‘Morango do Amor’: alta procura provoca escassez e encarecimento da fruta e do corante vermelho

O impacto da trend gastronômica “morango do amor”, que viralizou nas redes sociais no mês de julho, já é percebido no atacado de Belo Horizonte. Dados da CeasaMinas mostram que, mesmo com o aumento de 69,7% na quantidade ofertada da fruta entre a última semana de junho e a última de julho, o preço médio do morango subiu 9,6%, saltando de R$ 20,41 na primeira semana de julho para R$ 22,36 o quilo, na última semana do mês.
O aumento pode ser justificado pela alta demanda pela fruta, impulsionada pela nova febre da confeitaria, que consiste em morangos envoltos em brigadeiro branco e uma calda de açúcar vermelho. A confeiteira Beatriz Rodriguez, uma das muitas profissionais que aderiram à trend, relata que a valorização do morango foi o primeiro sinal de pressão nos custos.
“Achei que seria só ele, pois com o aumento da demanda já é normal ver o valor do morango nas alturas. Mas aí começou a aumentar o corante vermelho e, além de aumentar, começou a sumir”, diz a confeiteira. Grandes confeitarias também estão sendo afetadas pela falta do corante. Esse é o caso da rede belo-horizontina Momo, que lançou nesta quinta-feira (31) o “Morango do (des)amor” feito somente com a calda de caramelo sem o pigmento e vendido com desconto para os clientes.
No caso de Beatriz Rodriguez, para manter a margem de lucro, ela reajustou o preço do doce para R$ 18 e adotou estratégias como a compra em grande volume. “Ontem mesmo [quarta-feira,31] fui ao Ceasa comprar morango e peguei todo o estoque do produtor. Ele conseguiu me dar um desconto de R$ 5 por caixa. Voltei com 40 caixas, o que deu uma economia de R$ 200”, afirma.
Morangos selecionados
A preferência dos confeiteiros pelo morango selecionado, o maior e mais visualmente atrativo, explica outro fenômeno observado no atacado. Segundo Ricardo Martins, chefe da seção de informações de mercado da CeasaMinas, essa categoria da fruta chegou a ser vendida a R$ 50 o quilo no fim de julho, R$ 10 acima do valor considerado normal para o período. “Esse tipo é o mais procurado para fazer o morango do amor e, por ter oferta limitada, o preço subiu nos últimos dias”, diz.
Apesar disso, Martins pondera que o comportamento não se aplica ao morango como um todo. “Se pegarmos a média do mês de julho, o preço geral da fruta caiu 27,4% em relação a junho, puxado pela entrada da safra. Mas, ao focarmos na última semana, vemos que a procura intensa por morangos selecionados compensou o aumento da oferta”, explica.
A chef e coordenadora do curso de Gastronomia da Estácio BH, Larissa Fernandes, complementa que a valorização do morango não se deve apenas à viralização do doce. “Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul, os maiores produtores do País, ainda não atingiram o pico da colheita. Estamos no início da safra, e a produção ainda é limitada”, analisa. Segundo ela, o pico deve ocorrer em setembro, quando os preços tendem a ceder.
Larissa Fernandes também aponta um risco na estratégia de antecipação de compras para garantir descontos. “O morango é uma fruta extremamente perecível. Comprar em grande volume pode gerar desperdício, especialmente agora, quando os preços estão altos e a oferta de frutas graúdas é restrita”, alerta.
Criatividade na confeitaria
Ainda assim, o cenário tem levado confeiteiros a se reinventar. “Estão surgindo variações como o maracujá do amor, a uva do amor e até versões no pote, feitas com morangos menores”, afirma a chef. A tendência, até o momento, segue aquecida. “Continua um produto muito disputado por aqui”, diz Beatriz. “Vamos lançar a versão com maracujá e uva na próxima semana. Os clientes estão pedindo muito. Vamos ver se a fama continua.”
Trend movimento o campo
No campo, o reflexo também é positivo. Julimeire Santos, agricultora em Santos Dumont, na Zona da Mata, viu o preço da cartela de 12 unidades subir de R$ 10 para R$ 15. “Antes, minhas clientes compravam o morango menor, para bombons e tortas. Agora, todas querem o extra para fazer o morango do amor”, diz. Em um único dia, ela vendeu 22 cartelas na feira local.
Em Alfredo Vasconcelos, no Campo das Vertentes, o produtor Rodolfo Silva relata um comportamento semelhante. Nas últimas semanas, o preço da caixa de 1,2 kg voltou ao patamar de entressafra, entre R$ 25 e R$ 30, mesmo com boa oferta. “Cheguei a vender por R$ 12. Mas com o aumento da procura, o valor subiu novamente. E o tempo tem ajudado – sem geadas ou umidade, a qualidade da fruta melhorou”, afirma.
A técnica de campo do Sistema Faemg Senar, Renata Viol, confirma que o cenário atual foge do padrão. “Com o início da colheita no Sul de Minas, o preço normalmente cairia. Mas este ano tivemos manutenção e até elevação nos valores. Para os produtores, tem sido muito positivo”, analisa.
Apesar do movimento intenso, a tendência de valorização pode não se manter por muito tempo. “Nos últimos oito a dez dias, a procura tem sido constante, mas ainda não dá para afirmar se vai seguir assim. Em setembro, com o pico da safra, os preços devem recuar”, avalia Ricardo Martins, da CeasaMinas.
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