Agronegócio

Cafeicultores do País são processados por descumprir contratos de vendas antecipadas

Cafeicultores do País são processados por descumprir contratos de vendas antecipadas
No último ano, produtores de cafés do Brasil enfrentaram seca severa, além de geadas, que contribuíram para afetar a cadeia | Crédito: Amanda Perobelli/Reuters

Nova York/Londres – Tradings de commodities, incluindo Louis Dreyfus, Olam e Volcafe, estão processando centenas de cafeicultores brasileiros, uma vez que o não cumprimento das vendas pré-acordadas deixou os comerciantes expostos a perdas, segundo fontes e documentos vistos pela Reuters.

Os preços do café arábica subiram cerca de 60% este ano devido à turbulência climática no Brasil. A alta de preços tem levado os agricultores a não cumprir os contratos, restringindo a oferta de uma commodity que, como muitas outras, foi afetada por atrasos no transporte e disponibilidade reduzida de mão de obra.

Todos os três maiores produtores de arábica do mundo – Brasil, Colômbia e Etiópia – estão enfrentando um aumento nas taxas de inadimplência, com os agricultores deixando de entregar o café a preços acordados para que possam tentar revendê-lo aos preços atuais mais altos.

Advogados disseram à Reuters que esta é a primeira vez em décadas que dezenas de cafeicultores estão inadimplentes no Brasil, que cultiva cerca de metade dos grãos de arábica do mundo. A inadimplência ocorreu em outras commodities, como a soja, em que os comerciantes recorreram ao uso de satélites e contrataram advogados para buscar os agricultores que tentavam revender safras já garantidas, uma vez que os preços naquele mercado também dispararam.

Muitos processos judiciais no Brasil não são públicos.

Alguns casos – A Volcafe, braço comercial de café da ED&F Man, uma das maiores tradings mundiais de commodities, teve problemas com cerca de 5% de seus contratos no Brasil, segundo o diretor da empresa para as Américas do Norte e do Sul, Nicolas Rueda.

“Conseguimos negociar e encontrar uma solução na maioria dos casos. Só nos casos em que as negociações foram encerradas recorremos à Justiça”, disse ele, sem identificar a quantidade de casos em que a empresa estava trabalhando.

A Olam confirmou casos de não conformidade e ações judiciais, mas disse que não são generalizados. Louis Dreyfus não retornou um pedido de comentário.

Os agricultores também estão inadimplentes na Colômbia e na Etiópia, segundo e terceiro maiores produtores de arábica do mundo. Com o Brasil, os três países respondem por mais de dois terços da produção global de arábica.

“O incentivo para a inadimplência nunca foi tão alto, esses caras não estão apenas inadimplentes em uma safra (da temporada). Você está olhando para a ponta de um iceberg aqui. Vai piorar nos próximos 12 meses ou mais”, afirmou um trader com sede na Europa, em um dos maiores comerciantes de café do mundo, que não estava autorizado a falar oficialmente.

Vendas futuras – Os volumes de vendas futuras no Brasil caíram devido à inadimplência e aos atrasos graves de embarque, disseram dois outros traders, complicando os já restritos fornecimentos globais de café.

A inadimplência pode sustentar os contratos futuros, que já estão próximos de máximas de sete anos, uma vez que o mercado depende da venda futura do Brasil para moderar os aumentos de preços, disse um segundo trader europeu em um comerciante global.

“Deveria haver um fluxo contínuo (de vendas) do Brasil, mas está tudo fechado. É assustador como está quieto. Não podemos comprar café. Nosso intermediário não consegue pegar o café”, declarou.

“Juntamente com os problemas (de envio), as negligências significam que a disponibilidade de café nos EUA, Europa e Japão está ficando cada vez mais tênue”, disse ele.

A evidência do aperto já pode ser vista nos estoques da bolsa ICE, que caíram cerca de 11% apenas no mês passado.

Processos – O escritório Santos Neto Advogados está trabalhando em cerca de 30 ações judiciais relacionadas à inadimplência do café, segundo Fernando Bilotti Ferreira, sócio do escritório. Ele afirmou que está agindo em nome de quatro corretoras, mas se recusou a mencioná-las.

O tamanho das inadimplências varia de 500 sacas até 4.500 sacas. A preços de mercado atuais, um contrato de 4.500 sacas valeria cerca de R$ 5,8 milhões.

Muitos comerciantes envolvidos em processos judiciais têm aceitado pedidos de agricultores para adiar as entregas até 2022, disse Cristiano Zauli, advogado que trabalha em Minas Gerais, o maior Estado produtor de café do Brasil.

Ele esteve envolvido em cerca de 100 processos judiciais sobre o café este ano e atuou como mediador em centenas de conversas, disse ele.

Zauli se recusou a identificar seus clientes.

Bancos pedem R$ 654 mi para linha contra geadas

São Paulo – Bancos e cooperativas apresentaram demanda de R$ 654,5 milhões referente à linha de crédito do governo federal para conceder a produtores que tiveram cafezais atingidos por geadas neste ano, informou o Ministério da Agricultura ontem.

O volume representa 49% do total de R$ 1,3 bilhão em recursos reservados do Fundo de Defesa da Economia Cafeeira (Funcafé) para cafeicultores de Minas Gerais, São Paulo e Paraná afetados pelo problema climático, conforme levantamento da Secretaria de Política Agrícola do ministério.

“A partir da sistematização dessas demandas e assinatura dos contratos pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), os recursos estarão disponíveis para os agentes financeiros na próxima semana”, disse a pasta.

Segundo a análise, dos 34 agentes financeiros que operam com o Funcafé, nove bancos comerciais solicitaram R$ 338,8 milhões, enquanto dois bancos cooperativos e dez cooperativas de crédito demandaram outros R$ 315,7 milhões. A taxa de juros é de 7% ao ano.

A maior demanda foi apresentada pelo Banco do Brasil, com R$ 164,5 milhões, mostraram os dados. Na sequência, aparece a Cooperativa Central Crediminas, com solicitação de R$ 82,98 milhões. O banco cooperativo Sicoob solicitou R$ 80 milhões. O banco Rabobank, o BTG Pactual e o Sicoob Coopacredi também estão entre os destaques, com R$ 60 milhões cada.

“Os recursos que não foram demandados, cerca de R$ 665 milhões, serão, posteriormente, redistribuídos para as demais linhas de crédito do Funcafé (custeio, comercialização, aquisição de café e capital de giro)”, ressaltou o ministério.

Uma prolongada seca e as geadas de julho podem resultar em perdas significativas para a próxima safra de café do Brasil.

Somente em Minas Gerais, principal Estado produtor de café, estima-se que os danos atingiram cerca de 19% das áreas da cultura, o equivalente a 173,68 mil hectares, segundo a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater-MG).

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