Agronegócio

Medidas do governo federal para conter alta dos alimentos são consideradas insuficientes

Para o setor produtivo de Minas Gerais, problemas ligados à infraestrutura de logística e distribuição não devem deixar que os preços dos importados cheguem menores ao consumidor final
Medidas do governo federal para conter alta dos alimentos são consideradas insuficientes
Para especialistas, isenção do imposto de importação para conter a elevação dos preços dos alimentos não se sustenta na realidade do mercado | Crédito: Reuters

As medidas anunciadas pelo governo federal para conter a inflação dos alimentos, incluindo a isenção do imposto de importação de produtos como o café, as carnes, o milho, entre outros, foram consideradas insuficientes pelo setor produtivo de Minas Gerais para resolver o problema. Para o segmento, além de o Brasil ser um dos maiores produtores do mundo, os problemas ligados à infraestrutura de logística e distribuição não devem deixar que os preços dos importados cheguem menores ao consumidor final. 

O setor defende que a melhor solução são políticas para estimular a produção e reduzir os custos. Entre as demandas – defendidas pelo setor há décadas – estão o maior acesso ao crédito, estímulo à produção de insumos – como fertilizantes – em nível nacional e melhoria na infraestrutura de rodovias e portos.

Na última quinta-feira (6), com o objetivo de baratear os alimentos para o consumidor, o governo federal anunciou ações. Entre elas, está a isenção do imposto de importação de produtos como o café, cuja alíquota é de 9%; do açúcar, 14%; carnes, 10,8%; milho, 7,2%, entre outros.

Real fraco compromete poder de compra das famílias

Com a isenção, a ideia do governo é estimular o ingresso dos produtos no mercado interno, aumentando a oferta e gerando queda nos preços. Porém, para o setor produtivo, dificilmente, a queda de preços ocorrerá. Conforme o presidente do Sistema Faemg Senar, Antônio de Salvo, as medidas são insuficientes para resolver um problema que é macroeconômico.

“O objetivo da medida não será alcançado. O governo federal gasta mais do que arrecada, consequentemente, precisa gerar mais moeda. Então, o real diminuiu o valor, comprometendo o poder de compra dos consumidores. Isentando o imposto, vamos comprar carne, açúcar, café de qual país já que somos grandes produtores? Se importar, com qual qualidade esses produtos chegarão aqui? Não são estas medidas que deveriam ser adotadas para resolver um problema macro da economia brasileira que não vai bem”, analisa.

Entre os produtos que estão isentos para a importação está o café, que tem o Brasil, especialmente, Minas Gerais, como maior produtor. De acordo com Salvo, a alta dos preços é mundial e resultante das adversidades climáticas enfrentadas em vários países ao longo dos últimos anos. O Brasil também se destaca na produção de carne bovina, sendo que 75% do volume produzido abastece o mercado interno.

“Não serão as importações que irão resolver o problema. Os alimentos estão aí, o que falta é uma moeda forte, uma economia forte para dar condições da população adquirir os produtos. Nós, produtores rurais, não podemos levar a culpa. O produtor se alimenta, gasta dinheiro e vive fazendo o possível, como temos feito, para melhorar a produção, sermos cada vez mais eficientes e competitivos”, argumenta.

Logística

Ainda conforme Salvo, a retirada das alíquotas de importação dos alimentos também não terá efeito devido aos custos com a logística. “Infelizmente, isentar alíquotas de 9%, 14%, 16% em alguns produtos, não adiantará frente aos custos com a logística. Há o frete marítimo que é caro. No Brasil, o transporte rodoviário tem custo elevado, então, até chegar aos supermercados será difícil ter um preço menor para o consumidor. São medidas com viés político em busca de melhorar a visibilidade do governo”, analisa.

No caso do açúcar, o presidente da Associação das Indústrias Sucroenergéticas de Minas Gerais (Siamig Bioenergia), Mário Campos, explica que a entidade foi favorável à isenção do imposto de importação sobre o adoçante. “O Brasil é o maior produtor e exportador mundial de açúcar. Nunca entendemos o porquê do Brasil ter estabelecido a tarifa de importação de 14% no açúcar, já que o País não importa açúcar. Então, isso é praticamente inócuo. Se é para ajudar o sistema, a gente apoia a medida do governo”, diz. 

Ações deveriam ser voltadas para reduzir custos de produção dos alimentos

Conforme o presidente do Sistema Faemg,  Antônio de Salvo, para resolver o problema, é preciso buscar soluções para os gargalos enfrentados pelo setor produtivo há décadas. Investimentos na melhoria das rodovias, dos portos e estímulo para que insumos utilizados no agronegócio sejam mais produzidos no País, reduzindo a dependência de importações, como no caso dos fertilizantes, são essenciais e trarão resultados mais concretos, mesmo que a longo prazo.

A melhoria da infraestrutura e maior produção de nutrientes para a produção no Brasil são importantes para a redução dos custos de produção no campo.

“Há décadas o setor agropecuário busca por estas soluções para melhorar a logística e a produção de insumos. São ações fundamentais para se ter um custo de produção menor”, diz Salvo.

Agronegócio enfrenta desafios mais urgentes

Para o CEO da HKTC, empresa que atua no comércio exterior, e especialista em comércio exterior, Daniel Cassetari, a recente decisão do governo federal de zerar a alíquota de importação para alimentos, incluindo carne bovina, levanta questionamentos sobre sua real eficácia no controle da inflação e no benefício ao consumidor final.

“Embora a medida possa parecer positiva à primeira vista, especialistas apontam que seu impacto prático é limitado, uma vez que o Brasil já é um dos maiores produtores e exportadores de alimentos do mundo. A justificativa do governo de que a isenção ajudaria a conter a alta dos preços não se sustenta na realidade do mercado”, explica.

Para  Cassetari, o agronegócio enfrenta desafios mais urgentes, como a necessidade de financiamentos mais vantajosos e redução de tributos sobre insumos essenciais. No entanto, o governo tem demorado a oferecer soluções estruturais e eficientes para o setor.

“Se a intenção fosse reduzir os custos para o consumidor, medidas mais eficazes poderiam ser adotadas, como a desoneração de insumos agrícolas, fertilizantes e combustíveis utilizados na produção. Além disso, a redução de impostos internos, como o ICMS sobre produtos da cesta básica, teria um efeito direto e imediato nos preços, beneficiando de fato a população”, diz.

Iniciativa tem um caráter mais político do que econômico

Cassetari explica ainda que, historicamente, medidas semelhantes de isenção de impostos sobre importação não resultaram em quedas significativas nos preços, apenas em uma estabilização momentânea.

“O impacto para o consumidor final tende a ser irrelevante, reforçando a percepção de que a iniciativa tem um caráter mais político do que econômico. Alternativas mais eficientes, como incentivos fiscais para supermercados e produtores, poderiam gerar um efeito real na cadeia produtiva e no preço final dos alimentos. No entanto, ao optar por uma estratégia de apelo popular, o governo cria a ilusão de que está combatendo a inflação, sem atacar suas causas estruturais” explica o especialista em comércio exterior.

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