ecossistema local. “Nosso objetivo sempre foi produzir respeitando o bioma e valorizando os recursos naturais. Isso se traduz em qualidade de bebida e reconhecimento no mercado”, diz. Mais de 63% dos hectares da fazenda são de área preservada.
Com diferentes variedades de café plantadas — como Arara, Novo Acauã, Catucaí e Bourbon Amarelo — e processos que incluem secagem natural ao sol e em estufa, a Bioma aposta também em rastreabilidade total. Cada lote é monitorado desde o campo até a entrega ao comprador.
Para Nogueira, a sustentabilidade é uma responsabilidade coletiva. “Não basta falar em qualidade se você destrói o solo, consome água sem controle ou gera resíduos sem destino. O produtor rural pode e deve ser protagonista de um novo modelo de agricultura, mais inteligente, mais equilibrado.”
O café diferenciado
Modelos de plantio de café sustentáveis, como o adotado pela Bioma, têm sido bem vistos pelo mercado internacional e representam uma parcela significativa da exportação do grão. De acordo com o Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), os cafés diferenciados — que incluem produtos com certificações de sustentabilidade ou qualidade superior — responderam por 22,1% do volume total exportado entre janeiro e maio de 2025. A receita gerada por esse segmento somou US$ 1,63 bilhão, o que representa 25,2% do total no período.
Apesar de uma queda de 7,2% no volume embarcado, o valor obtido com os cafés diferenciados cresceu 70,5% em relação ao mesmo período do ano anterior, impulsionado pela valorização no mercado internacional. O preço médio das sacas desse tipo de café foi de US$ 440,44, acima da média geral de exportação do setor.
Tarifaço de Trump
O cenário que vem sendo promissor para o Brasil, no entanto, pode sofrer grandes mudanças neste ano, uma vez que os Estados Unidos são os maiores importadores de café diferenciado no mercado brasileiro e também da Bioma. Dessa forma, o crescimento da receita obtida com esse tipo de café pode ser ameaçada com as novas políticas de taxação do presidente americano Donald Trump, o “tarifaço”.
“O que a gente espera como produtor é que o governo busque o diálogo nesse conflito, porque a taxação de 50% torna o valor do nosso produto impraticável para os americanos que compram da gente. Por exemplo, não tem como a gente diminuir o valor da nossa saca para compensar e, ao mesmo tempo, esse preço vai acabar sendo repassado para o consumidor final. É preocupante, porque abre uma vantagem competitiva para os outros países produtores”, avalia o produtor.
A repórter viajou a convite da Fazenda Bioma
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